O MUDO E ALIANÇA – Berilo de Castro
O MUDO E ALIANÇA –
Nesse pedaço de Nordeste com tantas manobras esquisitas e cheio de maracutaias na política, um causo a mais me é lembrado.
Em uma cidade do interior do Estado,
época festiva de campanha eleitoral, momento do tudo ou nada para galgar
uma cadeira na Câmara Municipal, tempo caracterizado pelas tentativas
mais circenses na busca de votos, os candidatos se debatem, correm de um
lado para o outro, na caça incessante de eleitores. Nessa caçada
humana, promessas e mais promessas são feitas; algumas inusitadas.
São ofertas de tudo que não se imaginam,
em troca por votos: milheiros de telhas cerâmica, telhas de brasilit,
de tijolos de oito furos, pagamento de contas de luz em atraso,
pagamento de taxas de água e esgoto, IPTU, dentaduras, sacos de cimento,
cadeiras de rodas, vestidos de noiva, exames de sangue, RXs,
internamentos em hospital na
Capital, óculos de grau e, por aí segue a infindável lista.
Diante de tudo isso, surge um pedido
inusitado. Um bom eleitor, bem conhecido na cidade, o único cidadão mudo
na região, prestes a se casar, fez o seguinte pedido ao candidato: uma
aliança. Joia, que seria usada tão logo o vereador fosse eleito.
O candidato acatou o pedido e seguiu caminho na sua vitoriosa empreitada.
Terminado o pleito, o vereador foi
eleito. Cumpriu os seus compromissos de campanha, que foram muitos, com
um detalhe todo especial: esqueceu completamente do clamor do eleitor
mudo (prática corriqueira no meio).
O votante, se sentindo desprezado no seu
justo e sonhado pedido, foi até o vitorioso edil e pediu explicações
pelo não cumprimento da entrega da sua aliança. Com a sua linguagem
gesticular, lembrou a promessa, fazendo uma imagem circular com o dedo
polegar e o indicador da mão esquerda, e, com o dedo indicador da mão
direita, apontou e penetrou no orifício com o movimento de entra e sai:
an? an? an?. O vereador no seu esquecimento soberbo, vendo aquela cena
gesticulada, com certo espanto e bastante curioso, nada entendeu e se
questionou: eu já prometi e já fiz doações e mais doações, as mais
diferentes e inimagináveis, só não me recordo em momento algum ter
prometido dar o c. caso ganhasse a eleição. Será?!
Berilo de Castro – Médico e Escritor – berilodecastro@hotmail.com.br
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