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30/05/2014



CLEANTHO SIQUEIRA (2)

Jurandyr Navarro
Procurador do Estado, aposentado, e Presidente
do Instituto Histórico e Geográfico do RN

Antes de completar o tempo na Companhia Quadros para tornar-se Reservista, Cleantho Homem de Siqueira passou um tempo servindo como funcionário da Estrada de Ferro, repartição federal onde o genitor, Carlos, ocupava cargo de direção.

Por essa quadra da sua juventude ele tinha amizades, naturalmente, com a meninada da sua idade. Os Pedroza, Walter, Petrônio, Murilo e outros irmãos, da rua Uruguaiana, com os quais queimavam e rasgavam Judas, pendurados nos postes, nos sábados de Aleluia, ao toque das badaladas do sino da igreja da Matriz!

Tomava parte de brincadeiras outras, de brigas, as incontáveis brigas de ruas, que faziam confluência com a da Estrela, com Demóstenes e os irmãos Leléu e Fafá; Rui Parrudo, Lourival Cara-olho, da rua dos Tocos; Nilo da rua Mossoró; e outros.

Quando não, era a subida aos morros do Tirol, a descida à praia do Meio e ao Rio Potengi, assistir brigas de galo, caçar sibite, sanhaçus do papo amarelo e outros pássaros, em quintais, armados de baladeira, e outras diversões.

Proibido mesmo era ficar parado.

O avanço da idade ia mudando as amizades. Chega a vez dos irmãos Bezerra, Luiz, José e Manuel Augusto nos verões da Areia Preta e Praia do Pinto, eles, sempre acompanhados de José Mauro de Vasconcelos, o célebre autor de “Meu Pé de Laranja Lima”. Ao lado deles, apareciam, de vez em quando, Armando Viana e, às vezes, o irmão brincalhão, Aldo, irmãos que eram da bela Nair, namorada de Cleantho.

Por esse tempo, predominava a pesca e a natação, naquela ponta de mar, da praia encantada.

Evoluindo no seu deleite pela pescaria, Cleantho se torna, salvo engano, um dos fundadores do Pâmpano Sport Clube, cuja sede funcionava na Praia do Meio.

E numa dessas partidas ou torneios do Pâmpano, sucedeu o episódio que quase se transformou em tragédia, do então menino que ficou, durante horas, numa das locas do chamado Poço do Dentão, episodio que Cleantho presenciou e que deu o seu esforço para salvá-lo.

Essa inclinação pelo esporte, levou-o a pertencer, ao lado de Aluízio Menezes e Luiz G. M. Bezerra, ao Conselho Regional de Desportos e da Fundação de Esportes de Natal.

No tempo da conclusão do Curso da Companhia Quadros, que fez ao lado de Aluízio Alves, este depois, grande político, Cleantho foi convocado para o Exército. E no posto de Sargento, se inscreve como voluntário  à Força Expedicionária Brasileira, partindo, em 1944, para a Itália.

Fazia parte do décimo primeiro Regimento de Infantaria de São João del-Rei, das Minas Gerais.

Permaneceu alguns meses em solo italiano, antes de retornar ao Brasil. Contou, certa vez, que terminado as suas hostilidades, presenciou cenas horripilantes, com a miséria instalada nas cidades e povoações arruinadas pela guerra, onde imperava a fome, e as crianças desamparadas, doenças e violências indomadas.

Passou dias e noites  intermináveis sofrendo no corpo e na alma, as agruras de uma guerra que ele tomou parte ativa, em terra estranha.

Não foi acometido de neurose como tantos outros, porém, contava ter tido pesadelos que o atormentaram por algum tempo.

Certa vez, em escaramuças de trincheira, uma granada, lançada pelo inimigo, explode perto dele, sangrando os seus ouvidos, fato que o fez baixar ao hospital de campanha.

De volta à pátria, durante a viagem, tem o nome relacionado para continuar no Exército, a seu pedido.

Instala-se em São João del-Rei, nas Alterosas. Nos ares mineiro conhece uma linda moça de nome Maria de Lourdes, com quem contrai casamento. Desse enlace matrimonial nasceram oitos filhos: Carlos, Eleonora, Pedro Marques, Henrique Afonso, Everaldo, Ana Maria, Gustavo e Rodrigo.

Retornando a Natal é incorporado no décimo sexto Regimento de Infantaria e depois passa a servir no Quartel-General da Guarnição.

A sua reforma dá-se no ano de 1973, na patente de Major. Tem 51 anos de idade.

É lembrado pelo então Magnífico Reitor, Genário Alves da Fonseca, que o leva para a UFRN, onde permanece até 1991, aos 69 anos.

Na Universidade ele dirige a Divisão de Atividades Desportistas e depois a Coordenadoria do Restaurante Universitário.

No governo estadual ele exerceu vários mandatos na Comissão de Moral e Civismo, chegando a presidi-la, por algum tempo.

Como militar recebeu várias Medalhas, a saber: - Medalha de Ouro (30 anos de bons serviços prestados ao Exército); Cruz de Combate de Segunda Classe e Ordem de Mérito Militar, no grau de “Cavaleiro”.

Pertencente a uma família de ascendentes inteligentes, ele também o foi. Admirava a todos a sua precocidade em ler jornais aos seis anos incompletos de idade, numa época em que a meninada iniciava a soletrar aos sete anos!

Já em idade madura, teve a idéia ou foi sugerido por amigos, para escrever um livro sobre a guerra que participara. E ele, depois de alguma reflexão, o fez. Trata-se de uma obra bem escrita, com estilo claro e de conteúdo importante para os anais da nossa História, já que relaciona todos os riograndenses do norte que participaram daquele conflito bélico.

Tive o grato ensejo de prefaciá-la. Tem ela as suas orelhas apresentadas pelo historiador Olavo de Medeiros Filho, de saudosa memória.

O livro em questão foi re-editado pela Editora da UFRN.

Antes de adoecer, chamou-me à sua casa e deu-me um presente régio: - uma bela enciclopédia de doze volumes, contando cento e cinqüenta e seis colaboradores. Uma beleza!

Cleantho Homem de Siqueira deixou escritos esparsos e algumas Palestras por ele proferidas em ambiente militares e em Colégios, ministradoras do civismo pátrio, uma dessas palestras recebeu o elogio público do intelectual Veríssimo de Melo.

Foi ele um cidadão honrado, católico praticante, amigo dos amigos, tolerante, apaziguador e exemplar pai de família.

Deixou saudades.

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