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05/09/2014

LIVROS




Marcelo Alves

Marcelo Alves


Minhas livrarias em Paris (II)

Como prometido semana passada em “Minhas livrarias em Paris (I)”, faremos, em busca de mais livrarias, uma caminhada pelo Boulevard Saint-Germain, sentido leste, em direção ao Quartier Latin. Não será uma longa jornada. O bairro de Saint-Germain-des-Prés e o Quartier Latin são vizinhos. Quase se misturam tanto física como espiritualmente.

É verdade - pelo menos para mim - que Saint-Germain-des-Prés é um bairro mais “requintado” que o Quartier Latin. Historicamente o bairro da “Universidade” (falo aqui da Sorbonne, hoje formalmente chamada de “Université Paris 1 Panthéon-Sorbonne”), portanto muito frequentado por estudantes, o Quartier Latin é mais popular e relaxado se comparado com o seu vizinho. De toda sorte, sendo o bairro da Sorbonne e dos estudantes, é o paraíso em Paris para os amantes de livrarias.

No Quartier Latin, mais precisamente no conhecidíssimo Boulevard Saint-Michel, estão as duas maiores (segundo o meu conhecimento, pelo menos) e melhores livrarias de Paris.

A primeira delas é Gibert Joseph, que ocupa os números 26-34 do referido Boulevard Saint-Michel (se tomar o metrô, sugiro descer na estação Cluny - La Sorbonne ou, embora seja um pouco mais distante, na estação Saint-Michel). A Gibert Joseph é gigantesca. Vários andares, no estilo das grandes livrarias americanas (tipo a Barnes & Noble) e inglesas (como a Waterstones). Tem de tudo. Livros novos. Livros em promoção. Livros seminovos em promoção maior ainda. Para um cidadão como eu, acusado de ser amarrado (injustamente, pois sou apenas econômico), é uma “meca” para aquisição de livros. Ainda recordo os livros sobre “direito e literatura” que ali comprei em abril passado. Todos novinhos, baratíssimos, por menos da metade do preço de tabela.

Se for à Gibert Joseph, desde já vai uma dica: não deixe de visitar o “Musée de Cluny” (cujo nome oficial hoje é “Musée National du Moyen Age - Thermes de Cluny”). Está basicamente em frente à livraria. Trata-se de um museu construído sobre ruínas galo-romanas (que foram adquiridas, em 1330, pelo abade do Mosteiro de Cluny, derivando daí o seu nome), com uma das mais fantásticas coleções de arte medieval do planeta. Ali estão esculturas, entalhes em madeira, trabalhos em metal, joias e, sobretudo, belíssimas tapeçarias, como, por exemplo, o famosíssimo conjunto “A senhora e o Unicórnio”.

Por ali também fica, mais precisamente ao derredor da Place Saint-Michel (recomendo descer na estação de metrô Saint-Michel), outra gigantesca livraria: a Gibert Jeune. Acho que os acervos dessas duas “rivais”, a Gibert Joseph e a Gibert Jeune, se equivalem, tanto em quantidade como em qualidade. Mas a organização da Gibert Jeune é diferente. Ela é distribuída em prédios menores (se comparado com o único prédio da Gibert Joseph), todos, em um total de oito, situados, como já disse, no entorno da Place Saint-Michel. Os livros de direito, por exemplo, ficam no número 6 Place Saint-Michel. Se você está interessado em um gênero específico de livros, até facilita o trabalho de garimpagem.

Indo à Gibert Jeune, sugiro, lá para as tantas, dar uma pausa na garimpagem de livros e, partindo da Place Saint-Michel, emburacar na pequenina Rue da La Huchette e vizinhança. Ruas animadíssimas, cheias de bares e restaurantes. Gente jovem e bonita. Ali você pode comer bem e tomar uma ou todas, a depender do seu humor e dos seus compromissos no dia seguinte.

Da Rue da La Huchette é um pulo para a mais famosa livraria do Quartier Latin, a pequena, desorganizada, mas aconchegante, Shakespeare & Company, especializada em livros em inglês. Ela fica no número 37 da Rue de la Bûcherie (estações Saint-Michel ou Cluny - La Sorbonne). Tudo bem pertinho. Caminhando, você não se perderá, a não ser que tenha tomado muito - mas muito mesmo - vinho.

Embora os desavisados não saibam, essa é a “segunda” Shakespeare & Company de Paris, ali aberta por George Whitman (1913-2011) em 1951. A primeira, fundada por Sylvia Beach (1887-1962) em 1919, talvez ainda mais famosa - frequentada por Ford Madox Ford (1873-1939), Gertrude Stein (1874-1946), James Joyce (1882-1941), Erza Pound (1885-1972), Scott Fitzgerald (1896-1940), Ernest Hemingway (1899-1961) e muitos outros expatriados bons de pena -, ficava em outro local da cidade. A velha Shakespeare & Company fechou as portas com a 2ª Guerra Mundial, em 1940, e nunca mais reabriu. Então, não perca a oportunidade de ir à nova. Até porque, mesmo que você ache sem sentido comprar livros em inglês em Paris, da calçada da nova Shakespeare & Company, outrora frequentada pelos poetas da geração “Beat”, você terá uma belíssima vista da fachada sul da Catedral de Notre-Dame, sobre a qual falaremos na semana que vem.

Por fim, antes que alguém me pergunte - “e onde estão as livrarias jurídicas? Não se falará delas nesse lero-lero todo?”, respondo: falaremos, sim, na próxima semana, quando passearmos pelas imediações do Panthéon e da Sorbonne e, em seguida, dermos um pulo rápido na Ilé de la Cité.

Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP

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