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01/06/2014

A riqueza da atividade mineradora impulsionou o conflito entre bandeirantes e emboabas.

EMBOABA NA HISTÓRIA DE SÃO PAULO
Por: Gileno Guanabara, sócio do IHGRN

            “Emboaba”, um dos lados do primeiro movimento nativista quando da disputa ao tempo do ouro de Goiazes, encontra referência no vocabulário “nheengatu”, objeto que foi da pesquisa de diversos estudiosos. De acordo com os apontamentos históricos, o vocábulo teria correspondido a um insulto que os paulistas dirigiam aos estrangeiros, em especial, uma ofensa aos portugueses, durante a disputa que mediou a conhecida Guerra dos Emboabas.

            Para parte dos estudiosos, a expressão deriva do tupi-guarani mboab, referente a uma ave de pernas emplumadas, atribuída aos forasteiros que cobriam as pernas. O cronista Batista Caetano, citado por Cândido Mendes (in Notas para a História Pátria), afirmava que emboaba correspondia ao o-mboá-bae, o laçador, o que atira o laço, sendo “i-amboa-báe” o laçador de índio, de gente e o mesmo era traidor, pérfido, pois no mesmo conceito se tinham os estrangeiros que chegavam somente para enriquecer, mediante a estultice e a felonia. Segundo a tese de Antônio Joaquim de Macedo Soares, na obra Etymologia da Palavra Emboaba, a expressão correspondia a conduta de um tipo de homem portador de cabelos diferentes.

            Varnhagem (in História Geral do Brasil), que a princípio admitiu ser emboaba uma expressão atribuída pelos índios aos portugueses, pelo fato de vestirem calças, afirmou ser a forma contraída de Amboabá (de Mbae-aba), ou seja “feito homem”. Já Theodoro Sampaio (in O Tupi na Geografia Nacional) diz que o termo deriva da forma verbal mbo-ar, movimento, de que a forma verbal “mbo-ab” exprime a ação de, a agressão, o ataque.

            Há discordância por parte de Affonso de Freitas Júnior, haja vista não se   ter aplicado a mesma expressão, no século XVII, a brasileiros que também vestiam calças, hábito que não era tão incomum, haja vista a relação de bens deixados em inventários e testamentos da época, incluindo como herança aquela indumentária que os portugueses introduziram, quando por aqui chegaram, sem que se lhe atribuísse a alcunha de emboabas. Era costume conservar-se num baú a fatiota exclusiva para se comparecer a rigor nas solenidades, servindo, por último, de mortalha. Diz o estudioso que os galináceos conhecidos naquela época, com tais características, foram animais exóticos trazidos ao tempo em que os indígenas já se tinham enfurnado nos sertões, sem possibilidade de assim nominar em ofensa os portugueses. De igual forma, o apelido decorrente de um tipo exótico de ave de pernas emplumadas, chamado Mboab, ainda assim não encontraria relação com a fauna existente nos campos do Piratininga.

            As digressões se aguçam ainda mais quando a questão envereda pela referência ao tipo de cabelo – aba-ambõaê-aba. Evidente que o português/mouro portasse pele escura, tivesse o fio dos cabelos apichaí e crespo e menos encorpado que o do indígena, sem que se desnaturassem as semelhanças verificáveis entre ambos. Aos esses negros os nativos dirigiam o epíteto Tapanhuno, ou seja bárbaro, negro estranho, palavras que decorrem de “Tapuya” e “una”.

            Em verdade, dado o ódio corrente dos paulistas aos estrangeiros que invadiam suas minas de ouro, atentando contra a fonte maior de sua riqueza naquele momento, foram diversos os apelidos que eram assacados contra os forasteiros: Galego; pés de chumbo; tamancões, entre outros. A expressão que melhor atingia o ímpeto da desforra, os paulistas foram encontrar na locação cabinda, do dialeto angolês, trazido para o Brasil. Em os portugueses se embrenharem na mata protegendo as pernas das cobras e mosquitos, pelo uso de longas botas, fora a adaptação do angolês camboá a que de maior zombaria se atribuía aos intrusos de suas minas, os traidores do Rio das Mortes (1708), na batalha do Capão da Traição. Na luta que se travou, se destacou a ação das mulheres de Piratininga, solidárias aos seus parentes traídos e derrotados, momento da maior batalha durante a guerra entre paulistas e emboabas.

            A expressão emboaba não foi dirigida aos portugueses que se mantiveram alheios ou fiéis à causa dos paulistas, mas àqueles que se identificaram contra os nativistas, os que se aliaram aos forasteiros, nem sempre portugueses. Foram tidos emboabas Manuel Nunes Vianna, Bento do Amaral Coutinho, Antunes Maciel, nativos a quem se acusa de traíram a causa e contribuírem para a derrota dos paulistas.

            Rocha Pita, baiano que se aliou aos portugueses contra os paulistas, afirmou (in América Portuguesa) que os povos das minas estavam divididos em duas parcialidades, uma, dos naturais de São Paulo e das Vilas de sua jurisdição, chamados Paulistas, e outra dos Forasteiros, a quem eles chamavam Emboabas, dando este nome a todos os que não sahião da sua Região”. Ayres do Casal (1817), nos escritos sobre a fundação de São Paulo afirma que um grande número de europeus se agregou aos índios que os chamavam emboabas, por terem as pernas cobertas. Na ausência de outros registros em arquivos, pelo menos encontra-se nas atas da Câmara da cidade a referência à nomeação de Amador Bueno da Veiga, cabo maior dos paulistas, a fim de combater os emboabas que eram referenciados através da expressão forasteiros.

            Azevedo Pizarro (in Memória Histórica do Rio de Janeiro-1820) informa que de Embuabas ou Buabas os paulistas chamavam as aves, galinhas ou não, que tinham as pernas cobertas de plumas. Daí, chamarem a todos os de fora que se portavam vestidos de botas ou polainas, cobrindo as pernas.

            Para Affonso de Freitas poder-se-ia decodificar todas as expressões homens de cabelos diferentes; laçadores de índios, etc., através dos matizes boya (cobra) e avá (homem), resumindo-se na figura ruim como cobra, cruel, astucioso, desleal, adaptação do termo cabinda Emboá, do angolês Camboá, cuja tradução é Cão. O sentido que fica, pois, é o de aventureiro, adversário dos paulistas durante a exploração das minas dos Goiazes. Passado o fragor da guerra, o termo Emboaba revelou o rigor acusativo ao inimigo e com a corruptela de buana dirigiu-se aos portugueses, com o estigma de vindita.  

           

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