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20/10/2021
Meritocracia e mediocridade
Padre João Medeiros Filho
Hoje, é frequente a decepção com vários líderes, parlamentares, administradores, magistrados e religiosos. Nomes – tampouco partidos – não bastam para convencer. Urge a presença de autênticos gestores para nosso povo, desprezando amadores, oportunistas, aventureiros e arrivistas. Infelizmente, o coronelismo ainda não foi abolido. Reaparece travestido de ideias democráticas, mas com iniciativas e ações autoritárias e autocráticas. Há carência de cidadãos verdadeiramente carismáticos, isentos de discursos maquiados e despidos de sofismas. É premente a presença marcante de indivíduos e grupos, imbuídos de ética, justiça, trabalho e sensibilidade social. Necessita-se de pessoas qualificadas, que atuem nas esferas nacional e regionais, voltando-se para os diversos segmentos da sociedade. Sem o surgimento de lideranças legítimas, as instituições permanecerão órfãs e não se ajustarão às necessidades contemporâneas. Isso não significa simplesmente ter esperança neste ou naquele chefe ou sigla. Ao contrário, aspira-se à articulação de pessoas com propósitos sérios e dedicação às instituições. Gente que possa servir e não se utilizar delas para seus projetos individuais.
Muitos buscam guarida nos entes públicos, privados e até religiosos, com intuito de ocupar um lugar que lhes garanta vantagens e benesses. Procuram blindar-se, pois almejam cobranças em suas ações. Acomodam-se e contentam-se com resultados pífios, decorrentes de suas opiniões e atuações. A sociedade hodierna está rejeitando estes velhos costumes e métodos. Ela vem tecendo uma dinâmica cultural, na qual não se aceitam conchavos e barganhas, onde predominam benefícios pessoais ou de grupos. A carência de líderes comprometidos com o bem comum e o progresso da nação é consequência de uma insuficiente formação humanística e cívica. Outrossim, as religiões devem fazer o “mea-culpa”. Sem isto, corre-se o risco de se deixar conduzir por princípios duvidosos e envolver-se nas malhas da injustiça e desonestidade. Neste ponto, o papel das crenças religiosas é urgente e essencial.
No Brasil atual – salvo engano e verificadas as exceções – consolidam-se hegemonias medíocres. Está se tornando habitual na sociedade a presença de governantes e legisladores incapazes de oferecer soluções aceitáveis para os mais comezinhos problemas. E o pior: muitos se destacam no voo livre do despreparo e improviso. E deste modo, relega-se ao desprezo a valorização dos méritos. Os pseudolíderes são habilidosos em ocultar seus interesses e erros. Há quem ouse, à sorrelfa ou às claras, defender as maquinações de desvio do dinheiro público e enriquecimento ilícito. Assemelha-se a uma ética de guerra, na qual os fins justificam os meios. Uma característica relevante dos medíocres consiste em não admitir seus erros e perceber suas limitações. Os despreparados são ousados e candidatam-se, sem pejo, a funções de grandes responsabilidades, sem a mínima condição de exercê-las. Os probos, muitas vezes, se abstêm, pois são imbuídos do exercício da autocrítica, imprescindível à renovação.
As entidades brasileiras, inclusive religiosas, necessitam de uma nova onda de sérias lideranças. Jesus já alertava contra o perigo dos remendos: “Não se põe conserto de pano novo em roupa velha.” (Mt 9, 16). O país exige outras dinâmicas para superar estorvos obsoletos. A população está saturada de discursos teatrais e inócuos. Um político, já falecido, ao dirigir-se à tribuna do Senado, assim se expressou: “Não suporto mais essa pletora de palavras vazias, desprovidas de ideias e propostas de soluções”. É-nos lançado um grande desafio: modificar a cultura da mediocridade, que contamina indivíduos, instituições e lugares. Esse processo requer a dedicação de todos à autocrítica e ao compromisso de fazer escolhas bem fundamentadas. É indispensável agir com sabedoria no exercício das responsabilidades. Não se deve permitir espaços àqueles que escondem a própria superficialidade, dominando pessoas, grupos e entidades. É hora de prevalecer o mérito, a partir de uma ação inteligente e inovadora, dedicada à vida, paz e justiça. Cristo, usando metáforas, desaprovava as atitudes de seus contemporâneos, comparando-as a cegos que conduzem outros deficientes visuais. “Ora, se um cego guiar outro cego, ambos cairão no precipício.” (Mt 15, 14). E o profeta Isaías, oito séculos antes do cristianismo, alertava seus contemporâneos: “Vários de seus responsáveis são míopes. Muitos são como cães mudos... Seu prazer é dormir e permanecer insensíveis ou incólumes a tudo!” (Is 56, 10).
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