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21/08/2014


O GRITO DO IPIRANGA E O BRASIL POLÍTICO
Por: GILENO GUANABARA, sócio efetivo do IHGRN

            Pelos idos de 1826, foi divulgada e posta à venda nas lojas do Rio de Janeiro, sem autoria anotada, a obra cujo título era O grito do Ipiranga e o Brasil Político. Foi escrito em partes, as quais relatavam os momentos e atos que precederam a proclamação da independência; a constituinte de 1823; a influência de Domitila de Castro, amante do imperador Pedro I; a figura e os negócios escusos atribuídos a Francisco Gomes da Silva, O Chalaça; e a fartura da distribuição de títulos de nobreza a gente inculta e amoral nos negócios.

Dada a força dos relatos que continha, por ordem do imperador, a edição foi apreendida e proibida a sua leitura, sob pena de prisão. Poucos volumes salvaram-se do index e tornou-se uma das obras mais rara entre os bibliógrafos nacionais e estrangeiros. O periódico carioca A malagueta (1827) atribuía sua autoria aos três irmãos Andradas (Bonifácio, Martim e Antônio Carlos), na época em que estiveram exilados na Europa.

            Anos depois, o padre Belchior Pinheiro de Oliveira assumiu a autoria do livro, na parte relativa aos fatos da proclamação da independência. Houve também a confirmação de José Joaquim da Rocha, para quem o livro fora impresso em Paris e tivera a participação dos exilados de 1823, dentre eles os irmãos Andradas.

            Preciosa testemunha ocular dos fatos que presenciou quando da declaração da independência, o padre Belchior fez constar que, na época, era confessor e confidente de D. Pedro I, exatamente quando do percurso de volta de Santos. Encontrava-se ao seu lado, na hora em que lhe foram entregues diversas cartas: uma, das Cortes Portuguesas, que exigiam a volta imediata do soberano e a prisão de José Bonifácio; outra, do seu pai, D. João, que aconselhava obediência às leis portuguesas; outra, da Princesa que aconselhava cautela e recomendava a oitiva do seu Ministro; outra, de José Bonifácio que orientava o príncipe dos caminhos a seguir (ou a prisão ou a proclamação da independência); e uma de Chamberlain, informante do príncipe, que lhe prevenia da vitória do partido de D. Miguel em Portugal, cujos interesses eram contrários a D. Pedro I.

            Relata o padre Belchior que o Príncipe, após ler as missivas, foi tomado de súbita contrariedade, arrebatando-lhe as cartas, amarrotando-as e lançando-as ao chão. Dirigiu-se ao mato próximo, a fim de quebrar o corpo à margem do riacho Ipiranga, por força da disenteria cujas dores o agonizava desde Santos. Ao retornar do mato, compondo a fardeta, dirigiu-se ao padre relator: E agora, padre ?  A resposta imediata que ouviu: Se V. Alteza não se faz Rei do Brasil será prisioneiro e talvez seja deserdado pelas Côrtes.

            Taciturno, o futuro imperador do Brasil caminhou em direção aos cavalos, acompanhado do séquito de que compunha o Padre Belchior e outros, quando fez a revelação: Padre Belchior, eles o querem, terão a sua conta. As Cortes nos perseguem, chamam-me, com desprezo, de rapazinho e de brasileiro. Pois verão agora quanto vale o rapazinho. De hoje em diante estão quebradas as nossas relações, nada quero mais do Govêrno Português. Está feita a liberdade do Brasil. Todos os presentes gritaram imediatamente Viva a liberdade do Brasil ! Viva D. Pedro.

            O recém proclamado Imperador dirigiu-se a sua ordenança e ordenou que a guarda fosse informada que acabara de proclamar a independência e a separação do Brasil de Portugal. Cumprindo a ordem, vieram os dragões em direção ao Príncipe, dando vivas ao Brasil independente, a D. Pedro e à Religião. Reunidos e do monarca ouviram o juramento: De hoje em diante nossas relações estão quebradas. Nenhum laço nos une mais !  O Príncipe arrancou do chapéu o distintivo com as cores de Portugal. Desembainhou a espada, gesto que foi acompanhado pelos demais e proclamou: - Pelo meu sangue, pela minha honra, por Deus, juro defender a liberdade do Brasil. E prosseguiu: - Brasileiros: a nossa divisa de hoje em diante será o dístico Independência ou Morte, e as nossas cores serão verde e amarelo, em substituição às das Côrtes.

            O Príncipe e a comitiva dirigiram-se para a cidade de São Paulo, onde hospedou-se na residência do capitão Antônio Silva Prado. Imediatamente, ao chegar, deu ordens a sua guarda, para ir ao ourives Lessa e confeccionar um distintivo em ouro, com as palavras Independência ou Morte. À noite, com o distintivo preso ao braço, compareceu à Casa da Ópera, vizinho ao largo do Palácio, a primeira casa de espetáculos de São Paulo. No camarote nº 11, que lhe foi reservado, o Príncipe ouviu do padre Ildefonso Xavier Ferreira a conclamação de D. Pedro ser O Rei do Brasil, com manifestação favorável do público presente.

Durante o percurso das ruas, na ida e na volta ao teatro, D. Pedro assistiu às congratulações da população que ostentava laços e fitas de cores verde e amarela, acenadas em sinal de aprovação ao Príncipe. No entanto, por medida de justificada temeridade, para com as filhas donzelas, nas ruas por onde caminhou o Príncipe, os pais de família recolhiam as moças aos seus aposentos, para que elas não ficassem à vista, tal a fama da impetuosa autoridade, em se tratando de meninas-moças.

            Dados os detalhes revelados dos momentos da Proclamação da Independência que testemunhou, esteve presente e a tudo viu, a revelação do padre Belchior, quanto a autoria de parte de O Grito do Ipiranga e o Brasis Político, afasta as dúvidas quanto a veracidade dos fatos e a verdadeira autoria de sua lavratura, na parte que lhe toca.

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