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24/04/2014


                      S Ã O   P A U L O.  O   I N Í C I O.
Gileno Guanabara, do IHGRN

            São Paulo teve de início a história de três povoados: Com a destruição da feitoria de Pernambuco pelos franceses, sobrou a feitoria de São Vicente (ex-Porto dos Escravos). Era, pois, a única feitoria existente ao tempo da chegada de Martim Afonso de Souza (1532). Já instituídas as capitanias, uma vila foi fundada pelo donatário-mor, a qual se chamou Piratininga, a dez léguas do litoral, onde viviam padres e índios convertidos. Organizada a Câmara Municipal, passou à condição de vila, a primeira do Brasil, antes da criação de S. Paulo. Piratininga foi destruída pelos indígenas.

 Outro povoamento existente antes da chegada do navegador foi o de Santo André da Borda do Campo, fundada por João Ramalho, à margem direita do riacho Guapituba, início do alto do planalto, onde residiam mamelucos e índios. Foi alçada à condição de vila em 1553 e destruída em 1560, por ordem de Mem de Sá, Governador Geral, que ordenou fosse transferido o seu foral à vila de São Paulo.

            Representante da Companhia de Jesus no Brasil, Manuel da Nóbrega teve a incumbência de criar uma província. Para isso, ordenou aos padres recém-chegados da Bahia, Manuel de Paiva, José de Anchieta, Leonardo Nunes e outros, para que se enfurnassem na direção dos Campos de Piratininga, onde corria o atual rio Pinheiros (ou rio Piratininga) e ali fundassem um novo colégio dos Jesuítas no Brasil.

            Foram 13 os discípulos que, ajudados pelos índios da região, edificaram o “tejupar”, casa feita de palha, com portas de caniços e esteiras, que serviu de abrigo e depois colégio e igreja. Dormiam em redes, à maneira do gentio; acendiam fogueira no seu interior, à noite, a fim de dissipar o frio e os mosquitos. Andavam quase despidos, de pé no chão e não dispunham de alimentos, à exceção de quando os índios lhes doavam farinha de mandioca, peixes do rio ou, raramente, uma caça.

            No dia 25 de janeiro, consagrado pela igreja ao apóstolo São Paulo, no ano de 1554, nos campos de Piratininga, no altar singelamente edificado, foi rezada a missa pelo padre Manuel de Paiva, início da atual metrópole de São Paulo.

            A colonização iniciada pelo litoral evitava o vasto território do Pindorama, como chamava os nativos. Assim, a decisão de Manoel da Nóbrega de ordenar aos padres da Companhia de irem para o sertão de Piratininga foi relevante pelo fato dos portugueses “andar arranhando ao longo do mar, como caranguejos” (H. do Brasil, Frei Vicente do Salvador). A ideia de fundação de Brasília no cerrado, pois, não teria sido original.

            No sertão residiam monstros tenebrosos, dizia-se, a quem estavam confiadas as montanhas de ouro e prata por descobrir. Pedro de Gandavo (Hist. da Província de S. Cruz), professor que veio para ficar rico, referia-se a “pedras facetadas à maneira de diamantes” ... “arrebentando quando de vez, com estrondo” ... “pela terra a dentro, na encosta da montanha parturiente.”.

            De logo o percurso que os desbravadores enfrentaram. Defronte de si o cume da serra majestosa e íngreme, de onde se descortinavam as planícies que se esbanjavam na direção sul, depositárias de incontidas riquezas. Ao fundo, a ilha de São Vicente, o mar que a vista alcança. Visão projetada até o beiço do mar, baixio a que chamavam “Enguaguassú” (Pilão Grande), atual baixada santista, com a vista alongada até Santo Amaro e São Vicente. Pelo outro lado, a cercania alterosa da planície, que os indígenas chamavam “Paranapiacaba”. Ao seu derredor a Barra Grande, cujas águas salobras se encontram com as doces do “Mangaguá”, através dos riachos Cubatão, Itutinga, Pirakikê, e as dos vales do Jeribatiba e do Tescopara.

            Postados defronte à São Vicente os morros do Itararé, onde brotavam verdes canaviais, ao receptivo do Rio do Mantimento (“Turiuru”). Tal como sentinela avançada, despontando da floresta da Mantiqueira, Bertioga, portal de entrada e saída das terras baixas, cobertas de lodo e protegidas pelos manguezais.

            Ascendente o Jaraguá e as montanhas do Ibituruna do Parnaíba, emparedavam-se com a Mantiqueira faustosa, de onde desaguam as águas do riacho do Tietê. Eis, pois, a elegância descritiva do padre e cronista Simão de Vasconcelos (A Vida do Padre Anchieta), e o seu sentimento confesso: “amada capitania de São Vicente”.

            Os primeiros “mamalucos” do que veio a se formar São Paulo foram o berço da santidade de José de Anchieta, que chegou em São Vicente em 1553. Foram recepcionados por moradores “de frágil sentimento religioso, de grave obliterado senso moral”, no reconhecer de Nóbrega. Diferentemente da metrópole portuguesa, Anchieta e seus companheiros traziam consigo a liberdade, o instinto de criar a civilização mameluca, a epopeia diferenciada com base na fé e no desprendimento.

            Foram 13 os que desbravaram as encostas da “Paranapiacaba”, diante dos córregos do “Tamanduateí” e do Anhangabaú (Rio do Diabo), de onde corriam as “águas da maldade”, acercando-se da amizade e proteção dos gentios dos caciques “Tibiriçá” e “Cai-Ubi”.

            Despontava uma cumeeira de pedras avermelhadas, na direção sul, atual Largo da Liberdade. Tal saliência ia até o “Caaguassuí” (Mato Grosso), atual bairro da Vila Mariana. Sob a guarda das gentes de Tibiriçá, ao Norte e, ao Sul, as do gentio de Cai-Ubi, e noutra ponta, a trilha que seguia o rumo da atual Rua Direta, esta que foi a primeira rua de São Paulo.

            Eis o início da grande metrópole brasileira, “gente paulista, que tem no coração a imagem de um Brasil grande e glorioso”, no dizer do paulista e andrada, Antônio Carlos, em 1830. 

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