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31/05/2018

CORPUS CHRISTI


Celebrar “Corpus Christi” é “cristificar” nossos corpos.
É esse o sentido que a festa de “Corpus Christi” nos revela, festa do Corpo histórico e humano de Jesus, amado, rejeitado, crucificado, morto e ressuscitado.  


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O corpo de Cristo
Há algo a ser dito por consistência, mas também há algo a ser dito por variedade. Insistir exclusivamente em qualquer delas, em nosso estudo bíblico, levará a resultados desastrosos. Precisamos julgar pelo contexto, se o autor pretendia usar sua linguagem consistentemente ou criativamente.


Assim é com a figura do "corpo", que o Novo Testamento emprega como uma descrição da igreja. Enquanto muitos têm aceito que a figura sempre significa a mesma coisa, sejamos cuidadosos para observar as diferenças em seu uso e aplicação.

Uma relação entre cristãos
Por um lado, parece haver de fato uma consistência em como a imagem da igreja como "corpo" é usada para ilustrar e ressaltar certas características da relação que existe entre o povo de Deus:

Unidade. A figura do corpo é muito útil para descrever a "unidade na diversidade" que existe entre cristãos (Romanos 12:4-8; 1 Coríntios 10:17; 12:12-31; Efésios 2:16; 4:4; Colossenses 3:15). Assim como o corpo tem diferentes partes, assim também o grupo que pertence a Deus é composto de muitos tipos diferentes de pessoas: diferentes personalidades, capacidades, níveis de maturidade espiritual, formações. Entretanto, estas diferenças são insignificantes à luz da fé comum que partilhamos em Cristo. Nossa diversidade não força esta unidade espiritual nem um pouco, mas é realmente uma bênção, no que os cristãos são capazes de ajudar um ao outro de um modo complementar, em vez de todos serem exatamente idênticos.

Interdependência. A diversidade entre o povo de Deus ajuda a fortalecer o corpo através de seu trabalho complementar, porque todos do povo de Deus estão ligados um ao outro e são dependentes uns dos outros (Romanos 12:4-8; 1 Coríntios 12:12-31; Efésios 4:11-16; Colossenses 2:19). Como membros de um corpo estão entrelaçados entre si, entretecidos, e juntos em um todo unificado, assim também o povo de Deus é interligado. O funcionamento adequado, saudável, de cada parte é essencial à saúde geral do corpo. Nenhuma parte é insignificante, irrelevante ou dispensável. Os cristãos devem possuir uma consciência de tal dependência e necessidade uns dos outros. Na verdade, devemos ser tão interligados que os cuidados com outras pessoas são os nossos mesmos; choramos com os que choram e nos regozijamos com os que se regozijam.

Crescimento. Toda a unidade e interdependência do povo de Deus é destinada a levar a uma única meta: o crescimento espiritual (Efésios 2:21; 4:11-16; Colossenses 2:19). A figura de um corpo é perfeitamente adequada para salientar que o povo de Deus é um organismo que cresce, e não um objeto sem vida, estático, adormecido. O corpo é para sobreviver e ser saudável pelo labor adequado de cada parte individual, como cada parte faz a sua tarefa. Sendo equipados através do ensino, os santos têm que servir, e assim fazendo o corpo de Cristo é edificado.

Uma relação com Cristo
Por outro lado, há uma variedade na qual a figura do "corpo" é usada para descrever a relação que existe entre o povo de Deus e Cristo:

Cabeça. Há, naturalmente, as passagens familiares nas quais Cristo é chamado a cabeça do corpo, a igreja (Efésios 1:23; 4:16; 5:23; Colossenses 1:18; 2:19). Aqui, o corpo é claramente a parte inferior do todo, composto de tronco e membros, enquanto Cristo é a cabeça. Obviamente, isto significa o papel de Cristo como de autoridade. Ele é aquele que toma as decisões, cuja vontade tem que ser seguida. Mas observe como a imagem do corpo sugere que esta não deve ser uma atividade antagônica. Além do mais, nossos corpos físicos não lutam com a cabeça, não se opõem a sua vontade, nem contradizem suas ordens. As partes do corpo naturalmente agem de acordo com as determinações da cabeça para o bem estar do corpo inteiro. A cabeça é também o que confere uma certa unidade de propósito e direção, de modo que as partes estejam trabalhando em direção à mesma meta, em vez de se esquartejando e indo em direções diferentes.


Espírito. Há passagens, contudo, que usam a figura do corpo, mas que não retratam Cristo como a cabeça do corpo. Observe, por exemplo, que em 1 Coríntios 12, a cabeça é claramente uma das partes do corpo que representa o cristão comum (12:21), como também o são várias partes especificadas da cabeça, tais como o olho e o ouvido (12:16-17). Neste caso, que relação Cristo tem com o corpo, se não é sua cabeça? Bem, assim como um corpo físico, se está vivo, tem um espírito que habita esse corpo, dando-lhe vida e personalidade, assim também Jesus é o Espírito vivo que mora dentro do corpo de seu povo. Este mesmo ponto está implícito em Efésios 2:21, onde as figuras de corpo e edificação estão misturadas, falando de um templo crescente no qual Deus mora. Do mesmo modo, Efésios 4:4 emparelha um corpo e um Espírito, como se indicasse uma ligação particular. Finalmente, a afirmação de Paulo de que somos "um corpo em Cristo" (Romanos 12:5) pode se apoiar sobre esta mesma figura. Como tal, a figura do corpo indica ainda mais intimamente o grau em que devemos ser possuídos por Deus, participantes de sua divina natureza, quando ele mora e vive dentro de nós.

Que coisa maravilhosa é, na verdade, fazer parte do corpo de Cristo!

­por Tom Hamilton

30/05/2018

   
Marcelo Alves

 
Crimes econômicos (III)

Como adiantado no artigo da semana passada, hoje vamos conversar um pouco sobre os órgãos/agências/agentes envolvidos na prevenção e na repressão aos crimes econômicos e à corrupção. 

Antes de mais nada, é possível afirmar (e, aqui, por razões metodológicas, restrinjo-me ao ambiente dos delitos praticados contra a União, suas autarquias e suas empresas públicas) que a Polícia Federal, o Ministério Público Federal e a Justiça Federal formam a linha de frente desse combate aos crimes econômicos e à corrupção. Ao cabo de tudo, especialmente se as medidas preventivas não derem certo e for necessário partir para a repressão, as coisas deságuam nesse tripé de instituições. Os procedimentos criminais de que dispomos para esse combate – o inquérito policial e a ação penal, sobretudo –, alimentados pela Polícia Federal e manejados pelo Ministério Público Federal, têm, em última ratio, como destinatário, o Poder Judiciário Federal. 

Quase intuitivamente, já que mais do que nunca presente na mídia nacional, todos nós conhecemos a Polícia Federal. Organizada nacionalmente a partir de diretorias, a PF está descentralizada nos estados federados, a exemplo do nosso Rio Grande Norte, em Superintendências e, estas, em delegacias (regionais e especializadas). A PF trabalha bem (sobretudo se levarmos em conta a situação nas polícias civis dos estados). E para o combate à criminalidade econômica e à corrupção, a PF, nas últimas décadas, se especializou. Para tanto, como registra o excelente livro/guia “A investigação e persecução penal da corrupção e dos delitos econômicos: uma pesquisa empírica no sistema judicial federal” (publicado pela Escola Superior do Ministério Público da União em 2016), no que se refere à sua estrutura organizacional, a Polícia Federal conta com uma Diretoria de Investigação e Combate ao Crime Organizado (Dicor), responsável pelo estabelecimento das prioridades de atuação na investigação do crime organizado. A tal Dicor “engloba, entre outras, a Divisão de Repressão de Crimes Financeiros (Dfin) e a Coordenação-Geral de Polícia Fazendária (CGPFAZ). Da CGPFAZ, por sua vez, fazem parte a Divisão de Repressão a Crimes Fazendários (Dfaz) e a Divisão de Repressão a Crimes Previdenciários (Dprev). Nos estados, as Superintendências também possuem delegacias especializadas na investigação desses crimes e que estão vinculadas à orientação das divisões mencionadas, conforme relacionamos, respectivamente: Delegacia de Repressão a Crimes Financeiros (Delefin), Delegacia de Repressão a Crimes Previdenciários (Deleprev) e Delegacia de Repressão a Crimes Fazendários (Delefaz)”. Para uma criminalidade cada vez mais complexa, a palavra na PF parece ser essa: especialização. 

Acredito que esse deve ser também o mote do Ministério Público Federal, que, constitucionalmente, é o titular da ação penal pública para o tipo de criminalidade de que tratamos, além ser de o responsável pelo controle externo da atividade policial, entre inúmeras outras responsabilidades. Para o cumprimento de suas atribuições, o Ministério Público Federal estrutura-se em três níveis diferentes: a Procuradoria-Geral da República, as Procuradorias Regionais da República para cada um dos cinco Tribunais Regionais Federais e, como pontas de lança do combate à criminalidade, as Procuradorias da República nos estados federados, com sede nas capitais e em alguns municípios importantes. Espalhados nesses três níveis estão os agentes desse combate. Busca-se, sempre que possível, a especialização na atuação. A especialização entre as áreas cível e criminal é uma tendência consolidada. E, nos últimos anos, assistimos a criação dos diversos Núcleos de Combate à Corrupção em quase todas as Procuradorias da República do país. Esse NCCs têm sido um sucesso. Outro tido de especialização, para fins de coordenação e revisão das atividades exercidas pelos membros, se dá por intermédio das Câmaras nacionais (estas, por sua vez, podem ainda criar Grupos de Trabalho temáticos, que estudam e elaboram as diretrizes de atuação nos mais diversos assuntos). Três dessas Câmaras têm relação com a criminalidade econômica: 2ª Câmara (matéria criminal em geral), a 5ª Câmara (combate à corrupção) e a 7ª Câmara (controle externo da atividade policial e do sistema prisional). Ainda para fins de combate à criminalidade organizada, deve ser destacado o papel da Secretaria de Pesquisa e Análise da Procuradoria-Geral da República e das Assessorias de Pesquisa e Análise Descentralizadas, que realizam um papel importantíssimo de assessoramento técnico aos membros do MPF (que, via de regra, não têm formação em contabilidade, economia etc.). 

Por fim, a própria Justiça Federal, no âmbito criminal, vem dando seus passos em direção ao futuro. Em busca da eficiência, nas últimas décadas, chegou-se à interiorização das varas federais e, mais importante no nosso caso, à especialização criminal de varas nas capitais dos estados federados. E, para além desse primeiro movimento de especialização (criação de varas criminais), estamos agora assistindo a um segundo passo, ainda mais relacionado ao nosso tema: “a especialização no processamento e julgamento de crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e nos crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores e, em alguns casos, também nos crimes que envolvessem organizações criminosas”. Para se ter uma ideia, quando de sua publicação, em 2016, o livro/guia “A investigação e persecução penal da corrupção e dos delitos econômicos: uma pesquisa empírica no sistema judicial federal” já apontava: “Na Seção Judiciária do Paraná, mais especificamente na Subseção Judiciária de Curitiba, existem duas Varas Criminais (a 2ª e a 3ª Varas Federais) especializadas nos crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e de lavagem de dinheiro e nos crimes praticados por organizações criminosas, independentemente do caráter transnacional ou não das infrações”. Hoje, quem não ouviu falar na Justiça Federal de Curitiba? 

Entretanto, mesmo com toda essa especialização na Polícia Federal, no Ministério Público Federal e na Justiça Federal, a coisa não é tão simples assim. A expansão legislativa relativa aos crimes econômicos e à corrupção (especialmente a partir da década de 1990) e a sofisticação cada vez maior na prática desses delitos desafiam crescentemente o papel desempenhado pelas três instituições que tradicionalmente dividem o trabalho jurídico-penal nesta seara. E hoje há, de fato, com papéis relevantíssimos, outras agências também engajadas na missão de viabilizar e otimizar a prevenção e a repressão a esse tipo de criminalidade. A Receita Federal, o COAF, o Tribunal de Contas da União, a Controladoria-Geral da União e por aí vai. Mas sobre elas, por falta de espaço hoje, só falaremos na semana que vem. 

Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP

29/05/2018

GS

Para retratos, porta retratos




Texto Gustavo Sobral e ilustração de Arthur Seabra


São antiquíssimos e dizem que só no último milênio vem perdendo o prestígio com a tecnologia digital para captura de imagens fotográficas. Mais antigos que ele, só os retratos a óleo na tela devidamente emoldurados de reis, rainhas, nobres e papas que hoje preenchem os museus do velho mundo. Foi a moldura, o primeiro porta retrato, e os primeiros retratos, pintura para parede.

Sua popularidade advém do uso corriqueiro da fotografia pessoal impressa. Levava-se o filme para revelar e os retratos corriam as pencas para preencher os álbuns de retratos. Eram eles lembranças de momentos da vida, viagens, aniversários, casamentos, nascimentos, celebrações, tudo que representasse o instante presente da vida.

As bodas de prata dos avôs, a foto da formatura, aquele final de semana na praia, o natal em família são algumas das fotografias eleitas para exposição pela casa em porta retratos que se distribuem pelos cômodos nos aparadores, mesa de cabeceira, prateleiras, estantes, na parede.


Nos mais diversos materiais, madeira, plástico, vidro, acrílico, couro, aço, tamanhos e formatos, o porta retrato é uma moldura para a fotografia da vida.

27/05/2018

A MEMÓRIA RESGATADA



A MEMÓRIA RESGATADA – Berilo de Castro


       Acompanho na mídia esportiva, ano a ano, as justas e merecidas festividades dos finais de campeonatos promovidas pela Federação Norte-Rio-Grandense de Futebol. A escolha e a premiação da seleção do ano; o melhor jogador; o artilheiro do certame e, como não podia faltar, a escolha da musa do campeonato. Tudo bem. Faz parte do bom jogo.
          Não querendo ser, e sendo, saudosista, me vem a pergunta: Que tal promover e organizar em época oportuna uma grande e bela festa para homenagear o centenário Estádio Juvenal Lamartine e os seus parceiros jogadores? —uma digna e reconhecida homenagem ao palco maior do nosso futebol e aos seus protagonistas.
          Reuniria representantes dos três maiores clubes, ainda  em atividade: ABC, América e Alecrim e, mais aqueles que não mais existem, como: Santa Cruz ( de Euclides Lira e Evaldo Maia), Riachuelo,( do Almirante Silveira Lobo e Tenente   Castro), Atlético ( de João Machado e Brígido Ferreira), Ferroviário ( de João Batista Paiva — Joãozinho ), Aluízio Menezes e José Pereira), do Força e Luz ( de Vital e Pierre ) e o  Globo FC ( do gringo Imere Frede, fabricante e comerciante de móveis residenciais), que tanto abrilhantavam as alegres e ricas tardes de domingo e das quartas-feiras à noite no JL.
         Chamaria a veterana imprensa esportiva; iríamos rever com emoção os nossos decanos: Everaldo Lopes, os irmãos Roberto e Franklin Machado, Hélio Câmara, José Jorge, Albimar Furtado,  Almeida Filho, José Ari, Zé Lira — o plantão esportivo Bola de Ouro, — e outros viventes da nossa memorável radiofonia esportiva.
         Seriam convidados os nossos heróis e sofridos árbitros: Nelson Luzia, Guaraci Picado, César Virgílio, Ailton Messias, que atuavam sem cartões disciplinares, sem árbitros vigias, sem os recursos de áudio e da televisão; assim como, os protagonistas maiores: os jogadores, ídolos incontestáveis, que praticavam um belo e bom futebol, em gramado inadequado, usando material de péssima qualidade e ganhando miçanga.
         Não esqueceria, por justiça, o funcionário Manoel, menino criado no JL e que se tornou o seu mais fiel e dedicado colaborador/funcionário, que dedicou grande parte da sua vida, prestando inestimáveis serviços:  zelador, cuidador do campo e responsável direto por toda burocracia da Federação, —conhecia e sabia de tudo — “braço direito” de todos os seus Presidentes.
         Todos seriam agraciados com uma comenda, que receberia o nome de Jorge Tavares de Morais — Jorginho, uma justíssima  homenagem ao maior ídolo da história do futebol do Ro Grande do Norte, no JL.
          Seria um grande e inesquecível encontro, que teria como palco, o próprio Estádio, higienizado, pintado e bem iluminado. Não tenho dúvida, o evento teria uma grande receptividade de toda a cidade, em especial daqueles que admiram e ainda vivem com a memória aguçada do futebol praticado no passado — merecedor da bela e histórica confraternização.
Berilo de Castro – Escritor
As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores


Casa de Vidro de Lina e Pietro Maria Bardi



texto Gustavo Sobral e ilustração Arthur Seabra

O que está fora pode estar dentro e o que está dentro pode muito bem estar lá fora. Uma casa de vidro é uma casa que habita o seu entorno e se abre para o tempo. Tudo é fora, como tudo é dentro. A ideia da casa é de uma arquiteta que sonhou fazer da sua casa um jardim cujas paredes fossem o cenário de fora, por isso totalmente de vidro.

Incrustrada no Morumbi, cidade de São Paulo/SP, se esbalda por todo um terreno de sete mil metros quadrados de pura Mata Atlântica, e que virou instituto que leva o nome do casal. Foi feita e pensada para casa de dona Lina e de seu marido Pietro, ambos italianos de nascimento e brasileiros por adoção, quando do navio aportaram na Baía da Guanabara e foram a São Paulo fazer arquitetura e arte e, assim, a obra-prima do Masp.

Pronta em 1951, para a casa de vidro, Lina fez de tudo, da planta aos móveis. Encontra-se totalmente suspensa, flutuando na paisagem, que começa pela escadaria, um mirante para a contemplação de tudo. A casa abraça uma árvore a que contorna e envolve e assim, mesmo suspensa, conserva uma raiz na terra. A sala é desenhada como espaço onde a vida se descortina; ali a arquiteta e o marchand recebiam amigos, conversavam.


É uma casa para se viver, com cadeiras, poltronas, mesinhas, objetos, até quadros nas paredes de vidro; tem de tudo que há em uma casa, o desenho é da arquiteta, que acreditava no espaço da casa como vida de quem nela mora, e não na casa como arrumação para composição de vitrine. A casa de Lina é uma casa viva; uma casa de tudo, de uma arquiteta curiosa do morar do brasileiro e do seu artesanato, de alguém que, quando viu a rede, se impressionou, porque um único objeto de design era capaz de ser cama e de ser cadeira.

 
 
   
Marcelo Alves

 


Crimes econômicos (II)

Na semana passada, defendi aqui, para delimitação do que seriam “crimes econômicos”, um conceito material destes, tendo por referência o bem jurídico tutelado pelo direito penal econômico. Os tais crimes econômicos seriam aqueles que visam proteger (com a sanção prevista para a prática da conduta), supra-individualmente, a ordem/política econômica planejada, regulada e controlada pelo Estado soberano. Leia-se, aqui, a política econômica “stricto sensu” e as políticas de rendas, monetária, fiscal e cambial, que o Estado resolveu, especial e penalmente, também proteger. E prometi, para hoje, com base nesse conceito, especificar os crimes econômicos previstos em nossa legislação. 

Evidentemente, não farei isso especificando tipo a tipo, crime a crime. Nem muito menos tenho como comentar cada um deles. Seria tarefa impossível neste nosso espaço, além de inútil para os fins de uma visão panorâmica sobre os crimes econômicos. Mas é possível elaborar, embora não exaustiva, uma lista destes. E essa lista eu faço aqui com base, entre outras coisas, no livro “A investigação e persecução penal da corrupção e dos delitos econômicos: uma pesquisa empírica no sistema judicial federal”, que, publicado pela Escola Superior do Ministério Público da União em 2016, sob a coordenação de Arthur Trindade Maranhão Costa, Bruno Amaral Machado e Cristina Zackseski, é um excelente material de referência para nós do Ministério Público Federal. 

A meu ver, considerando que lesionam (ou pelo menos põem em risco) a ordem econômica, podem ser considerados crimes econômicos em seu sentido estrito: (i) a plêiade de delitos previstos na Lei nº 7.492/86 (que cuida dos crimes contra o sistema financeiro nacional e já referida no artigo anterior), que visam proteger o regular funcionamento do sistema financeiro, os valores mobiliários e a higidez da gestão das instituições financeiras, a veracidade dos demonstrativos contábeis dessas instituições, a fé pública e as reservas cambiais, entre outras coisas; (ii) crimes contra as relações de consumo, previstos na Lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor); (iii) os delitos contra a ordem tributária, previstos na Lei nº 8.137/90, a exemplo dos tipos dos artigos 1º a 3º, que visam proteger o erário e a política socioeconômica do Estado, como bens jurídicos supra-individuais; (iv) delitos contra a ordem econômica, previstos na mesma Lei nº 8.137/90, artigo 4º, incisos I e II, que visam proteger a livre concorrência e a livre iniciativa, fundamentos da ordem econômica pátria; (v) ainda na Lei nº 8.137/90, os delitos contra as relações de consumo previstos no artigo 7º, nos incisos I a IX, que visam não só proteger os interesses econômicos, a vida e a saúde do consumidor, mas, também, o próprio mercado e a economia popular; (vi) aqueles delitos contra a ordem econômica previstos na Lei nº 8.176/91; (vii) os tipos previstos na Lei nº 9.613/98 (com a redação dada pela Lei nº 12.683/2012), que dispõe sobre os crimes de “lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores; (viii) os tipos previstos na Lei nº 10.303/2001, artigo 27, que consubstanciam crimes contra o mercado de capitais; (ix) e, por fim, vários tipos previstos no próprio Código Penal Brasileiro, como, por exemplo, aqueles dos artigos 359-A a 359-H (crimes contra as finanças públicas), dos artigos 168-A e 337-A (crimes contra o sistema previdenciário) e o do artigo 334 (que visa proteger o prestígio da administração pública e interesses econômicos do Estado). E essa lista, reitero, é apenas exemplificativa. 

É importante observar que, com uma ou outra exceção, os tipos penais aqui apontados como crimes econômicos são frutos da década de 1990 – período de intensa atividade legislativa penal, especialmente penal econômica, em nosso país – ou mesmo de anos mais recentes. Isso mostra que o Brasil, se comparado com outros países (os “mais desenvolvidos”, sobretudo), demorou um bocado para tipificar a criminalidade chamada econômica ou de “colarinho branco”. 

Ademais, intimamente relacionados aos crimes econômicos em sentido estrito – e talvez eles sejam também crimes econômicos “stricto sensu” – estão o que eu posso chamar de “delitos de corrupção”. Até porque estes (os tais “delitos de corrupção”) são crimes que também atingem supra-individualmente a ordem econômica, mais especificamente, a política fiscal do Estado e o seu desenvolvimento econômico como um todo. E não resta dúvida de que, internacional e nacionalmente, somos cada vez mais equipados de mecanismos de combate à corrupção (se eles estão se mostrando eficazes no Brasil, isso é assunto para uma discussão mais à frente). Quanto a esses chamados crimes de corrupção, para nos poupar trabalho, vou apenas citar alguns tipos pesquisados no livro “A investigação e persecução penal da corrupção e dos delitos econômicos: uma pesquisa empírica no sistema judicial federal”, referido mais acima: (i) os muito conhecidos e comuns (infelizmente) peculato, inserção de dados falsos para obter vantagem indevida, extravio de livro oficial ou de documento de que possua a guarda em razão do cargo, concussão, corrupção passiva e corrupção ativa, respectivamente descritos nos artigos 312, 313, 314, 316, 317 e 333 do Código Penal brasileiro; (ii) e os importantíssimos crimes licitatórios, tipificados nos artigos 89 a 98 da Lei nº 8.666/1993. Alguns desses tipos, registre-se, já constavam da redação original do nosso Código Penal, que é de 1941; outros, como sabemos, são mais recentes. 

Por fim, não resta dúvida de que a prevenção do cometimento e a repressão aos crimes econômicos e à corrupção deve ser uma prioridade do Estado brasileiro. Ela se dá por intermédio de uma legislação abundante, a exemplo dos tipos penais acima referidos. Mas não para por aí. Há inúmeros outros instrumentos voltados a esse “combate”, alguns com assento constitucional. Instrumentos processuais, por exemplo, como a ação penal, inquérito policial, ação civil pública, ação de improbidade, inquérito civil público, ação popular etc. E há, especialmente, os órgãos/agências/agentes encarregados desse combate aos crimes econômicos e à corrupção: o Poder Judiciário, o Ministério Público, a Polícia Judiciária, os Tribunais de Contas, as Controladorias, a Receita Federal e os fiscos estaduais e municipais, o COAF e por aí vai. 

E será sobre tais órgãos/agências/agentes que conversaremos na semana que vem. Rogo apenas um pouquinho de paciência. Mais uma vez. 

Marcelo Alves Dias de Souza 
Procurador Regional da República 
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL 
Mestre em Direito pela PUC/SP
 

20/05/2018

O RIO GRANDE DO NORTE PERDE O SEU MAIOR XERIFE

Por: Carlos Roberto de Miranda Gomes





MAURÍLIO PINTO DE MEDEIROS foi um homem de coragem. Trocou a comodidade de uma vida familiar feliz para arriscar diariamente sua vida no combate ao crime e aos criminosos.
Suas ações e sua coragem geraram
 incontável número de pessoas gratas, mas não deixou de ter eventuais inimigos, que não compreenderam a sua missão.
Sempre tive por Maurílio o maior respeito. Compreendi toda a sua carreira perigosa e sob sua autoridade a cidade viveu dias de segurança e paz.
Neste momento de dor para a sua família e perda para o Estado, só nos resta rogar a Deus que o receba em sua mansão e faça o exame justo de sua vida.

Reproduzimos homenagem que lhe foi prestada pelo escritor Berilo de Castro, em data de 03 de abril do ano em curso, no site Ponto de Vista:


MAURÍLIO PINTO, A NOSSA GRATIDÃO –
Maurílio Pinto de Medeiros nasceu em Pau dos Ferros/RN, no dia 24 de agosto do ano de 1941, filho do coronel PM Bento Manoel de Medeiros (1910-1961) e de Julieta Pinto Nascimento (1919-2014).
Iniciou sua carreira de policial civil ainda menor de idade, aos 16 anos, como motorista, nas mais variadas e perigosas incursões policiais na região de Patu/RN, acompanhando o seu pai, o disciplinado e eficiente delegado Bento.
Após prestar serviço militar obrigatório por 2 anos na Força Aérea Brasileira ( FAB ), volta à Polícia Civil e é contratado como motorista da Secretaria do Interior e Justiça, no dia 1 de julho do ano de 1964, quando passa a ocupar oficialmente a função de motorista do delegado geral da Polícia Civil, o coronel Bento de Medeiros.
A princípio a ocupação na função policial seria de curta duração, pelo que afirmara o sei pai, o coronel Bento: “ Maurílio, meu filho, olhe, só quero que você fique na Polícia até o momento que eu estiver trabalhando.
Quando me aposentar não quero mais você aqui”. O pai temia pela vida do filho. Sabia da difícil e perigosa missão que o filho teria, caso continuasse.
Maurílio formou-se em Jornalismo, profissão na qual nunca atuou. Diplomou-se em Direito ( Bacharel ) no ano de 1975, quando prestou concurso para delegado da Polícia Civil, sendo aprovado.
Conheci Maurílio no ano de 1972, quando fui contratado no Governo de Cortez Pereira, para prestar serviço médico na Secretaria de Interior e Justiça, na função de clínico geral no Complexo Penitenciário João Chaves.
Homem simples, alheio a vaidades, corajoso, estrategista e de uma dedicação e um empenho em suas missões sem precedentes: sempre executadas com muito zelo e determinação, merecedoras dos mais altos reconhecimentos e aplausos, a ponto de merecidamente receber da Câmara Municipal de Natal o título de “Xerife” e da Assembleia Legislativa do Rio
Grande do Norte a Medalha do Mérito Legislativo, sua maior honraria. Tinha e sentia literalmente em suas investidas o verdadeiro “faro”, o “cheiro” e a percepção para a elucidação de crimes de difíceis soluções.
Nunca saia para uma missão sem antes estudá-la minuciosamente; sabia muito bem os riscos que correria. Não se atirava às “cegas”.
Sua brilhante trajetória profissional conta com 47 anos de efetivos e dedicados serviços prestados à Segurança Publica do nosso Estado, onde galgou merecidamente todos os degraus da sua carreira policial: de motorista à Secretario Adjunto da Secretaria de Segurança e Defesa Social, deixando um legado imensurável e inquestionável de ações exemplares, que ficarão registradas e inapagáveis nos anais da história da briosa Polícia Civil do Estado do Rio Grande do Norte.
Quem não lhe conhece, não perdeu o direito de conhecer.
Maurílio, a nossa gratidão.
Berilo de Castro – Escritor

18/05/2018

UMA SEMANA MUITO PROVEITOSA



O INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DO RIO GRANDE DO NORTE viveu nos últimos 10 dias, um período de grande movimentação e atividades, aqui contados através de fotografias:


ORMUZ e a Diretoria recepciona o escritor Manoel de Oliveira Cavalcanti Neto, autor da obra 1500 - DE PORTUGAL AO SALIENTE POTIGUAR, que veio se filiar ao IHGRN


Comissão de historiadores designada pelo IHGRN para estudar e emitir parecer sobre o assunto pertinente ao local correto do descobrimento do Brasil. Nas fotos Levy Pareira, João Felipe da Trindade, Ormuz, Cláudio Galvão, Rostand Medeiros e André Furtado.





Folder sobre exposição de fotografias sobre a 2ª Guerra Mundial


 
O Membro da Diretoria do IHGRN faz visita oficial ao Vice-Reitor da UFRN, Professor JOSÉ DANIEL DINIZ e a Professora MAGNÓLIA ANDRADE, Diretora da Biblioteca "Zila Mamede".

INSTITUTO É HOMENAGEADO PELA CÂMARA MUNICIPAL DE NATAL e o Presidente ORMUZ BARBALHO SIMONETTI recebe o título de "Cidadão Natalense"

A solenidade ocorreu neste dia 17 próximo passado, conforme registros em fotografias:





 
Momento do discurso oficial, registrando-se a presença do escritor Iaperi Araújo, 
Presidente do Conselho de Cultura e Acadêmico da ANRL
 Vereadores Nina Souza, Joanilson de Paula Rego e Julia Arruda, 
com o agraciado Ormuz Simonetti
 Betânia Ramalho, Joventina Simões, Ormuz, Nina Souza e Júlia Arruda
 Nina, Joanilson, Ormuz e Júlia Arruda
 Ormuz, Adilson Gurgel, Nina Souza e Betânia Ramalho
 Geiza, Ormuz e Adilson Gurgel
 Certificado de cidadania natalense
Presenças ilustres: Comandante Woodson, Betânia, Ormuz, Júlia, Simoni,
Geiza, Lívio Oliveira, Nina, Conceição Maciel e Joventina
Comandante Woodson, Betânia, Nina, Ormuz, Júlia, Simoni e Geiza

 Vista dos amigos no momento da recepção


Vista dos amigos no momento da recepção, em maior evidência, 
Pedro Simões Neto Segundo







              Marcelo Alves



Crimes econômicos (I) 

Atualmente, uma das grandes preocupações do direito e das autoridades brasileiras, sobretudo daquelas verdadeiramente preocupadas com o futuro do nosso país, é a investigação e a persecução penal da nossa velha conhecida “corrupção” e dos denominados “crimes econômicos”. Aceitando “impositivo” convite do meu amigo Ivan Lira, fui escalado para falar sobre essa temática no seminário “Inserções do direito penal econômico no quadro jurídico atual” do Programa de Pós-Graduação em Direito da UFRN (dia 25 de maio próximo, às 9 da matina, se querem saber data e hora). O título dado à minha palestra é até pomposo: “Modernas técnicas de investigação dos crimes econômicos e as garantias constitucionais dos cidadãos e das empresas”. Meu amigo Ivan, mesmo contra minha vontade, sempre me arruma umas dessas. 

Para preparar a minha fala, a primeira questão com que me deparei foi: que danado são crimes econômicos? Em outras palavras, quais crimes podem ser qualificados de “econômicos”? 

Antes de mais nada, temos uma primeira conceituação de crimes econômicos que tem por referência o sujeito ativo do crime: os crimes econômicos, com base nessa referência, seriam os denominados “crimes de colarinho branco”. Para quem não sabe, devemos a origem dessa conceituação ao sociólogo e criminologista americano Edwin Hardin Sutherland (1883-1950) e, especialmente, à sua obra “White Collar Crime”, publicada em 1949. Segundo Sutherland, o delito de colarinho branco pode ser definido, basicamente, como um delito cometido por uma pessoa de respeitabilidade e alto status social no exercício de sua ocupação habitual. E daí decorreria, a contrário senso, que o crime de colarinho branco não poderia ter como sujeito ativo um integrante das classes ditas populares. Sem dúvida, Sutherland teve um grande mérito: o de chamar a atenção para um outro tipo de criminalidade – os tais “crimes de colarinho branco” – que não eram pensados, muito menos estudados, como crimes, àquela época. Ademais, ele rompeu com uma tradição que defendia estar a criminalidade associada à pobreza ou a patologias sociais ou pessoais. Pessoas de padrão socioeconômico elevado também praticavam crimes, deixou-se claro; crimes não são “privilégios” só dos pobres. Entretanto, embora os estudos de Sutherland tenham sido importantes para o estudo do tipo de criminalidade de que ora tratamos, é evidente que esse tipo de conceituação esbarra em dois problemas claros: (i) nem todos os crimes econômicos são praticados por pessoas social e economicamente favorecidas, sendo perfeitamente factível que um sujeito ativo desse tipo de crime não possua tal condição; (ii) pessoas social e economicamente privilegiadas podem cometer qualquer tipo de crime, inclusive os considerados “não econômicos”. 

Doutra banda, a delimitação do que são crimes econômicos pode também ser realizada a partir de um ponto de vista estritamente formal, com base na simples definição legal de um crime como tal. Já que o princípio da legalidade (ou da reserva legal, como querem alguns) – disposto no artigo 5º, inciso XXXIX, da Constituição Federal e no artigo 1º do Código Penal – afirma que “nullum crimen, nulla poena sine lege”, essa lei necessária, em algum momento, deve afirmar (ou mesmo sugerir) o pertencimento da conduta/crime ao ramo direito penal econômico. Seria certamente o caso, por exemplo, de uma penca de crimes que temos contra o sistema financeiro nacional (Lei nº 7.492/86). Mas aqui também não se está imune a críticas. É evidente que uma definição por intermédio da legislação é de grande valia para uma melhor sistematização e uma maior precisão do que sejam os crimes econômicos. Todavia, mesmo pressupondo uma boa técnica legislativa (que frequentemente não é o caso do Brasil), a conceituação baseada nesse critério legal padece de um simples mas sério problema: alguns delitos, essencialmente econômicos, por opção ou esquecimento legislativo, podem ficar fora do alcance dessa conceituação estritamente legal. Basta que a lei, formalmente, os classifique diferentemente. 

Ao que tudo indica, trabalhar com um conceito material de crimes econômicos, partindo da ideia do bem jurídico tutelado pelo direito penal econômico, é a melhor opção. Partindo deste novo referencial, os crimes econômicos seriam aqueles que visam proteger (com a sanção prevista para a prática da conduta, evidentemente) a ordem econômica planejada, regulada e controlada pelo Estado soberano. Em outras palavras, (visam proteger) as estratégias e opções adotadas pelo Estado para conduzir a economia. Essa ordem econômica, registre-se, deve ser enxergada tanto sob o ponto de vista jurídico como pelo prisma econômico. Numa interdisciplinariedade com o direito, é a macroeconomia, planejada e conduzida pelo Estado, que aponta as atividades que necessitam de uma tutela especial, no caso penal. Assim, tecnicamente (ou restritivamente), os tipos penais que visam proteger direitos individuais econômicos – como uma penca de crimes contra o patrimônio que temos em nosso Código Penal, a exemplo do furto (art. 155 do CP) e do roubo – não devem ser considerados como crimes econômicos, mesmo que, no caso concreto, tenham uma repercussão coletiva. Há de haver um plus que vá além do individual (ou mesmo “social”) econômico. Algo macroeconômico, relacionado à tal ordem econômica, aqui entendida como o planejamento e a organização econômica da vida em sociedade. Decorre daí um conceito material restritivo de crimes econômicos. Acuradamente proposto por Andrei Zenkner Schmidt (no texto “A delimitação do direito penal econômico a partir do objeto do ilícito”, que faz parte da coletânea “Direito Penal Econômico: Crimes Financeiros e Correlatos”, publicada pela Saraiva em 2011), os crimes econômicos seriam, assim, os ilícitos penais relacionados à proteção supra-individual dos valores dessa ordem econômica: leia-se aqui a política econômica “strictu sensu” e as políticas de rendas, monetária, fiscal e cambial, que o Estado resolveu, especial e penalmente, também proteger. 

Bom, e no direito brasileiro, tomando como base esse conceito material de crimes econômicos, quais seriam então os tipos penais, previstos expressamente em nossa legislação (lembremos: “nullum crimen, nulla poena sine lege”), que poderíamos classificar como econômicos? Aqui rogo um tiquinho de paciência. Por falta de espaço, a resposta a isso eu só darei na semana que vem. 

Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP

17/05/2018


Seu Joca



Por Gustavo Sobral

O vale dividia distâncias que só ali se mediam. O verde da cana imperava absoluto, confundia propriedades. Coisas de herança, inventários, posses, limites, registros, carimbos e até desavenças. Seu Joca, tinha por herança. Do partido popular do governador José Augusto, os jornais lia todos e preferia A República. Paletó sem gravata, relógio na algibeira e uma pistola de dois tiros, uma bengala e puxava uma perna. E montava. Barba branca e comprida, escovada todo santo dia. Feito o imperador Pedro II, nunca aparou. Olhos bem azuis e miúdos, passados para Manuel, Jacob e Adelaide.

Do tipo calado atravessava uma légua rumando do engenho a Ceará-Mirim. Não perdia missa de domingo, o cavalo alazão baixeiro todo não concedia atraso. Levantava quatro horas da madrugada para tratar do canavial e do gado. Viajou ao Norte para resgatar a irmã, de lá trouxe manga Mariti para plantar. Lia a Bíblia e aplicava sermão invocando as parábolas lá escritas. O pai português teve as terras que vão de Ilha Bela a Timbó. Joca fez engenho e rua de casas que pôs o nome Guarani. No começo, moagem da cana por obra de umas bestas na almajarra, animais que criava lá por Baixa Verde junto a um gadinho pouco. Começava a moer em agosto o açúcar entregue a Tiburtino Bezerra que negociava para a Inglaterra. O transporte em lombo de animal até Igapó, ali de canoa pelo Potengi até os armazéns da Ribeira.