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27/01/2015

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R O O S E V E L T   E   G E T Ú L I O
GILENO GUANABARA, do IHGRN

            1943. Mês de janeiro, na cidade do Natal. Fez-se crer que as autoridades locais, na época, de aproximadamente 40 mil habitantes, não tivessem a dimensão do que representou o pouso de dois Flying Clipper, Boeing B-314 da Pan American, a serviço da Marinha Americana, nas águas serenas do Rio Potengi, às 7,30 horas, no dia 28. Em voo sem escala, num percurso inimaginável desde Clasablanca, no Marrocos, até a cidade destino, uma das aeronaves trazia de volta, em sua comitiva, o presidente dos EUA, Franklin Delano Roosevelt. Sem passar pela estação da Panair recém construída, o Prédio da Rampa, foi conduzido em lancha ao torpedeiro USS Humbolt, este surto no estuário do rio. No dia seguinte, deu-se o encontro histórico entre o Presidente americano e Getúlio Vargas, sem que antes o visitante se reunisse em separado com o seu embaixador, Jefferson Caffery.
O presidente do Brasil foi trazido do Rio de Janeiro pelo Comandante da Quarta Frota da Marinha dos Estados Unidos, numa aeronave americana, tendo ainda por testemunha o embaixador americano. Getúlio, como bom anfitrião, chegou a Natal, diz-se, sem que ninguém soubesse, no dia anterior, e instalou-se no navio Jouett.
A História oficial registra dentre os outros motivos de menor importância, os que foram chancelados durante o encontro, como a influência nazifascista no Brasil; a necessária adesão aos aliados contra o Eixo; a cessão do território nacional para instalação de bases militares americanas que permitisse a incursão aérea dos aviões americanos ao Norte da África; a participação de tropas brasileiras no conflito e, por fim, em caráter compensatório, o financiamento de indústrias de base, a serem instaladas no Sul do país. Como então se resumir a tão pouco a celebrada visita?...
A primeira notícia de cessão de parte do território nacional, para efeito de instalação de bases militares americanas, deve-se a expediente enviado por Getúlio Vargas, através do embaixador Macedo Soares, em janeiro de 1937, dirigido ao Departamento de Estado norte-americano. Na segunda metade daquele ano, Getúlio, que se incomodava diante dos rumos da sucessão presidencial e as conjurações que lhe faziam oposição – os comunistas em 1935 e o assalto ao Palácio do Catete pelos integralistas, em 1936 – articulou a farsa do Plano Cohen, pelo que, segundo a sua revelação pública, estaria em andamento um golpe contra as instituições democráticas então em vigor. Assim, para combate-lo, obteve o apoio parlamentar quase unânime da Câmara Federal, para a decretação do Estado de Sítio. Na sequência, Getúlio decretou o fechamento do Congresso Nacional, limitou o funcionamento do Poder Judiciário, instalou a ditadura, o regime de exceção a que se denominou Estado Novo, revogou a Constituição de 1934 e outorgou uma nova Carta.
Embora o aparato político-administrativo do Estado Novo internamente ainda se mantivesse a todo vapor, dado o aparelhamento ideológico das instituições pelo Estado autoritário –Justiça do Trabalho e institutos de previdência; outorga da Constituição Polaca e da CLT; criação de órgãos colegiados de controle profissional; censura da imprensa; sindicalismo oficial; repressão policial aos  divergentes do regime; fim dos partidos e a legislação através dos malsinados decretos-leis -, pelo mundo afora, a conferência realizada em Casablanca, em que pese a ausência de Stalin, revelou o sentimento vitorioso que já se anunciava na derrota iminente dos nazifascistas às margens do Rio Volga, pelas tropas soviéticas.
 Ao que Churchill sinalizou em Casablanca como o começo do fim da guerra, teve significado maior a inconfidência de Roosevelt, que revelou só aceitar a rendição da Alemanha e dos países do eixo de forma incondicional. Tudo isso fora trazido à ciência de Getúlio por Roosevelt de viva voz. Na ausência de outro aporte, restou ao caudilho redimensionar suas posições até então em favor do Eixo. A persistência de Oswaldo Aranha, embaixador em Washington, findou vitoriosa. Coube a Getúlio exercitar o seu parco inglês com o visitante, rir muito, baixar a guarda e pedir arrego. Os EUA eram os maiores importadores de café brasileiro e a Alemanha a maior importadora de algodão, o que os EUA cultivavam em larga escala.
Diz o brocado que em mais de uma pessoa é impossível existir segredo. A passagem de Roosevelt por Natal, face o incômodo do longo percurso da travessia; os esquemas de segurança acionados; os custos e o alcance das autoridades civis e militares envolvidas, não permitiam a conclusão ingênua de que o encontro em Natal fora um ato secreto e de propósitos tão singelos. Não fosse a inusual presença de vasos de guerra discrepantes da pachorra da bacia do Rio Potengi, ou da presença de adolescentes que nadavam na praia do Canto do Mangue, os quais reconheceram Getúlio, a quem chamaram carinhosamente de “GeGê”, com quem dialogaram e receberam donativos em moeda que atirou às águas do rio, não é possível que, pelo menos, uma das partes, não tivesse a devida proporção do motivo que o seu interlocutor ilustre era missivista. Ainda mais, a despreocupação com que os presidentes percorreram as ruas da cidade em um jeep aberto, indo à Base Almirante Ary Parreiras e depois até a Base Aérea de Parnamirim, sendo reconhecidos e aplaudidos no percurso por populares, sem incidentes, torna notório que outras motivações foram confabuladas, como a política de interesses regionais futuros.
Ao final da visita, Roosevelt, que pelas águas do Rio Potengi veio, foi-se. Seguiu para Miami a bordo do primeiro “Air Force One”. De lá para Washington, quando só então foi divulgada a reviravolta de Stalingrado e os novos destinos do mundo.
Desde a visita de Roosevelt a Getúlio no Rio de Janeiro, no ano de 1936, a admiração entre ambos viu-se ampliada. A mudança de rumo que se operou ao fim do conflito mundial; a reviravolta política observada no Brasil, nos anos seguintes a 1943; a representatividade obtida a partir da constituinte de 1946, houve um avanço inegável da política. Só que a guerra fria prosseguiu impávida a nos atormentar.

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