MARIA: A PRIMEIRA MULHER BRANCA NO
BRASIL
Por: Gileno Guanabara, advogado.
O registro da primeira
mulher branca que pisou no solo do Brasil tem a ver com as notícias das primeiras
viagens de colonizadores portugueses e das expedições corsárias aportadas aqui.
Considerado o hiato inicial da colonização que vai de 1500 até o ano de 1530, alega-se
que Martim Afonso de Souza deixara muitos casais na Capitania de São Vicente. Entretanto,
as expedições marítimas vindas de Portugal ou não, praticavam o escambo, faziam
o reconhecimento do litoral, ou combatiam a pirataria, em especial a dos
franceses.
A feitoria de
Pernambuco fora destruída pelos corsários franceses, quando em 1531 o navegador
Martim Afonso partiu e chegou no Brasil em janeiro do ano de 1532. Havia já as
feitorias de Porto Seguro, de Cabo Frio, e a de Cananeia. Vencida a frota
francesa, Martim Afonso seguiu em reconhecimento pelo litoral. Chegou à
Feitoria de São Vicente, seguindo até o Rio da Prata, onde naufragou.
Dado o descaso
da Metrópole para com a ocupação da
fazenda, ocorriam pelo litoral incursões frequentes de franceses e
ingleses. Daí a recomendação do Rei João III a Martim Afonso para fundar a
Capitania de São Vicente, antes feitoria conhecida por Porto dos Escravos. Pelo resultado econômico obtido da escravatura vermelha, o navegador a ela
também se dedicou, o que já era praticado pelos colonos que habitavam a região
e exploravam madeiras de lei e incursionavam pelo sertão, aprisionando e
comerciando milhares de indígenas, para outras colônias, até para a
Europa.
São várias as indicações
que negam a versão de que os primeiros casais e mulheres teriam chegado a bordo
das caravelas daquele navegador e distribuídos ao longo do litoral. O Diário da
Expedição de Martim Afonso de Souza, encaminhado ao Rei de Portugal, D. João
III, escrito pelo seu irmão, Pero Lopes, não faz referência à presença de
mulheres ou de casais a bordo da expedição. Na época, em Portugal, o nome brasil era sinônimo de castigo, de pena:
homicida, brasil nele; ladrão, Brasil
nele; falsificador de moeda, Brasil nele. Os milhares de criminosos trazidos
para o Brasil revelam o caráter punitivo das expedições compostas na maioria de
condenados arrebanhados nas prisões. Diante da onda de crimes hediondos praticados
pela escória que aqui chegou , Duarte Coelho, Donatário de Pernambuco, a chamava
de peçonha. Havia a previsão de combates iminentes e a costa marítima era infestada
de perigos. A par dos párias que
Portugal remeteu para a Colônia, os desorelhados, já se achavam aqui
náufragos, homiziados e cristãos-novos sobreviventes da Inquisição, que mantiveram
relações com as gentias, fundando os primeiros núcleos de povoamento.
O cosmógrafo
espanhol Afonso de Santa Cruz integrante da esquadra de Sebastião Caboto, no
ano de 1530, no relato do reconhecimento que fez (Islário) até a Feitoria de Cananeia, descreveu o povoamento de São
Vicente, segundo ele, composto de dez ou doze casas de pedras, com esteiras
servindo de portas e folhas largas de palmeira por cobertura. Detalhou o
escambo de indígenas que ali era praticado. São Vicente se tornou a primeira
vila e cidade (1534), haja vista a criação da sua Câmara Municipal.
Outra fonte, a carta
de D. João III, rei de Portugal, dirigida ao fidalgo Martim Afonso de Souza, publicada
em 1748, por Luis Lobo (Nobiliário, Tomo I) e Antônio Caetano de Sousa (História
Genealógica - Provas vol. VI), é um verdadeiro registro da criação da Capitania
de São Vicente. Na missiva real datada de setembro de 1532 se encontram as
informações segundo as quais as terras de São Vicente seriam a melhor porção da
colônia. Orientava o seu povoamento e ordenava a divisão da terra em lotes de
cinquenta léguas, desde Piratininga até o Rio da Prata. Noticiou El Rei a ordem
dada ao conde de Castanheira, a fim de apartar e doar cento e cinquenta léguas
de terra nos melhores limites dessa costa
do Brasil, em favor do comandante da esquadra e do seu irmão Pero Lopes.
Em referência à
expedição de Martim Afonso, existe ainda a missiva do marinheiro inglês, Thomas
Crasley, integrante da esquadra, dirigida a um mercador de Londres, parte da
documentação quinhentista, publicada em 1890 pelo editor Goldsmith, de
Edimburgo. A carta foi objeto de referência de Oliveira Lima, em conferência que
proferiu em Londres, na Real Sociedade de Geografia, no ano de 1911. Revelou aquela
correspondência um episódio importante. Durante a passagem pela ilha da
Madeira, cristãos-novos pediram ao comandante, Martim Afonso, para embarcar e
vir para a Colônia, com suas mulheres e filhos menores, o que não lhes foi
permitido, haja vista a alegação de não haver mulheres nem crianças na
tripulação, dados os objetivos da expedição.
Portanto, a
conclusão que se obtém é que, até o tempo da passagem de Martim Afonso pela Feitoria
que lhe outorgou El Rei, depois Capitania de São Vicente, a primeira em terras
do Brasil, o pavor do novo mundo desautorizava a vinda de mulheres para cá, o
que somente veio a ocorrer anos depois, trazidas do reino e das ilhas da
Madeira e dos Açores, conforme noticiam os registros das sesmarias. Inclusive,
se facilitou para que colonos aqui já localizados trouxessem suas mulheres e
filhos.
Essa informação
se agasalha nas informações do livro Memórias da Capitania de S. Vicente (1707),
do beneditino Gaspar da Madre de Deus. O padre se refere ao despacho lavrado no
mês de julho de 1538, no pedido feito pelo meirinho João Gonçalves, morador da
Vila de S. Vicente, dirigido ao padre Gonçalo Monteiro, que era o lugar-tenente
da Capitania e vigário da Vila recém-fundada. João Gonçalves pedia uma sesmaria
em Iripiranga, com o propósito de plantar, alegando ser casado, com mulher e filho, morador em toda a dita terra, passa de um
ano... Teria sido o primeiro homem que veio povoar, estabelecido com mulher e filho, por mais de ano anterior
à data daquele despacho, conforme os registros respectivos.
Em face das primeiras
notícias relativas ao Brasil, até a chegada de Martim Afonso; da fundação da
Capitania de São Vicente e a vinda posterior de casais e de mulheres para a colônia;
e das anotações de Gaspar da Madre de Deus, dissiparam-se as dúvidas. A primeira
mulher branca que se tem notícia na colônia, no ano de 1536, se chamou Maria da
Silva. Era esposa, dera um filho e fora referência do colono João Gonçalves.
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