04/03/2015

VISITA AO JORNAL "A REPÚBLICA"

      
Ontem, uma comissão do IHGRN, composta do Presidente Valério Mesquita, Secretário-Geral Carlos Gomes, Secretário Adjunto Odúlio Botelho e do Assessor da Presidência Jansen Leiros, visitou o Departamento Estadual de Imprensa, onde voltou a imprimir o jornal "A REPÚBLICA".
Fomos recebidos com a máxima atenção pelo Diretor Geral Paulo Araújo, com quem mantivemos excelentes indicações de uma parceria importante entre as duas Instituições.
     Em seguida nos levou à presença de alguns servidores e às diversas dependências daquele tradicional Casa da Imprensa do Rio Grande do Norte, onde tivemos a alegria de ver rico material de valor histórico inestimável e exemplares de peças e publicações raras. 


Aqui reproduzimos parte do jornal nº 1 editado no dia 1º de julho de 1889.
       No Museu da Imprensa Oficial Eloy de Souza, dirigido pela funcionária Rosane, vimos as velhas máquinas impressoras, uma câmera fotográfica gigante, todos em condições de funcionamento e fotos que recordam os tempos de ouro de A República e um exemplar do Diário Oficial do dia 16 de abril de 1937, onde consta a nomeação do Professor Esmeraldo Homem de Siqueira para ser lente da cadeira de História Natural da Escola Normal de Natal, recentemente homenageado neste blog:
       Ainda, recebemos um exemplar do jornal "A REPÚBLICA" em sua nova fase iniciada no dia 27 de fevereiro do ano em curso:
        Finalmente, ao sairmos, nos foi entregue um cartão de agradecimento pela visita feita ao Museu da História da Imprensa Oficial, prenssado em uma das velhas máquinas:

          Foi uma proveitosa manhã, emocional pelas recordações de um tempo áureo da terra potiguar. Vale a pena visitar nossa histórica Casa da Imprensa, onde tantas figuras notáveis dirigiram ou trabalharam, como Eloy de Souza, Othoniel Menezes, Edgar Barbosa, João Medeiros Filho, Luís da Câmara Cascudo e tantos outros que estão ali registrados em fotos, desenhos e em placas.

 Silvério Martins Ramos e as dúvidas de Lúcia Tolson


João Felipe da Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
Professor da UFRN, membro do IHGRN e do INRG

Lúcia Tolson mora nos Estados Unidos e, de lá, me enviou um e-mail nos seguintes termos: Eu acabo de topar no nome acima (Silvério Martins de Oliveira) no seu artigo “Cartas da Ilha de Manoel Gonçalves” de 2/3/2011.  Tenho uma suspeita de que ele seja meu ancestral.  Não tenho, porém, os elementos para ligá-lo a meu trisavô Silvério Martins Ramos, além da semelhança de nomes e da proximidade no tempo e no espaço em que viveram.

Silvério Martins de Oliveira parece-me ter sido um dos habitantes da Ilha de Manoel Gonçalves em seus últimos anos, entre as décadas de 1820 e 1830.

Meu trisavô Silvério Martins Ramos morreu muito velho em Curralinho na década de 1930.  Ele era casado com Leonídia de Oliveira e tinha, entre outros filhos, um filho também chamado Silvério Martins Ramos (conhecido em família como Nozinho, que morreu centenário em Pendências no começo deste milênio). 

As únicas informações que tenho sobre os pais de Silvério Martins Ramos são que seu pai ficou viúvo de sua primeira mulher e depois casou-se com Anna, a mãe de Silvério, que morreu centenária em Curralinho na década de 1930.  De ambos casamentos esse senhor teve uma prole imensa, mas hoje não resta sequer lembrança do seu nome na família.  Suspeito que ele também fosse Silvério.

Será que o Senhor teria condições, sem lhe dar demasiado trabalho, de traçar a descendência de Silvério Martins de Oliveira até ela possivelmente bater em Silvério Martins Ramos?  Creio que haja uma ou no máximo duas gerações entre os dois, se eles são de fato parentes como suspeito.

Espero não estar abusando de sua boa vontade, mas é que fico animada demais quando encontro uma possível pista de história familiar nos seus artigos.

Em outro e-mail, pergunta se Francisca Martins de Oliveira, esposa de José Alves Martins, não seria uma das filhas do capitão Silvério Martins de Oliveira.

Para responder aos questionamentos de Lúcia, tenho as seguintes informações: O capitão Sílvério Martins de Oliveira era compadre do meu trisavô major José Martins Ferreira, por ter sido padrinho de meu tio-bisavô Manoel José Martins. Esteve em muitos eventos religiosos, na companhia do meu tetravô, o capitão João Martins Ferreira. Foi o primeiro Administrador da Mesa de Rendas de Macau e, também, foi um dos representantes de Apodi, na eleição para Junta Constitucional, em 1821. Sua esposa, dona Joanna  Nepomucena, era filha de   Anna Josepha Joaquina de Albuquerque (que morou um tempo na Ilha de Manoel Gonçalves) e do capitão Manoel Ignácio de Carvalho.

Sobre a existência de filhos do capitão Silvério não tenho documentação comprobatória, mas apenas suspeitas de que seriam: Antonia Silvéria de Oliveira, natural da Serra de Martins, que foi casada com Eliziário Antonio Cordeiro, natural de Lisboa; Silvéria Martins de Oliveira, Joana Nepomucena, mesmo nome da mãe; e Francisca Martins de Oliveira, citada por Lúcia Tolson.

Sobre o outro Silvério, o que temos é o seguinte: Em 1862, viúvo de Anna Raimunda da Luz, casou na capela de Nossa Senhora do Rosário da Várzea, com Anna Joaquina de Maria, filha de João Baptista do Espírito Santo e Maria Alves Lessa, tendo como testemunhas Manoel Pinto Queiroz e Vicente Barbalho Bezerra. Do seu primeiro casamento com Anna Raimunda, encontramos os seguintes filhos, segundo registros da Igreja: Maria, nascida em 1855, em Macau, tendo como padrinhos Christovão Francisco Gomes e Thomazia Martins Ferreira (irmã do major José Martins Ferreira); Manoel, nascido em 1856, batizado em Curralinho, teve como padrinhos José Alves Martins e Maria Gomes Pinheiro; Higino, nascido em 1858, tendo como padrinhos Marcolino José de Moraes; outra Maria, nascida em 1860, teve como padrinhos João Coelho da Silva e sua irmã Josefa Clementina de Moraes; Ritta Martins dos Passos, que casou com José Alves Barbosa (3º grau de consanguinidade), filho de Manoel Alves Barbosa e Anna Francisca Xavier, no sítio Curralinho, em 1871, na presença de Manoel Alves Barbosa e Vicente Rodrigues Ferreira.

No ano de 1904, faleceu Luis Martins Ramos. Segundo sua inventariante e esposa, Cosma Porcina Lessa, não tiveram filhos. Seus bens foram herdados pela dita Cosma e os irmãos dele: Rita Martins Passos, moradora em Boa Vista, com 50 anos, citada acima; Pedro Martins Ramos, com 55, casado com Alexandrina, moradores em Recife; Manoel Martins Ramos, com 49 anos, morador em Curralinho, citado acima, e casado com Maria Gomes dos Santos; José Martins Ramos, com 46 anos, casado com Maria Silvana de Mello, também morador em Curralinho e, citado acima; e João Martins Ramos, com 57 anos, casado com Damiana Rodrigues Lessa, moradores nas Oficinas.

Do casamento com Ana Joaquina, encontramos, até agora, Silvério, que  nasceu aos 22 de outubro 1863, e foi batizado aos 13 de novembro 1863, na capela das Oficinas, tendo como padrinhos Joaquim José Lessa e Maria dos Prazeres.  Esse Silvério é justamente o trisavô de Lúcia Tolson, que ela diz que casou com Leonídia.

Não encontrei nada que fizesse ligar o capitão Silvério Martins de Oliveira com Silvério, tetravô de Lúcia.

Sobre João Baptista do Espírito Santo e Maria Alves Lessa, pentavós de Lúcia, por parte de Anna Joaquina, encontramos os seguintes filhos: Joanna, nascida em 1843; as gêmeas Damiana e Cosma, nascidas em 1854; Josefa Rodrigues Lessa, que casou, em 1869, com Idalino Tranquilino de Sousa. Essas gêmeas, irmãs de Anna Joaquina, casaram com dois filhos do primeiro casamento de Silvério, pelo que se vê do inventário de Luis Martins Ramos.

03/03/2015


Grande Truman.


ESTOU REPASSANDO...
pouca gente sabe disso...


HARRY TRUMAN foi um tipo diferente como presidente. 
Provavelmente tomou tantas ou mais decisões em relação à história dos EUA como as que tomaram juntos os 42 presidentes que o precederam.
Uma medida da sua grandeza talvez permaneça para sempre: trata-se do que êle fez DEPOIS de deixar a Casa Branca.
A única propriedade que tinha quando faleceu era uma casa, onde morava, que se encontrava na localidade de Independence, Missouri. A sua esposa havia-a herdado de seus pais e, fora os anos em que moraram na Casa Branca, foi onde viveram durante toda a vida.

Quando se retirou da vida oficial, em 1952, todas as suas receitas consistiam numa pensão do Exército de U$13.507 anuais.

Quando o Congresso soube que ele custeava seus próprios selos de correio, outorgou-lhe um complemento e, mais tarde, uma pensão retroativa de $ 25.000 anuais.
Depois da posse do presidente Eisenhower, Truman e sua esposa voltaram a seu lar no Missouri dirigindo seu próprio carro... sem nenhum acompanhamento do Serviço Secreto.

Quando lhe ofereciam postos corporativos com grandes salários, rejeitava-os dizendo:  
“Vocês não querem a mim, o que querem é a figura do Presidente, e essa não me pertence. Pertence ao povo norte-americano e não está a venda...”.
Ainda depois, quando em 6 de Maio de 1971 o Congresso estava se preparando para lhe outorgar a Medalha de Honra em seu 87° aniversário, recusou-se a aceitá-la, escrevendo-lhes: 
“Não considero que tenha feito nada para merecer esse reconhecimento, venha ele do Congresso ou de qualquer outra parte”.
Enquanto Presidente, pagou todos seus gastos de viagens e de comida com seu próprio dinheiro, quando não estava em função oficial.
Este homem singular escreveu: 

“As minhas vocações na vida sempre foram ser pianista numa casa de putas ou ser político.  E para falar a verdade, não existe grande diferença entre as duas!”.











Dalton Mello de Andrade

02/03/2015

HOMENAGEM

Resultado de imagem para zaíra caldas biografia


ZAÍRA CALDAS



Jurandyr Navarro

Do Conselho Estadual de Cultura



Celeiro de talentos os mais diversificados, o torrão natalense deu-nos, também, uma estrela cintilante na arte pictórica - Zaíra Caldas. É, somente ela, a única artista a introduzir o Transfigurativismo na cultura potiguar, estilo ainda não consolidado por algu­ma escola. Trata-se, ao que parece, aos olhos do leigo, da projeção na tela de uma ideia inspiradora do subconsciente não percebida pelo consciente. Ela o define como sendo "a transformação de uma imagem em outra imagem com o poder de atingir a consciêcia mais profunda. Vai além da transfiguração porque transcende do artista por uma nova autonomia plástica, possibilitando ao espectador criar múltiplas formas metamorfoseadas em diversas dimensões, dependendo de como são vistas e senti­das".

Trata-se de uma arte de pura abstração, num certo sentido. A arte abstrata teve como precursor Wassily Kandinsky, segundo autores.

O revolucionário estilo de Zaíra é novidade mundial.

Este, portanto, um modelo novo de pintura inaugurado com êxito pleno, em nos­sas galerias de arte e alhures, inclusive no Exterior, de Zaíra Caldas Pereira, virtuose das mais aplaudidas.   

Há anos que a inteligente e inspirada intelectual natalense deu a sua presença, sempre brilhante, em eventos os mais prestigiados, pela qualidade especial da sua refi­nada arte.

De longo tempo, a trajetória vitoriosa de Zaíra Caldas, navegando no oceano da arte, oceano calmo ou às vezes agitado pelos misteriosos caprichos dos ventos da inspiração criadora. Seja qual for o estado d'alma, o artista continua a sua atividade, como que repetisse a frase de Pompeu, colocada na boca de Plutarco e que se repete há séculos: "Navegar é necessário, viver que não é necessário". Expõe a sua razão Plutarco: - "Mesmo vendo o vento impetuoso da procela, Pompeu não temeu o perigo: teria que conduzir a todo custo o trigo colhido à Roma, e exortava aos bravos marinhei­ros a enfrentar o mar ameaçado pela tormenta". ("Navigare necesse est, vivere non est necesse").

O cumprimento do dever a tudo supera. Para o artista o seu trabalho está acima da própria vida.

Zaíra expôs em Paris, em Portugal, em Roma. Ganhou medalha de ouro na Bélgi­ca, na Espanha repetiram-se as ovações.

No Brasil fez exposições em diversos Estados.

No entender de Hegel, a obra de arte é uma criação do gênio, do talento. A sua criação exige talento, que é uma atividade específica, quer dizer, um dom limitado. O gênio é mais geral. “A atividade artística é inconsciente para ser eficaz. Deve presidir também destreza manual. (...) A obra de arte só é considerada tal enquanto espiritualidade, ungida pelo batismo do espírito e representando algo que ao espírito pertence e com ele se harmonize. Ela provem do espírito e existe para o espírito. Consiste em ser uma obra perene".

E adiante: "O sentimento e a idéia que em pintura inspiram uma paisagem, confe­rem a essa obra do espírito um lugar mais elevado do que o da paisagem tal como existe na natureza. Tudo quanto pertence ao espírito é superior ao que se encontra em estado natural. E não esqueçamos que a natureza de modo algum representa ideais divinos, que só a obra de arte pode exprimir".

A arte de Zaíra Caldas é toda ela espiritual e carregada também de sentimento e

emoção.

Conceituando o seu ideário artístico, assim se exprimiu a pintora Zaíra Caldas:



"O que procuro é o princípio cósmico da vida. Em frag­mentos sem definição; ousar uma estrutura de átomos numa tentativa de ir ao eterno, sabendo da impossibilidade de chegar. A absoluta forma da cor, numa sucessão pura de estética uni­versal. Ir à luz, sem esquecer as trevas. Partindo das raízes ir ao infinito absoluto deixando um rastro de luz nas manchas verme­lhas que caminham numa orgia sem glória, sem regras, obede­cendo simplesmente os impulsos da imaginação. Fragmentos involuntários numa fundamentação do sagrado, e na terrível magia transgredida do absoluto. Tangível singularidade na recriação do universo. Uma invasão de influências de elemento figurativos intencionais, que leva-me a outros símbolo, outros universos."



Por tudo dito acima, rejubilem-se os amantes da Beleza artística, que tiveram a oportunidade de contemplar as maravilhosas telas de tão inspirada pintora

01/03/2015

Marcelo Alves
Marcelo Alves


Sobre Edward Coke

Não faz muito tempo, escrevi aqui sobre William Blackstone (1723-1780), o autor dos renomados “Commentaries on the Law of England”, por muitos considerado o grande compilador e sistematizador do “common law” inglês. Na ocasião, lembrei que Blackstone, embora celebrado no ambiente do “common law” (tanto na Inglaterra como nos Estados Unidos da América), é pouco conhecido entre os juristas da tradição do “civil law”. Hoje, seguindo essa toada de tentar divulgar entre nós o direito anglo-americano, vou escrever sobre o outro grande jurista inglês: Sir Edward Coke (1552-1634).

Nascido na pequenina vila de Mileham, no condado de Norfolk, Edward Coke, após a realização do ensino fundamental e médio de sua época, teve consolidada sua formação, direcionada ao estudo do Direito, no Trinity College da Universidade de Cambridge. Talentoso, sua ascensão foi meteórica. Elegeu-se Membro do Parlamento inglês em 1589 e, já em 1592, “Speaker of the House” (algo semelhante ao nosso Presidente da Câmara dos Deputados”). Um ano mais tarde foi nomeado “Attorney General of England” (cargo semelhante ao nosso Procurador-Geral da República), tendo se mostrado competente acusador em casos importantíssimos, tais como o da acusação de traição de Sir Walter Raleigh (1552-1618) e dos conspiradores da famosa “Gunpowder Plot” (a “Conspiração da Pólvora”, de 1605). Coke foi ainda “Chief Justice” (leia-se, para facilitar, Presidente) de dois importantíssimos tribunais ingleses da época: a “Court of Commom Pleas” (1606) e o “King's Bench” (1613). E esses foram apenas alguns dos cargos exercidos por esse brilhante advogado e político. Na verdade, Coke foi, certamente, o maior jurista inglês durante os reinados de Elizabeth I (de 1558 a 1603) e James I (de 1603 a 1625).

Edward Coke foi sobretudo um excepcional constitucionalista em um país de Constituição não escrita, no qual não há, pelo menos assim classicamente se diz, controle jurisdicional de constitucionalidade das leis. Foi um defensor da Constituição britânica mesmo em oposição às vontades do Monarca e do Parlamento. Como juiz, sua decisão no caso Thomas Bonham v College of Physicians 8 Co. Rep. 114 (Court of Common Pleas [1610]), conhecido como “Dr. Bonham's Case”, é famosíssima. Em síntese, ali é afirmado que o “common law” (leia-se: o direito primordial inglês), através de suas cortes, deve “controlar” os atos do Parlamento (leia-se: as leis) e, em sendo eles desarrazoados ou repugnantes (“repugnant”), declará-los nulos (“void”). Muito se discute sobre a real intenção de Coke com essa decisão, mas, sem dúvida, aí está uma semente daquilo que hoje chamamos de controle jurisdicional de constitucional das leis.

É verdade que, na Inglaterra, como sabemos, acabou por prevalecer o Princípio da Supremacia do Parlamento, imaginado (ou, pelo menos, enfaticamente defendido) pelo já citado William Blackstone, mais de um século depois, em seus “Commentaries on the Law of England”. Entretanto, ironicamente, a tese de Coke em “Dr. Bonham's Case” foi exportada para os Estados Unidos da América, onde ganhou o aplauso dos “Founding Fathers” daquela imensa República, sobretudo de John Marshall (1755-1835), o mais célebre dos “Chief Justices” da “US Supreme Court”. Alguns chegam a afirmar que o “Dr. Bonham's Case” foi a inspiração, até pela coincidência no uso das expressões “repugnant” e “void”, para a decisão de Marshall em Marbury v. Madison 5 US 137, 1 Cranch 137, 2 L.Ed. 60 (1803), caso no qual, segundo convencionado, está a origem do “judicial review of the constitutionality of the legislation” (que chamamos de controle jurisdicional de constitucionalidade das leis - modelo difuso).

Como jurista, Edward Coke foi, também, sobretudo quando já mais velho, um grande legislador. Basta lembrar que ele foi o idealizador, como presidente da comissão criada na “House of Commons” especialmente para sua elaboração, da “Petition of Right” (1628), um dos mais importantes diplomas legais do constitucionalismo inglês ao lado da “Magna Carta” (1215) e do “Bill of Rights” (1689). A influência da “Petition of Right”, aliás, transborda as fronteiras do Reino Unido, tendo servido de inspiração, como amplamente reconhecido, para outros monumentos legais, como a Constituição americana (1787) e o seu “Bill of Rights” (1789) e a Declaração Universal dos Direitos Homem das Nações Unidas (1948).

E se não bastasse isso, Edward Coke também é autor de obras “doutrinarias” fundamentais para a compreensão do “common law” com um todo. Suas duas obras mais importantes - os 13 volumes de seus “Law Reports”, conhecidos como “Coke's Reports” e os seus “Institutes of the Lawes of England” em 4 volumes (1628-1644) - foram e são ainda hoje estudados e citados tanto na Inglaterra como nos EUA. Para se ter uma ideia, durante décadas, essas duas obras foram as principais fontes de conhecimento do “common law” para os colonos e os primeiros republicanos da América do Norte.

É verdade que Edward Coke também passou por maus momentos. Foi removido de suas funções judiciais em 1620. Chegou a ser preso. Esse é preço que se paga por defender a Constituição contra o Parlamento e até mesmo contra o Rei de plantão. Mas ele retornou à cena política nos seus anos de madureza. E, desta feita, como já visto, com a “petição dos direitos do cidadão” na mão.

Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP

28/02/2015

PARA NÃO CAIR NO ESQUECIMENTO

 

Esmeraldo Siqueira (1908 – 1987)


Médico, professor, poeta, crítico literário potiguar, nasceu em 16 de agosto de 1908 e morreu em 20 de junho de 1987.

"Expressão mais alta da nossa vida literária e científica", nas palavras de Veríssimo de Melo, Esmeraldo Homem de Siqueira nasceu em Vila Nova, hoje Pedro Velho (Rio Grande do Norte), filho do juiz Joaquim de Siqueira Cavalcanti e de dona Maria Joaquina de Siqueira Cavalcanti. Transferiu-se com seus pais para Natal em 1913, iniciando no mesmo ano seus estudos primários no Grupo Escolar Augusto Severo. Depois, estudou no colégio Santo Antônio e no Ateneu Norte-rio-grandense.

Em 1928, matriculou-se na Faculdade de Medicina do Recife onde colou grau na turma de 1933. Começou a exercer a profissão em Jardim do Seridó. De lá, nas horas vagas, escrevia e mandava para A República os seus "Intentos", série de artigos sobre literatura e filosofia. A partir de 1936, transferiu-se para Natal e passou a lecionar na Escola Normal a disciplina de História Natural. Em 1941, ingressa no quadro de professores do Ateneu Norte-rio-grandense ensinando Língua e Literatura Francesa. Para essa cadeira publicou "Letras de França" (1969), que é uma espécie de excursão didática erudita nas obras e nas vidas dos grandes autores franceses.

Intelectual polêmico e contestador, portador de uma vasta cultura científica e humanista, colaborou assiduamente nos jornais A República, Diário de Natal, Correio do Povo e Tribuna do Norte. Neste último, manteve uma coluna semanal sobre literatura e filosofia entre os anos de 1954 e 1955.

Era um homem de temperamento arredio, contrário às reverências aos poderosos e aos círculos de privilegiados, preferindo o trabalho intelectual solitário que exercia habitualmente à noite, encerrada a jornada diária pelos colégios onde ministrava aulas. Deixou dezenas de livros editados versando sobre temas da literatura clássica européia, sobretudo francesa, mas também sobre temas da cultura brasileira.

A maioria desses livros foi paga por ele próprio. Na poesia, deixou uma produção vasta e variada, lírica, satírica, romântica.

Descrevendo-o em artigo, assim se expressa seu filho Juliano Siqueira: "Esmeraldo escreveu seus poemas de acordo com seu credo literário: romântico, parnasiano, simbolista, moderno. Um humanista."

Em 1949 funda, com outros colegas, a Faculdade de Farmácia e Odontologia - primeira escola superior da Universidade Federal no Rio Grande do Norte - onde lecionou a cadeira de Botânica Farmaceutica. Foi também um dos fundadores da Faculdade de Filosofia à qual vinculou-se depois que essa instituição acadêmica foi incorporada à Universidade Federal.

Em 1957, fundada a Faculdade de Filosofia de Natal, passa a lecionar Língua e Literatura Francesa. Aposenta-se em 1958 na cadeira que ocupava na Faculdade de Farmácia. Suas aulas, cultas e descontraídas, ficaram famosas por atraírem grande número de alunos, inclusive vindos de outros cursos. Ingressou, a convite, na Academia Norte-rio-grandense de Letras, em 1949, ocupando a cadeira número 29, cujo patrono é Armando Seabra.

Obras:

Caminhos Sonoros (versos), Tipografia A. Lira, Natal, 1941;
Roteiro de uma Vida, editora Pongetti, Rio, 1968;
Música no Deserto, editora Pongetti, Rio, 1968;
Fauna Contemporânea - Sátiras, editora Pongetti, Rio, 1968;
Novos Poemas (versos), Departamento Estadual de Imprensa, Natal, 1950;
Taine e Renan (ensaios), editora Pongetti, Rio, 1968;
Sugestões da Vida e dos Livros (crítica literária) Imprensa Universitária, Natal, 1973;
Caminhos Sonoros (poesias) editora Pongetti, Rio 1941;
Poemas do Bem e do Mal (poesia), editora Pongetti, Rio, 1984;
Pretéritas (poemas) editora Pongetti, Rio, 1984;
Jorge Fernandes Desconhecido in "Revista da ANL", número 15, voluma 27, novembro de 1979/80.
Fonte:Blog Pavilhão Literário Cultural Singrando Horizontes
 

 

O professor Esmeraldo Siqueira

Diversas gerações conviveram no Atheneu, no bairro de Petrópolis, pelos anos de 1960. Devem-se registrar os fatos vividos, dos quais…

Diversas gerações conviveram no Atheneu, no bairro de Petrópolis, pelos anos de 1960. Devem-se registrar os fatos vividos, dos quais participamos ou fomos testemunhas oculares. Foi uma época de conquistas, de manifestações literárias e mudanças políticas. Acontecências históricas, como a revolução em Cuba; os “Beatles”, Elvis Presley; as reformas de base; a UNE Volante e a bossa nova, que definiram os novos rumos.
Dentre os professores do Atheneu, à mercê de boa memória, lembramos Celestino Pimentel, Protásio; Rômulo Wanderley; Vicente de Almeida; Raimunda Bularmaqui; Evaldo; Albimar; Crisan; Rui Santos; Luiz Maranhão; professor Severino; Diva Lucena; Moacir de Gois; Ivone Barbalho; Angélica, Pe. João da Mata, Teresa Brito, Milton Amaral; Cônego Wanderley; e o professor Tião. Foram muitos. Uma figura singular, entretanto, era a do professor Esmeraldo Siqueira. Após a experiência inicial frustrada na profissão de médico em jardim de Angicos, o professor Esmeraldo retornou a Natal. Tendo de abandonar sua formação profissional, agregou-se ao magistério até o fim. Desde a recém-criada Faculdade de Farmácia ao Atheneu Norte-rio-grandense, lecionou por todos os anos. No ensino médio ocupou a cadeira de língua francesa, mesmo sem ter especialização em linguística.
De passos largos e cadenciados, tinha o guarda-chuva sempre à mão. Agnóstico, a voz firme repetia em francês, como se sua fosse, a indignação de Voltaire – Ecrisé l´infame – em referência à religião. Por seu espírito carismático e contestatório, atraía a admiração e o reconhecimento dos jovens. De temperamento forte, retrucava crítica demolidora a tudo que lhe contrariasse os princípios. Revelava o bom humor, favorecido pela graça de uma pilhéria. De literatura sua verve parnasiana facilitava a criação de versos simples, com rigor exigente quanto à métrica e a rima. Repudiava as renovações literárias, mais ainda se compromissadas com engajamento político. Dizia-se apolítico, entretanto fora udenista por gratidão. Não tencionava reprovar os alunos. Bastava que o Atheneu os ensinasse a ser macho.
Certa manhã, um grupo de alunos foi ao encontro do professor Esmeraldo. Inocentemente, passaram para ele a cópia de uma poesia contestatória, de caráter panfletário, divulgada na época. Tinha por título “I.N.Ê.S”, epíteto motivadamente revelado no subtítulo: “Impotência Neurótica, Econômica e Social”, com denúncia à situação do país. O poema que falava “dos esgotos do federalismo”, de corrupção e outras mazelas, atribuídos à vida das elites. A pretensão modernista do texto era voltado à conscientização obrerista das massas, recheado de chavões. À menor lida, o professor Esmeraldo sentiu-se provocado, devolveu o texto e sem parcimônia bradou palavrões. Repudiou aquilo como poesia, nem lhe reconheceu valor. O professor Esmeraldo baixou o centralismo democrático e não foi contestado.
No seu diletantismo, as aulas do professor Esmeraldo se concentravam em verdadeiro panegírico sobre a França que ele não conhecera. Ora fazia perorações sobre o Iluminismo; ora fazia citações sobre o romantismo e os autores preferidos. Ou se entusiasmava pela conjura política dos jacobinos. Em relação à escola realista, destacava Eça de Queiroz, cujos romances fez anotações, em especial pelas peripécias do Primo Basílio. Não economizava louvores a Machado de Assis. Exaltava Aluízio de Azevedo e Raul Pompeia. A fora disso, prevaleciam os fatos triviais e paroquianos da província, ou a inquisila que indispunha os intelectuais conterrâneos entre si. A falta de modéstia não permitia afagos entre eles.
Certo final de ano, o professor Esmeraldo reuniu duas turmas concluintes, a fim de aplicar as provas finais. Ditou questões e respostas, para uma turma e depois para a seguinte, as quais copiavam, na mesma sequência. Ao fim, o professor aplicava um rodízio de notas que ia da nota oito à nota dez e vice-versa.
Um aluno sentindo-se ofendido em seus pendores, acrescentou à resposta sua discordância daquela forma de fazer exame. Ao ler a desdita, o professor Esmeraldo desceu as escadas à procura do aluno, que se retirara, sem encontrá-lo. Transtornado, retornou à sala da prova e diante dos presentes, lavrou na prova do indigitado aluno o diagnóstico, os termos que eram apropriadamente de sua formação. Recomendava, como médico, às autoridades sanitárias a internação daquele elemento em hospital psiquiátrico. Subscreveu a sentença e autorizou que fosse arquivada.
Já decrépito, mas sem perder a graça, recebia na Rua Jundiaí a visita de ex-alunos. Tinha ainda ânimo de gozar com a vida: “Aos poucos estou sendo consumido pelos fundos, como acontece com as panelas, meus filhos.”, gracejava.

Gileno Guanabara, advogado e vice-prefeito de Extremoz
(gilenoguanabara@gmail.com)