PROFESSOR HOSTÍLIO DANTAS
Jurandyr Navarro
Do Conselho Estadual de Cultura
Desde os tempos imemoriais no Egito, Grécia e em Roma, apenas para citar
essas três reluzentes civilizações, a Escultura se apresentou no seu apogeu
mais promissor. As cidades, os monumentos, os templos, as estátuas, hermas
encerravam a história daqueles povos. Contavam as batalhas, a vida dos heróis,
dos filósofos, seus políticos e oradores, como poetas e governantes.
Os deuses da mitologia, a Esfinge do deserto, o perfil de Nefertiti, o
busto de Cleópatra, a imagem marmórea de Alexandre... Na Roma imperial a mesma
coisa, a arte escultural dominava a sua memória guerreira, política, cultural -
efígies de César Augusto, de Cornélia mãe dos Gracos, Catão, Marco Antônio,
Cícero... tudo era motivo expressado na pedra, no granito, no mármore por essa
manifestação do belo artístico.
Outros encantos da Antiguidade tinham o mesmo objetivo de apreciação: o
Senado Romano, tendo no átrio a herma de Pompeu que, impassível, assistiu a
morte horrenda de Júlio César; na Acrópole Ateniense, as colunas majestosas do
Partenon e a estátua banhada a ouro de Palas Atenéia.
E os tempos modernos preservaram, na sua forma de pensar e de conceber, o
espírito e essa memória cultural.
Aqui em Natal e no Rio Grande do Norte tivemos como remanescente dessa
refinada cultura artística, um grande escultor que foi Hostilio Dantas. O seu
estilete mágico desenhou na pedra informe muitas esculturas espalhadas pelo
orbe potiguar. Ainda hoje esplende no alto da torre da Igreja de São Pedro, no
Alecrim, o Apóstolo de corpo inteiro. Uma importante Praça pública exibe o
busto do Padre João Maria, na cidade dos Reis Magos. Ambas esculturas foram do
seu fino lavor. Outros trabalhos lembrados os bustos que ele cinzelou do Padre
Luiz Monte, José Augusto, Juvenal Lamartine, João Tibúrcio, Manoel Dantas, José
da Penha, José Ivo.
Dar vida figurativa a um trabalho dessa espécie é a tradução verossímil
da expressão de Miguel Ângelo:
"Libertar a figura do mármore
que a apresiona".
Recebia, Hostilio Dantas, encomendas de outros Estados da nacionalidade
pátria, tais como Pernambuco, Paraíba e Rio de Janeiro, já que a fama do seu
cinzel havia atravessado fronteiras.
O talentoso artista era também exímio professor de Desenho. Tive-o como
docente no velho Atheneu. Na sala de aula, um dia, pegou do giz com o polegar
e o indicador e traçou um enorme círculo no quadro negro, fazendo-o numa fração
de segundos. Feito o círculo, ninguém distinguia o começo nem o fim do traço,
tal a sua perfeição geométrica.
Mestre inexcedível na sua disciplina. O seu porte psicológico, recordo -
tranquilo e educado, impondo-se o equilíbrio.
Na sua arte de Escultor, na época, não apareceu outro que o igualasse.
No mundo da Mitologia havia um célebre escultor chamado Pigmalião, mestre
dos mestres na arte. Certa vez esculpiu uma estátua a qual devotava toda sua
afeição, por julgar sua obra-prima, tal a sua perfeição. E Pigmalião batizou-a
de Galatéia. E afeiçoou-se pela estátua a ponto de apaixonar-se.
E dirigia-lhe a palavra. E tal a sua paixão que invocou à deusa Vênus que
a transformasse numa mortal, sua semelhante, sendo o pedido aceito.
As esculturas de Hostílio Dantas tinham, aproximadamente, essa perfeição
estética. Só faltava ele repetir o famoso escultor de Florença, na época da
Renascença italiana, dirigindo-se à estátua por ele trabalhada de Moisés -
"Fala:"
Mas, Deus o compensou, dando-lhe estátuas falantes e bonitas, que foram as
suas filhas. Lembro-me de uma delas, docente, também, da disciplina do pai,
cuja graça e elegância parecia a silhueta formosa de Afrodite, saindo das
ondas... Desfilava, na sala de aula, perturbando a meninada, porque não se
portava tal Laura Novelle d'Andrea, que lecionava, na Europa, com o rosto
coberto por um véu, para que a sua beleza não desviasse a atenção do seus
alunos.
A saudade envolveu o nome artístico de Raimundo Hostílio Dantas, inesquecível
escultor da nossa Cidade, e saudoso professor do velho Atheneu.