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21/12/2019



O parlamento e seus desvios, opus 2
Tomislav R. Femenick – Jornalista – Do IHGRN

O Brasil já teve várias duplas dinâmicas e vitoriosas. Pelé e Garrincha, nas Copas de 1958 e 1962; Pelé e Coutinho, no Santos, nas décadas de 1950 e 60; Rivaldo e Ronaldo, em duas Copas do Mundo, em 1998 e 2002; Romário e Bebeto, na Copa América de 1989. Houve várias outras, mas nada supera a dupla Batoré e Nhonho, no Congresso Nacional. Batoré, também conhecido como Davi Alcolumbre (DEM-AP), é o presidente do Senado e, por decorrência, do Congresso Nacional. Nhonho, ou Rodrigo Maia (DEM-RJ), é o presidente da Câmara dos Deputados.
Ambos vieram do baixo clero do Congresso, eram parlamentares com pouca expressão política. O primeiro assumiu o cargo num movimento para evitar a reeleição de Renan Calheiro, o esperto que foi engolido pela própria esperteza. Davi responde a dois inquéritos no STF. Rodrigo foi investido na atual posição na esteira do escândalo de Eduardo Cunha, que teve o mandato cassado pelo plenário da Casa. E, também, responde a inquéritos na Polícia Federal. Em síntese, nenhum dos dois teve mérito próprio para ocupar o cargo que tem. É esse o Congresso que temos.
Esses senhores presidem instituições com características ímpares. Ali todo mundo ganha muito e trabalha pouco. Nessas duas casas do povo (pois somos nós, “os iguais, menos iguais”, que pagamos as contas de suas senhorias) é praxe que só se trabalha dois dias por semanas; em casos extras podem ser mais que isso. E ninguém tem o ponto cortado; eles são “os iguais, mais iguais”. É por isso e por outras coisas que, de vez em quando, alguém tem o desplante de chamar o nosso parlamento de “casa de mãe Joana”.
A Constituição Federal garante que “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se [...] a igualdade...”. Lindo de se dizer e ouvir. Entretanto, igual à história contada em A Revolução dos Bichos, de George Orwell (1980), há aqueles iguais que são mais iguais que outros. Vereadores, deputados e senadores têm as verbas de gabinete durante todo o seu mandato, têm uma penca de assessores parlamentares que nada mais são (há exceções) que cabos eleitorais trabalhando o tempo todo para sua excelência, têm as verbas dos fundos partidário e eleitoral, bem como suas verbas orçamentárias. Tudo para se fazer presente à memória e aos bolsos dos eleitores que se vendem por qualquer ilusão ou qualquer “tostão furado”. Agora eu pergunto: como podem os outros cidadãos competir com essa máquina de triturar novas lideranças?
Em nossa Câmara Municipal e em nossa Assembleia Legislativa tivemos casos escabrosos que resultaram em condenações de “representantes do povo” e prisões de funcionários de “altos escalões”. Vez ou outra deputados e senadores são condenados e até perdem seus mandatos. No entanto, tudo permanece como dantes no quartel de Abrantes.
Agora a pergunta que está contida em nossa garganta: E o que fazer? Parafraseando Max Weber (1997), “todo conflito no parlamento implica não somente numa luta por questões importantes, mas também numa luta pelo poder pessoal”, mas “quer amando, quer odiando a política parlamentar – não podemos afastá-la”. Em outras palavras: ruim com as casas parlamentares, pior sem elas.
Então, a tarefa é reformular nossos legislativos. Não é tarefa fácil, pois essa transformação depende dos mesmos vereadores, deputados e senadores que transformaram nossas casas congressuais em quase casas de tavolagem. Há que montarmos uma estratégia. Primeiro não reeleger os fichas-sujas, os meio-sujos e até os quase-sujos. Segundo, para receber o nosso voto, não basta que o candidato tenha o viés ideológico igual ao nosso; ele tem que ser explicitamente honesto (não devemos ter bandidos de estimação). Terceiro, e o mais difícil, devemos também ser honestos e não vendermos nossos votos por quaisquer duas colheres de mel coado ou dez mil reais autênticos.
Alguém há de dizer que sou apenas mais um sonhador, um pobre inocente. A minha avó, lá na quentura de nossa terra natal, já dizia: o idealista é uma besta quadrada, o pessimista um chato de galocha e o realista é aquele que luta pelo que quer, embora o que queira seja uma miragem refletida lá longe, no horizonte.

Tribuna do Norte. Natal, 19 dez. 2019   


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