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22/02/2015

Roberto Guedes da Fonseca publicou no grupo Adoramos Natal

Roberto Guedes da Fonseca
Roberto Guedes da Fonseca21 de fevereiro de 2015 23:50
De quem você lavará os pés?
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O fim do carnaval e o início da Quaresma anunciou sutilmente ao mundo cristão ao redor da terra que na quinta-feira que marca o tríduo da “Semana Santa” paramentados líderes de distintas denominações procurarão repetir a humildade com que santamente Jesus Cristo lavou os pés de seus seguidores como a deflagrar o período da Paixão que o levaria à morte física no madeiro infame na Praça dos Crâneos. 
Haverá muito ritual, mercê das características que igrejas se adotaram ao longo dos séculos em que mandaram monopolisticamente no mundo influenciado pelo exemplo e pelos ensinamentos do Cristo, mas haverá também o ensejo natural para que todos reflitam sobre uma das lições que Ele deixou mais indelevelmente nos corações e mentes de todos os que o sucederam na vida corpórea através de repetidas reencarnações.
A ter lugar preferivelmente nas mais ostensivas catedrais, a cerimônia do Lava-Pés nos remetem à antológica Santa Ceia e aos últimos gestos de Jesus Cristo antes de ser entregue aos soldados romanos, julgados pelo Sinédrio de Jerusalém e padecer sob as mãos do cônsul de César, Pôncio Pilatos. Como ensina o Evangelho, reunido com os doze discípulos, Ele partilhou pão e vinho como símbolo de seu próprio corpo e sangue que daria em sacrifício. Depois, em sinal de humildade, lavou os pés de todos os apóstolos.
Para muitos pretensos comentaristas da gloriosa passagem de Jesus pela Terra de dois mil anos atrás, a lavagem dos pés foi uma simbólica demonstração de humildade, atributo indispensável a todos os cristãos. Porém, mais do que a humildade, o gesto simbolizou que a vida de Cristo esteve a serviço da salvação de cada um de nós em relação ao jugo de nossas imperfeições e inferioridades. E foi um convite para que sigamos Seu exemplo e busquemos servir, e não ser servido, algo que Ele deixou muito claro em suas palavras e testemunho vivo. 
Para a igreja católica, em especial, a importância dessa celebração é máxima, porque contempla, medita e celebra o centro do mistério da salvação. Tanto é assim que o calendário de todas as festas do ano litúrgico dependem do tríduo pascal.
Assim como muitas outras atitudes características dos seguidores contemporâneos do Nazareno, a lavagem dos pés foi herdada de costume hebreu. 
Na época de Cristo, as pessoas caminhavam por estradas de terra e, pelo fato de usarem sandálias, chegavam aos seus destinos com os pés empoeirados. Por isso, assim que um visitante entrava numa casa, vinha um escravo, caso houvesse algum ali, para lavar-lhe os pés.
Em outro acontecimento histórico, o carpinteiro de Belém foi alvo de uma distinção que entrou para a Bíblia:
“Na casa do fariseu, não houve quem trouxesse água para lavar os pés de Jesus. Então, veio uma mulher que os lavou com suas lágrimas e enxugou com os cabelos”, conta João Evangelista (13.1-17).
Ele e seus acompanhantes estavam na casa de Simão, o rico fariseu que o procurara, e Jesus apreciou a lavagem dos seus membros inferiores pela mulher, também apresentada nos textos sagrados como tendo conduta suspeita, rescendendo à prostituição. O Mestre chegou a repelir a resistência que Simão e convivas faziam à presença dela ali e criticando o anfitrião porque não havia tomado a iniciativa de Lhe proporcionar sequer a lavagem das mãos.
Agente basilar da igreja humana com que o Cristo pensou promover o burilamento espiritual do mundo após sua crucificação, o discípulo Pedro passou anos exultando porque teve oportunidade de lavar solas, dedos e o dorso dos pés do Filho do Homem, e nunca se esqueceu de que na véspera de sua Paixão Jesus fez o mesmo com ele e todos os outros onze apóstolos. 
Um dos maiores espíritos que o mundo conheceu, Francisco de Assis dedicava-se a esta tarefa cotidianamente, e seu mais notável seguidor nos dias atuais, o papa Francisco, será com certeza o lavador mais visado na quinta-feira da Paixão. Quebrador de tabus e rigoroso pretendente a devolver à sua ordem religiosa, tanto quanto possível, as características que lhe foram pretendidas e imaginadas pelos primeiros cristãos, no ano passado o Sumo Pontífice adotou o ritual como cirurgia contra o fechamento nobiliárquico imposto à Santa Sé pelo domínio de sucessores de Pedro que mais agiram como políticos de batina do que como seguidores da humildade crística: ele realizou a tradicional cerimônia fora das basílicas da capital italiana e incluiu duas meninas entre os doze – número adotado há mais de dezessete séculos como reprodução do total de apóstolos beneficiados pela iniciativa de Jesus – uma delas muçulmana
Não se imagina ainda o que Francisco fará desta feita para aproximar ainda mais a cerimônia dos objetivos que levaram o Cristo a lavar os pés de seus colaboradores diletos, numa iniciativa que atrai muitas tentativas de explicações. De todas, a melhor é o didatismo referente à Comunhão.
Partamos do princípio de que o Príncipe de Deus e os discípulos não tinham escravos, e dividiam suas tarefas entre eles. Os preparativos da ceia da véspera da Paixão já tinham sido providenciados. Alguém conseguiu o local, outro preparou a mesa, outro adquiriu os alimentos. Quem, entretanto, lavaria os pés dos presentes? Cada um poderia sentir-se realizado por ter cumprido sua tarefa, mas sempre existe algo que precisa ser feito e ninguém quer fazer.
Naquele momento, Jesus poderia ter ensinado uma lição de independência, ordenando que cada discípulo lavasse seus próprios pés. Seria uma alternativa plausível. Entretanto, Cristo não queria incentivar a auto-suficiência, o individualismo e o isolamento, mas sim a comunhão. “Cada um com os seus problemas. Você lava seus pés e eu lavo os meus”, poder-se-ia dizer, mas não é exatamente este o ensinamento cristão. Por isso, não existe o “auto batismo” nem “ceia individual”. Expressamente manifestado por Jesus, o desejo de Deus é que seus filhos vivam em comunhão.
Esta necessidade de comunhão e mais precisamente o imperativo de ver o mundo Cristão recorrer saudavelmente ao lava-pés como forma de Honestamente servir ao seu igual. 
No monte das Oliveiras, Ele surpreendeu ao se levantar, colocar água na bacia, pegar a toalha, abaixar-se e passar a lavar os pés dos discípulos. Ao tomar esta iniciativa, Jesus assumiu a posição de um servo, de um escravo. Ele fez o trabalho que ninguém queria fazer. Ele fez o que nenhum fariseu jamais imaginaria fazer. O Mestre não tinha obrigação de fazer aquilo, mas estava ensinando muitas lições por meio daquele gesto. Recorde-se que Ele pregou que não tinha vindo ao mundo para servir-se, e sim para servir. 
De olho na expectativa em torno do que se prepara mundo afora para a ação dos sacerdotes junto aos pés de selecionados paroquianos, volto-me para todos os meus amigos internautas de fé, praticantes de distintas denominações, perguntando-me se estão se indagando sobre o quanto precisam adotar o exemplo de Jesus. Afinal, temos que fazer mais do que a nossa obrigação.
Viemos ao mundo ao mundo para amar a Deus e praticar o mais puro amor pelo próximo, descendo ao nível dos necessitados com o propósito de, sem diminuí-los, ajudá-los a elevar o padrão moral e espiritual de suas existências. Lavar pés de quem precisa desta ajuda é um meio de assegurar o apoio de que carecem, por isto a pergunta lá em cima: você, amigo internauta de fé, já se dispõe a lavar os pés de alguém, de uma, duas, três, doze pessoas, mais do que isto, quantas puder. De quem são os pés que você se dispõe a lavar?
Pergunte-se a este respeito sem a preocupação que há semanas ocupa assessores de vigários na escolha dos beneficiários da cerimônia que se avizinha. Pergunte-se não cogitando de um ato simbólico como os abraçados e protagonizados pelos novos pregadores da fé em Cristo. Não cinja sua vontade a uma quinta-feira. Imagine que a seu derredor há muitos carentes de uma boa lavagem de pés, não necessariamente com a aplicação e fricção de água e sabão nas extremidades dos membros inferiores, mas de diversas outras maneiras em que sua iniciativa de solidariedade Cristã pode assegurar-se muito melhor eficácia em benefício de quem precisa. 
Daí a objetivação do que nos interessa neste primeiro domingo após o carnaval: tomando o Lava-pés somente como símbolo da necessidade que enfrenta de ajudar alguém e preocupando-se em expandir ao máximo os efeitos desta sua doação, você já olhou à sua volta para ver quais são os mais próximos e carentes candidatos a receber este seu benefício?
Pensem nisto, amigos e amigas internautas de fé, enquanto a lucidez lhes permite aproveitar este dia para refletir sobre o privilégio que o bafeja de ter como beneficiar, em lugar de sofrer a necessidade de viver pedindo à Providência que alguém lhe venha estender a mão. 
Bom domingo para todos!
Roberto Guedes da Fonseca, em 
Nova Parnamirim, Parnamirim (RN), 22 de fevereiro de 2015.

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