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26/10/2017


O SINO DA MATRIZ
Valério Mesquita, escritor

A Igreja de Nossa Senhora da Conceição em Macaíba possuía um sino antigo, fincado na fachada superior do templo, que durante muitos anos se constituiu no cartão postal da cidade. O seu som dolente e pungente reunia os católicos de perto e da distância. As badaladas da Ave Maria, às 18 horas, envolvia de contrição e respeito toda urbe cristã, tal a magnitude do toque, a severidade do timbre do bronze que conferia à sagrada construção de 1882, uma visão mística a quem se postasse de frente.
Na santa missa, durante a elevação do cálice, a sonorização propagava ondas potentes e magnéticas que faziam os ausentes se benzerem. Ainda repercute nas ruas e nos caminhos o dobre de finados, executado com tanta perfeição que mais parecia uma música eletrônica saída do órgão celestial de um campanário rogando acolhida, como uma prece, pela alma do falecido. O toque do sino imprimia fé e dignidade cristã ao cortejo fúnebre pelas ruas de Macaíba.
Nas catedrais e igrejas do mundo inteiro, os sinos sempre exerceram um papel evangelizador invisível, porque mítico, e mágico, pois só o catolicismo o utiliza como símbolo e marca registrada de sua fé. De um tempo para cá (cerca de mais de trinta anos), a sonoridade forte do velho sino emudeceu. Por que parou, parou por quê? Perguntam-se os paroquianos.
Sobre o fato, rolam muitas histórias. Uma delas cômica. Num candente toque de finados a corda enroscou-se na perna do sacristão, o saudoso Adelino Moreira, quase o arremessando janela a baixo, tal a força e o peso do instrumento. O padre Alcides Pereira teria decretado a aposentadoria do sino e fechou a janela de cobogó para ele não dobrar mais. O fato é que não se ouviu mais o austero sino da Matriz. Ouvi, ultimamente, o som do atual. Achei-o diminuto e agudo. Não se coaduna com a dimensão do templo de 125 anos de idade. O som é roufenho, fraco como se o bronze tivesse contraído sinusite. Com essa dúvida, procurei a secretária paroquial Jalva Pereira dos Santos que me informou que o sino é o mesmo. Ele foi restaurado na Base Naval de Natal porque apresentava uma rachadura.

O lamento que faço é porque morreu o som personalíssimo e forte de antigamente. Envelhecido por tantas canções de louvor e contrição, além de cirurgiado, o sino da Matriz perdeu a voz. As suas “cordas vocais” se debilitaram e já não emite o mesmo sinal, a mesma benção, a mesma mensagem cifrada do seu som característico. Apenas, hoje, escuto o eco intermitente como se fosse o suave barulho das renováveis ondas do mar.

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