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03/09/2014

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   A L M I R A N T E   D A   A R M A D A   I M P E R I A L
Por: Gileno Guanabara, sócio efetivo do IHGRN

                        Ao tempo em que foi proclamada a independência do Chile, o Brasil ainda estava às forras com as tropas portuguesas, indispostas com a proclamação da independência, final do ano de 1822. Reconhecido herói da independência chilena, o capitão inglês Lord Cockrane, residia em suas terras, no distrito de Quintera, no Chile. Por ordens de D. Pedro I, José Bonifácio, então Ministro do Interior e das Relações Exteriores do Império, enviou instruções ao cônsul brasileiro, em Buenos Aires, Antônio Manuel Corrêa da Câmara, a fim de transmitir ao capitão o convite do imperador, para vir lutar pela independência do Brasil. O cônsul enviou carta a Lord Cockrane: -Milord, le Brésil puissance du prémier orde, devient um nouvel Empire, une nation independente sons le legitime heritier de la monarchie, Pierre le Grand, son auguste defenseur ... Abandonez vous, Milord, à la reconnaissance Brésilienne; à la munificence du Prince; à la probité sans tache de l’actual Gouvernement; on vous ferá justice, on ne rebaisserá d’um seul point da haute consideration – rang, grade, caractére et avantajes qui vous sont dus, - Consul de L’ Empire du Brésil à Buenos Ayres, 4 de novembro 1822.

                        Diante de tamanha honraria, Cockrane aceitou o convite. Ao chegar ao Rio de Janeiro, foi-lhe confiada a chefia das forças navais do Império. Para isso, criou-se uma graduação militar específica para o Lord: Almirante da Armada Imperial.

                        O afamado capitão trazia consigo os feitos marítimos notáveis de que participara durante as lutas no Chile. Sobressaía a argúcia da inteligência combinada com o uso da força, cujas manobras, em pouco tempo, lhe auferiram o garbo de hábil soldado e bom político, o que serviria para consagrar a unidade de parte das províncias do Império ainda conflagradas, a ponto de quase constituírem Estados independentes. Foi o caso do Norte do Império, ainda sob a ocupação das tropas portuguesas que resistiam à independência do Brasil. Nas batalhas que o bravo marinheiro travou no Maranhão diante da esquadra portuguesa, fazendo aparentar uma superioridade militar que não tinha, em força e calibre de suas canhoneiras, o Lord fustigou, pondo o inimigo ao largo do Oceano Atlântico e obrigando o grosso da tropa a se refugiar em Portugal. Apresou mais de cem navios e cerca de três mil homens foram feitos prisioneiros.

                        Em reconhecimento, Cockrane passou a integrar a fidalgaria do Império. Viu-se agraciado pelos seus serviços com o título de Marquês de Maranhão e lhe foram feitas doações de terra. Por mérito do capitão, fez-se a incorporação na tropa brasileira os ingleses Grenfell, Taylor, Crosbie, W. Jackson, Crewley, Clarence, Monson, Wallace, March, Jannary e Charles Rose, dentre outros, marinheiros que, pelo reconhecimento de suas bravuras, assumiram o posto de oficiais da Armada. Em pouco tempo, seus nomes foram incorporados à nomenclatura civil nacional.

                        O Ministro das Relações Exteriores lhe reservava o maior respeito, em razão das tarefas que foram dirigidas ao Almirante inglês, com o reconhecimento de seu melhor desempenho nas atribuições. Dizia José Bonifácio em carta: - Entretanto, V. Ex., não sendo menos hábil político que guerreiro, e por outro lado gozando da confiança de S. M. o Imperador, está nas circunstâncias de empregar todos os meios que estão ao seu alcance e autorização para aplanar quaesquer difficuldades do momento, que se opponham ao êxito da sua importante commissão... 12 de julho de 1823, Rio de Janeiro.

                        Uma vez consolidada a independência do Brasil, D. Pedro foi responsabilizado por Lord Cockrane de não cumprir os pagamentos devidos, fazendo com que o Almirante regressasse a Inglaterra desgastado com o Brasil, inúmeras foram as missivas dirigidas ao Imperador, cobrando a dívida, sem sucesso. O Norte do Império fora reconquistado, os navios e tropas portuguesas haviam sido tangidas, expulsas para Portugal.

                        Por conta do imbróglio, o título de Marquês do Maranhão foi repudiado pelo agraciado que, ao escrever suas Memórias, já residindo na Inglaterra, chamou o Brasil de país de caloteiros. Por conta dessa desdita, Lord Cockrane teve confiscadas as terras que lhe tinham sido doadas pelo Estado brasileiro. O almirante inglês apenas reclamara o pagamento objeto do contrato que firmara com o governo imperial.

                        Essa pendenga quanto ao pagamento não realizado e a irritação do Almirante da Armada por não receber o que lhe era devido, exatamente conforme o combinado, em sendo o primeiro militar, e ainda mais estrangeiro, que ocupou o posto de Almirante da Armada do Brasil – reconhecidamente o comandante dos feitos que asseguraram a integridade do Norte brasileiro -, fez com que o herói das lutas navais da Independência não constasse do merecido registro no Museu da Marinha no Rio de Janeiro, nem ainda tampouco com destaque o seu reconhecimento nos manuais da Armada. Fazem sentido os termos honrosos, através dos quais, o governo Imperial, na fala de José Bonifácio, se comunicava com o Almirante, nas correspondências trocadas com Lord Cockrane: Tenho presente a carta com que V. Ex. me favoreceu, em data de Maio próximo passado. Nella vejo o detalhe da illustrada conducta de V. Ex., depois da sua sahida deste porto, e as diversas difficuldades que V. Ex. tem encontrado, as quaes, com grande magua, contemplo, e creio dificultosas de vencer, porque se acham, pela maior parte, de tal fórma enlaçadas com a nossa situação política, que só se desvanecerão inteiramente quando o sistema geral do Império estiver de todo concentrado.

                        Justo e acertado, até a consolidação da independência. Depois, o jeitinho brasileiro do devo e reconheço, mas só pago quando puder.

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