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25/10/2015

COISAS DE MACAÍBA




A MEGASENA DE PETRARCA

Valério Mesquita*

Petrarca Feitosa Marinho, o bispo de Braga, como prefere ser cognominado, é uma das melhores figuras de Macaíba. Oculto, mas culto, autodidata, observa o mundo e as pessoas com extrema piedade cristã. O Apocalipse é a sua leitura preferida porque já não crê em mais nada. “Já me perdi na estrada”, gosta de repetir. O mundo para ele é um caso liquidado. Se não existisse no sistema solar não seria necessário criá-lo. “Foi um equívoco de Deus”, vocifera amargurado apontando para um vereador seu desafeto.
Fui encontrá-lo praguejando contra o fechamento do octogenário Bar Gato Preto, nas cinco bocas profundas, em pleno centro de Macaíba aflita. Lamentava não haver tirado a mega-sena da virada. “Reabrirei o bar e farei baixar todos os seus fantasmas circundantes, custasse o que custasse. Contratarei os serviços mediúnicos de babalaô Dedé de Macambira e dona Lourdes Boi, catedrática umbandista da rua do Araçá”, afirmou reverentemente, cheirando tabaco. “Mas, Petrarca, é muito dinheiro só para a abertura do bar”, arriscou um palpite Severino Viúvo, seu amigo. “Você compra até Macaíba inteirinha, se quiser”, completou estatisticamente. O bispo de Braga assumiu um ar filosofal para depois sentenciar, como se ministrasse uma tese. “Dinheiro, meu amigo, só serve para três coisas: comprar a salvação da alma na igreja mais decente sem títulos protestados; curar quem tiver doente nesse mundo podre e também caráter de cabra safado em véspera de eleição, que em Macaíba tem como uma peste”.
Já se aglomeravam algumas pessoas quando pedi para que fôssemos ao bar mais próximo rebater o calor da manhã com uma cerveja gelada. Segurou-me o braço para em tom patético profetizar: “Só bebo no Bar Gato Preto. Outro lugar pra mim é falso, amaldiçoado”. Já caminhávamos para a praça Augusto Severo quando Agenor da Tripa, ex-vereador e sabedor de sua pretensa sorte megasênica, resolveu abordá-lo: “Seu Bispo, sobra algum dinheiro para ajudar a minha eleição de vereador?”. “Agenor”, responde o “prelado”, “Você é gente boa, humilde e simples. Vai ser explorado pelo povo. Vou lhe dar muito remédio para você distribuir com essa gente. Só não furte do hospital porque é feio. Eu vou comprar mesmo nas farmácias e lhe doar!”. Disse isso e entrou na rua do ex-cabaré de Macaíba, o “Gango”, desaparecendo com os seus mistérios. Como de praxe deixou no ar dúvidas e dívidas, inerentes a todo sábio e pregador de iniquidades. Fiquei imaginando sobre o fato dos últimos sorteios acumulados da mega-sena continuarem premiando os banqueiros.

(*) Escritor.

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