09/07/2014


PADRE LUIZ MONTE


Jurandyr Navarro
Do Conselho Estadual de Cultura

Há 68 anos despedia-se do nosso mundo um dos espíritos mais cin­tilantes que a espécie humana produziu. Dele pode-se dizer outro tanto do que foi fixado para o grande pensador inglês:
"A terra cansada de dar homens comuns, gerou um Shakespeare.”
Faleceu em Natal, cidade em que permaneceu toda sua vida. Uma doença insidiosa trouxe-lhe numa taça de cicuta o veneno da morte.
Deixou o bulício dos mortais com apenas trinta e nove anos de ida­de. O golpe de sua morte foi tão lancinante para a comunidade que serviu e guiava com o archote da sua sabedoria, que abalou a Cidade inteira.
Naquele dia a notícia se espalhou à maneira de um raio: "O Pa­dre Monte morreu".!
Era muito jovem ainda para instilar os miasmas letárgicos. Estava a subir a ladeira da vida anabólica intelectual. Mas seu espírito tinha mil vezes a idade do corpo, por ser um espírito genial de um sábio e de um santo.
Na lage de seu túmulo, encerra a inscrição que diz com eloquência o que foi a sua vida: "Ele tudo fez bem".
Foi ele um dos grandes homens da sua geração. O seu comporta­mento retilíneo, cujo tropismo inclinado para o sol esplendente da Verdade, situou-se no vértice da pirâmide luminosa onde repousam os gigantes da ciência.
A sua inteligência privilegiada abraçava todo âmbito científico, cin­gia todo firmamento do saber humano, mergulhando verticalmente nas profundezas pelágicas do imenso amazonas da sabedoria.
Viveu fazendo o Bem e sempre em busca da Verdade, porque a "Verdade é o fundamento mais sublime" (Píndaro), é "a formosura da alma" (Virgílio), é "o argumento mais forte" (Sófocles).
Abeberou-se tanto do licor sagrado das fontes cristalinas da Ciêcia, que abusou da auto-regulação do seu cérebro genial. O corpo franzi­no não pôde suportar mais o peso enorme de sua cabeça majestosa.
Brilhou intensamente em todos os domínios do saber. A sua mira­culosa cultura desmentiu a afirmação do filósofo germânico Schopenhaeur, para quem:
"Mocidade e sabedoria, a um só tempo, é impossível para um mortal".
O Padre Monte aos vinte e cinco anos já dominara a ciência do seu tempo.
Ele não se parecia com os demais porque era um sábio. E "os sá­bios se diferenciam dos ignorantes como os vivos dos mortos". Era como Leonardo Da Vinci -  "um semi-deus nascido na raça dos homens".
Não passou pela vida sem deixar vestígio, à maneira de um "vôo de pássaro".
A gigantesca planta da sabedoria ele explorou da coifa, percorrendo ao longo do caule até as nervuras dos pecíolos do ramal mais alto. Talvez  não se encontre, nas páginas do Livro do Tempo, quem tivesse assimilado tão imenso cabedal de conhecimentos, com apenas trinta e nove anos de vida! Estudava em nove línguas, dentre as quais o hebraico, o grego e o latim.
Não viveu a idade provecta do nosso "Águia de Haia", nem a do au­tor do "Fausto". No entanto, com o lastro cultural que possuía, acresci­do a mais quarenta anos de    pesquisas,  teria multiplicado a sua sabedoria. Camara Cascudo afirmou ter sio ele “a nossa mais ampla cultura.”
Se dizem que o grande Rui com seus setenta anos era um dicioná­rio ambulante, o padre Monte com seus trinta, apenas, era uma enciclopédia. Já dzia Calderon, ser o genio uma revelaçao de Deus.
Como teria sido distinguida a Ciência, se ele tivesse chegado a viver os oitenta e três anos de Goethe!
Nas porfias dialéticas e disputas teológicas não encontrou adversá­rio. O seu vigoroso talento policultural pulverizava, logo de saída, as li­ções decoradas dos antagonistas.
Se tivesse vivido na Roma de Cícero, teria sido adornado com a coroa de mirto que cingia a fronte dos grandes oradores.
A tocha da Verdade, acesa pelo Cristo, ele tutelou na noite de um mundo repleto de misérias humanas. Pelo seu singular devotamento aos semelhantes, parecia ter se embebido da fulguração radiosa que refulgiu aos olhos deslumbrados das multidões nos acampamentos da Galileia.
Em seu meigo coração residia o Espírito Santo, estava Jesus, a chama da Vida. A sístole e a diástole replicavam a melodia da vida no santuá­rio do seu coração, aberto, todo aberto para o Cristo.
No seu apostolado era o sentinela indormido da Igreja Católica. Defendia a cidadela religiosa dos ataques dos incrédulos, como os fagócitos defendem, muitas vezes, o organismo da ofensiva e da invasão patogênica das chusmas microbianas.
Vestido de luz, a todos ensinava, aconselhava e amava.
A alma do Padre Luiz Monte é aquela "feliz alma que uma centelha divina incendiou e que o fogo sagrado devorou".
A sua morte, embora prematura, e levando-se em conta a sua irre­parável perda para a Igreja, pelo menos durante largo período, não constitui motivo para seus contemporâneos ficarem inconformados, em virtude de ter sido um chamamento de Deus, contra o quai a ninguém é lícito se insurgir.
Não nos deve causar tristeza a sua morte. Devemos afivelar a másca­ra lutuosa por termos em derredor gente de baixa extração, e não por perde­mos os espíritos cintilantes.
A propósito disso, Epemetes, o tirano, certa vez, vendo Demóste­nes chorando pela morte de um filósofo, indagou ao autor da "Oração da Coroa", por que tanto lacrimejava, pois não se concebia um ho­mem do seu quilate em prantos. Respondeu-lhe Demóstenes:

"Não choro eu, ó Epemetes, porque o filósofo morreu, senão por tu que vives; e, se não o sabes, quero te fazer sabê-lo, é que na Academia de Atenas mais choramos nós porque vivem os maus, que porque morrem os bons".

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