Minhas livrarias em Paris (II)
Como prometido semana passada em “Minhas livrarias em Paris (I)”,
faremos, em busca de mais livrarias, uma caminhada pelo Boulevard
Saint-Germain, sentido leste, em direção ao Quartier Latin. Não será uma
longa jornada. O bairro de Saint-Germain-des-Prés e o Quartier Latin
são vizinhos. Quase se misturam tanto física como espiritualmente.
É verdade - pelo menos para mim - que Saint-Germain-des-Prés é um
bairro mais “requintado” que o Quartier Latin. Historicamente o bairro
da “Universidade” (falo aqui da Sorbonne, hoje formalmente chamada de
“Université Paris 1 Panthéon-Sorbonne”), portanto muito frequentado por
estudantes, o Quartier Latin é mais popular e relaxado se comparado com o
seu vizinho. De toda sorte, sendo o bairro da Sorbonne e dos
estudantes, é o paraíso em Paris para os amantes de livrarias.
No Quartier Latin, mais precisamente no conhecidíssimo Boulevard
Saint-Michel, estão as duas maiores (segundo o meu conhecimento, pelo
menos) e melhores livrarias de Paris.
A primeira delas é Gibert
Joseph, que ocupa os números 26-34 do referido Boulevard Saint-Michel
(se tomar o metrô, sugiro descer na estação Cluny - La Sorbonne ou,
embora seja um pouco mais distante, na estação Saint-Michel). A Gibert
Joseph é gigantesca. Vários andares, no estilo das grandes livrarias
americanas (tipo a Barnes & Noble) e inglesas (como a Waterstones).
Tem de tudo. Livros novos. Livros em promoção. Livros seminovos em
promoção maior ainda. Para um cidadão como eu, acusado de ser amarrado
(injustamente, pois sou apenas econômico), é uma “meca” para aquisição
de livros. Ainda recordo os livros sobre “direito e literatura” que ali
comprei em abril passado. Todos novinhos, baratíssimos, por menos da
metade do preço de tabela.
Se for à Gibert Joseph, desde já vai
uma dica: não deixe de visitar o “Musée de Cluny” (cujo nome oficial
hoje é “Musée National du Moyen Age - Thermes de Cluny”). Está
basicamente em frente à livraria. Trata-se de um museu construído sobre
ruínas galo-romanas (que foram adquiridas, em 1330, pelo abade do
Mosteiro de Cluny, derivando daí o seu nome), com uma das mais
fantásticas coleções de arte medieval do planeta. Ali estão esculturas,
entalhes em madeira, trabalhos em metal, joias e, sobretudo, belíssimas
tapeçarias, como, por exemplo, o famosíssimo conjunto “A senhora e o
Unicórnio”.
Por ali também fica, mais precisamente ao derredor
da Place Saint-Michel (recomendo descer na estação de metrô
Saint-Michel), outra gigantesca livraria: a Gibert Jeune. Acho que os
acervos dessas duas “rivais”, a Gibert Joseph e a Gibert Jeune, se
equivalem, tanto em quantidade como em qualidade. Mas a organização da
Gibert Jeune é diferente. Ela é distribuída em prédios menores (se
comparado com o único prédio da Gibert Joseph), todos, em um total de
oito, situados, como já disse, no entorno da Place Saint-Michel. Os
livros de direito, por exemplo, ficam no número 6 Place Saint-Michel. Se
você está interessado em um gênero específico de livros, até facilita o
trabalho de garimpagem.
Indo à Gibert Jeune, sugiro, lá para
as tantas, dar uma pausa na garimpagem de livros e, partindo da Place
Saint-Michel, emburacar na pequenina Rue da La Huchette e vizinhança.
Ruas animadíssimas, cheias de bares e restaurantes. Gente jovem e
bonita. Ali você pode comer bem e tomar uma ou todas, a depender do seu
humor e dos seus compromissos no dia seguinte.
Da Rue da La
Huchette é um pulo para a mais famosa livraria do Quartier Latin, a
pequena, desorganizada, mas aconchegante, Shakespeare & Company,
especializada em livros em inglês. Ela fica no número 37 da Rue de la
Bûcherie (estações Saint-Michel ou Cluny - La Sorbonne). Tudo bem
pertinho. Caminhando, você não se perderá, a não ser que tenha tomado
muito - mas muito mesmo - vinho.
Embora os desavisados não
saibam, essa é a “segunda” Shakespeare & Company de Paris, ali
aberta por George Whitman (1913-2011) em 1951. A primeira, fundada por
Sylvia Beach (1887-1962) em 1919, talvez ainda mais famosa - frequentada
por Ford Madox Ford (1873-1939), Gertrude Stein (1874-1946), James
Joyce (1882-1941), Erza Pound (1885-1972), Scott Fitzgerald (1896-1940),
Ernest Hemingway (1899-1961) e muitos outros expatriados bons de pena
-, ficava em outro local da cidade. A velha Shakespeare & Company
fechou as portas com a 2ª Guerra Mundial, em 1940, e nunca mais reabriu.
Então, não perca a oportunidade de ir à nova. Até porque, mesmo que
você ache sem sentido comprar livros em inglês em Paris, da calçada da
nova Shakespeare & Company, outrora frequentada pelos poetas da
geração “Beat”, você terá uma belíssima vista da fachada sul da Catedral
de Notre-Dame, sobre a qual falaremos na semana que vem.
Por
fim, antes que alguém me pergunte - “e onde estão as livrarias
jurídicas? Não se falará delas nesse lero-lero todo?”, respondo:
falaremos, sim, na próxima semana, quando passearmos pelas imediações do
Panthéon e da Sorbonne e, em seguida, dermos um pulo rápido na Ilé de
la Cité.
Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP
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