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02/06/2014

O JORNALISTA DESTEMIDO



ELOY DE SOUZA


Jurandyr Navarro
Do Conselho Estadual de Cultura

Nascido no Recife aos 4 de Março de 1897 e falecido em Natal em 7 de Outubro de 1959.

Adquiriu fama imorredoira entre os colegas de Imprensa, pelo fato de ditar duas ou três matérias, simultaneamente. Habituou-se, desde cedo, ao raciocínio rápido, inspira­do pelo cheiro da tinta e do tilintar dos tipos, que ao seu tempo, eram agrupados um a um, na cachêta, para fazer a composição da matéria jornalística, como as letras na formação dos nomes, a encher as páginas do jornal desses minúsculos caracteres linguísticos silábicos...

Que ele ditava duas ou três matérias a um só tempo, confirmou-me o emérito Advogado Raimundo Nonato Fernandes, que há esse tempo, trabalhando n "A Repúbli­ca", servia-lhe como datilógrafo. O doutor Raimundo digitou, para ele, todo o livro "Calvário das Secas", dentre outros trabalhos do jornal. E que, ao ditar, fazia-o, andando em volta, e parando; às vezes, perguntava: "Está certo o que eu disse? (...) "Está bom isso? ..."Fazia-o segurando os suspensórios.

Dê-le diz-se, também, que certa vez, ditando um libelo contra um adversário polí­tico, sendo interrompido com a notícia de que aquele opositor havia aderido ao Partido Popular; ele, ante os olhares interrogativos, disse: "vírgula, assim proclamam os seus inimigos..." e continuou a sua matéria jornalística, fazendo a apologia do novo correligio­nário.

Muitos os comentários de suas artimanhas e proezas jornalísticas e ditos espiritu­osos e inteligentes. Se há exagero nos elogios ao seu talento, no fundo fica alguma coisa de verossímil. Fato é que o seu nome, no oficio, havia virado legenda.

À unanimidade dos que fazem a imprensa escrita, Eloy de Souza foi escolhido o mais autêntico jornalista da gleba potiguar, de todos os tempos.

Por tal razão, quando foi criada a Associação dos Jornalistas do Rio Grande do Norte, pelo seu idealizador João Medeiros Filho, Eloy de Souza foi escolhido seu Presidente de Honra. Para se chegar a esse consenso pressupõe-se um julgamento espontâneo diante do seu estilo inconfundível, objetivo, substantivado, ornado de ideias claras e a imaginação vivaz, ao relatar os fatos com memória fiel. A excelência da sua condição de literato muito o ajudou nas lides da imprensa. Pois todos sabem ser o jornalismo um dos mais elevados géneros da litera­tura.

Em matéria de jornal tudo conhecia e utilizava caso houvesse necessidade; o editorial conciso, o artigo bem esplanado, o suelto sumariado, a forma clara e eloquente da notícia, o rodapé, o registro, a nota panfletária, a polêmica política ou literária, as manchetes, a administração do jornal, as artimanhas jornalísticas... pois o jornal é tal a figura mitológica de Argos - tem cem olhos - e outros ofícios...

Em matéria de imprensa era ele mestre consumado.

A partir da juventude a sua inclinação natural pelo jornal e pela política. Nesta, para ajudar ao amigo e líder Pedro Velho, que também inteligente, via em Eloy de Souza o intelectual que ele precisava para alavancar o seu projeto político.

Declarou Otto Guerra, em discurso na Academia de Letras, que Pedro Velho a ele dissera: "Acabe logo com a sua Bacharelice em Recife e volte". E acrescentou o líder religioso, que por este apelo do Amigo, Eloy se diplomou apenas em Ciências Sociais. É que o Diploma da Faculdade de Direito do Recife confere ao formado o Título de Bacha­rel em Ciências Jurídicas e Sociais, e não somente em Direito.

Eloy de Souza fora atraído pela sedução jornalística por uma vocação nata, por gostar do ofício e ter a devida competência para exercê-la com a criteriosa sabedoria, usando a pena de ouro, o seu cálamo sagrado.

Foi um político de caráter, como raro se vê nos dias presentes. Forjou a moral política desde a legislatura estadual, chegando a renunciar um mandato em pleno exer­cício, por imposição da sua consciência. Eloquente a sua atuação como legislador, coadjuvado que foi, pelas qualidades congénitas - honra, caráter e inteligência; e as adquiridas - trabalho, competência e sociabilidade.

A imprensa, pelo alto poder de persuasão, serviu-lhe de poderoso fulcro à ação política; a par o seu generoso coração, que jamais o deixou inativo frente às necessida­des do seu pobre Estado e da sua pobre gente.

Marcou a sua atividade com o combate às Secas, principalmente, cujos efeitos danosos sacrificava a gente sertaneja. Cuidou, outrossim, da incipiente agricultura a braços com a monocultura algodoeira da época.

Tanto quanto jornalista autêntico e criterioso político, exíbiu-se, ainda, como bri­lhante intelectual. Pertenceu a várias das nossas instituições culturais, tendo sido Sócio fundador da Academia Norte-Rio-Grandense de Letras, mesmo não sendo potiguar. Os Estatutos à época, vedavam a entrada aos que não fossem rio-grandenses do norte por nascen­ça. Exceções foram feitas a ele, ao Padre Luiz Monte, pernambucano, também, e ao paraense Floriano Cavalcanti, em virtude de suas notórias culturas.

Eloy de Souza dirigiu a Imprensa Oficial, alto e cobiçado cargo da época, dirigiu também o jornal "A Razão" e a Caixa Económica Federal.

No Governo Aluízio Alves, o Governador, conhecedor de perto dos seus méritos incontestáveis, como jornalista, deu o seu nome digno à Faculdade de Jornalismo da Fundação "José Augusto", transformada, depois, no Curso de Jornalismo da nossa Universidade Federal.

Deixou algumas obras da melhor qualidade intelectual e considerável acervo de matéria jornalística espalhado pelas mil e uma páginas dos nossos principais periódi­cos, além de temas literários, políticos e económicos.

Usou pseudônimo, costume da época: Jacyntho Canella de Ferro.

Dentre outros livros escreveu "Cartas de um Desconhecido"; "Calvário das Se­cas" e "Cartas de um Sertanejo".

O seu augusto nome tem sido citado por políticos, jornalistas e intelectuais pelo seu trabalho edificante, como legislador e incansável porfiador no tumultuado ambiente da imprensa e da cultura.

Foi um político e um jornalista destemido. Por tal, sofreu Deportação da sua terra, no Governo Bertino Dutra.

Tendo em vista os consideranda supraditos e o talento tridimensional em dominar áreas polémicas de nossa sociedade - a imprensa, a cultura e a política -, enxerga-se em Eloy Castriciano de Souza um dos intelectuais mais inteligentes e hábeis do Rio Grande do Norte.

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