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29/06/2015

NAS ENTRELINHAS DA VIDA PÚBLICA

 Valério Mesquita, escritor (Presidente do IHGRN)

Certos homens adquirem uma visibilidade tão marcante em seu campo de atuação que se tornam imprescindíveis aos seus contemporâneos, na medida em que suas opiniões e convicções passam a determinar modos de ver e de interpretar os acontecimentos da vida social. É que aos olhos deles nada daquilo que importa passa ao largo.
Assim vejo e identifico o meu primo irmão Ticiano Duarte. Desde a antiga rua 13 de Maio, depois Princesa Isabel, quando o conheci efetivamente e melhor, lá pelos idos de 1950. De 1954 em diante fui revê-lo na rua Voluntários da Pátria, nº 722, Cidade Alta, telefone 2901. Ele era já expressão do “bate papo” no Grande Ponto, seu fiel ancoradouro, onde tornara-se notário público e destemido navegante das ruas e avenidas da política potiguar. Bacharel em Direito da Faculdade de Maceió, torna-se decano do jornalismo da imprensa potiguar, atividade da qual goza de ilibada notoriedade por sua isenção e imparcialidade nos juízos dos acontecimentos da política. Seu memorialismo, ganha ritmo de crônica e embasamento de historiador. Em seus escritos é possível intuir aquele saber de experiências, traço que distingue o verdadeiro homem de visão de um mero prestidigitador de quimeras.
Presença fecunda na imprensa norte-riograndense, a colaboração de Ticiano Duarte para a Tribuna do Norte rendeu, numa primeira seleção, o livro “Anotações do meu caderno” (Z Comunicação/Sebo Vermelho, 2000), reunindo os principais fatos políticos dos últimos 70 anos do século passado no Rio Grande do Norte. A precisão das análises, a escolha dos protagonistas, a evolução dos acontecimentos e o retrospecto dos episódios que marcaram profundamente as vicissitudes da política potiguar encontram ali o seu cronista mais atento e informado, imparcial e verdadeiro. Neste seu novo livro, objetivamente intitulado “No chão dos perrés e pelabuchos”, avultam as mesmas qualidades que consagraram “Anotações do meu caderno”, com a única diferença de que agora ele se detém com mais vagar na descrição de perfis e na análise comparativa dos fatos, mesmo separados por décadas. Vultos inesquecíveis da vida pública estadual, como Djalma Maranhão, Georgino Avelino, Café Filho, Aluízio Alves, Odilon Ribeiro Coutinho (“mistura de tabajara e potiguar”), Tales Ramalho (“paraibano por acidente, norte-riograndense pelas grandes ligações familiares, e pernambucano por adoção”) são algumas das estrelas de primeira grandeza dessa constelação de escol. Cronista, para quem a política não pode se dissociar da ética, sob pena de naufragar nos desmandos de governantes e correligionários, Ticiano faz o elogio dos políticos exemplares perfilando a figura de Café Filho porque, justifica, “o povo espera dos homens públicos, exemplos. E alguém disse, com muita propriedade, que o importante não é só pregar moral apenas para os outros, censurando nos outros o que silencia entre amigos e parceiros”. Ao fazer o elogio da lealdade e da coerência, ele retira do limbo o nome de Walfredo Gurgel, ressaltando que “o seu governo foi um exemplo de seriedade no trato e na gestão da coisa pública. Todo o Rio Grande do Norte sabe desta grande verdade, mesmo seus adversários não podem omiti-la, por mais que o tenham combatido no campo das idéias e das diferenças partidárias”.
Em “No chão dos perrés e pelabuchos” ainda é possível encontrar silhuetas de políticos esquecidos pela História mas preservados, por exemplo, numa Acta Diurna de Luís da Câmara Cascudo, como Hermógenes José Barbosa Tinoco, deputado do Partido Liberal que a voragem do tempo soterrou; os entreveros entre pelabuchos e perrés que incendiaram o paiol das agremiações políticas dos anos 1930 que não escapam à argúcia focada por Ticiano sobre os atores da nossa história.

Ele propõe e reforça as teses daqueles que defendem a necessidade de uma urgente reforma política a fim de repor o país nos trilhos da ética e inaugurar uma nova era na vida política brasileira. O seu olhar espelha neste livro o brilho e a lucidez dos seus brancos cabelos, ainda atentos para ver a vida e o mundo.

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