O SINO DA MATRIZ
Valério Mesquita*
A Igreja de Nossa
Senhora da Conceição em Macaíba possuía um sino antigo, fincado na fachada
superior do templo, que durante muitos anos se constituiu no cartão postal da
cidade. O seu som dolente e pungente reunia os católicos de perto e da
distância. As badaladas da Ave Maria, às 18 horas, envolvia de contrição e
respeito toda urbe cristã, tal a magnitude do toque, a severidade do timbre do
bronze que conferia à sagrada construção de 1882, uma visão mística a quem se
postasse de frente.
Na santa missa, durante
a elevação do cálice, a sonorização propagava ondas potentes e magnéticas que
faziam os ausentes se benzerem. Ainda repercute nas ruas e nos caminhos o dobre
de finados, executado com tanta perfeição que mais parecia uma música
eletrônica saída do órgão celestial de um campanário rogando acolhida, como uma
prece, pela alma do falecido. O toque do sino imprimia fé e dignidade cristã ao
cortejo fúnebre pelas ruas de Macaíba.
Nas catedrais e igrejas
do mundo inteiro, os sinos sempre exerceram um papel evangelizador invisível,
porque mítico, e mágico, pois só o catolicismo o utiliza como símbolo e marca
registrada de sua fé.
De um tempo para cá
(cerca de mais de trinta anos), a sonoridade forte do velho sino emudeceu. Por
que parou, parou por quê? Perguntam-se os paroquianos.
Sobre o fato, rolam
muitas histórias. Uma delas cômica, Num candente toque de finados a corda
enroscou-se na perna do sacristão, o saudoso Adelino Moreira, quase o
arremessando janela a baixo, tal a força e o peso do instrumento. O padre
Alcides Pereira teria decretado a aposentadoria do sino e fechou a janela de
cobogó para ele não dobrar mais. O fato é que não se ouviu mais o austero sino
da Matriz. Ouvi, ultimamente, o som do atual. Achei-o diminuto e agudo. Não se
coaduna com a dimensão do templo de mais de 140 anos de idade. O som é
roufenho, fraco como se o bronze tivesse contraído sinusite. Com essa dúvida,
procurei a secretária paroquial Jalva Pereira dos Santos que me informou que o
sino é o mesmo. Ele foi restaurado na Base Naval de Natal porque apresentava
uma rachadura. O lamento que faço é porque morreu o som personalíssimo e forte
de antigamente. Envelhecido por tantas canções de louvor e contrição, além de
cirurgiado, o sino da Matriz perdeu a voz. As suas “cordas vocais” se
debilitaram e já não emite o mesmo sinal, a mesma benção, a mesma mensagem
cifrada do seu som característico. Apenas, hoje, escuto o eco intermitente como
se fosse o suave barulho das renováveis ondas do mar. Mesmo assim, salve Nossa
Senhora da Conceição, padroeira de Macaíba! Salve o dia 08 de dezembro!
(*) Escritor.
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