15/02/2019




MACAÍBA E PARNAMIRIM: CIDADES DOS MIGRANTES

Valério Mesquita*

Marcadamente, desde o século XIX, Macaíba, antes Coité, recebeu caudalosas correntes migratórias de dois pólos emissores do Nordeste: Paraíba e Pernambuco. Recentemente a TV Globo esteve lá e em Parnamirim a fim de pesquisar e registrar esse fenômeno que ocorre na área metropolitana de Natal. O fato de chegar a preocupar uma emissora desse porte ao ponto de incluir no “JN no Ar” os dois municípios no nível de uma investigação social reveste-se se singular importância: saber a razão e o porquê do que está atraindo brasileiros de outras regiões para cá. A reportagem apurou que hoje, nas “vizinhanças de Natal condomínios brotam mais rápido do que o mandacaru no sertão”.
Vê-se que a expansão imobiliária é um dos motivos para isso, somado a estatística de que, nos arredores de Natal, quatro cidades recebem em média vinte e oito novos moradores por dia. Investimentos públicos e privados têm abastecido a locomotiva de aumento da população. Até a indústria petrolífera, segundo a reportagem global, que gera trinta e sete mil empregos no estado, muitos escolhem as proximidades da capital para residir, apesar do engarrafamento do transito e a superpopulação da região metropolitana. Macaíba – vocacionada há dois séculos para o comércio e a indústria – as ruas centrais mais parecem um “mercado persa” ou uma Babilônia de transeuntes, automóveis e motos. As residências que conheci em um passado recente, foram transformadas em pontos de comércio, até nas calçadas, impondo-se aí a descaracterização física de sessenta, cinquenta anos atrás.
Quando visito a minha terra eu não me revejo mais. O “capitalismo” emergente transformou-a numa legião estrangeira. Ninguém conhece ninguém. São raras as fisionomias e olhos que refletem a cidade que vivi. Daí me preocupar com a preservação de sua memória histórica para que não venha perder a sua identidade. Todavia, entendo que é o preço alto da proximidade das cidades com a capital. Progresso desgovernado. Tudo começou, assinaladamente, com Fabrício Gomes Pedroza, fundador da cidade de Macaíba, em 27 de outubro de 1877. Antes, se chamava Coité (outra palmeira). Era o reduto da aristocracia rural fincada pelo coronel Estevão Moura no Engenho do Ferreiro Torto. Ocorreu aí o choque inevitável da atividade comercial chantada pelo pernambucano Fabrício no monte dos Guarapes e o latifúndio rural dos Moura que abrangia São Gonçalo e Macaíba.  Comércio levou a melhor. Estava decretada a sua vocação econômica.
Daí para frente, todas famílias que escreveram a sua história na vida municipal, os pioneiros vieram da Paraíba e de Pernambuco. Os Albuquerque Maranhão, os Castriciano de Souza, os Freire, os Mesquita, os Tavares de Lyra, os Chaves, os Garcia, os Maciel, os Alecrim, os Leiros, os Curcio, os Meira Lima, os Andrade e por aí, centenas delas que ingressaram na lide comercial, industrial, cultural, política e jurídica. Todos os macaibenses que se tornaram ilustres depois provieram dessas origens migratórias patriarcais. No século XX, da segunda metade em diante, dezenas de macaibenses originários dos citados troncos hereditários, igualmente geraram filhos ilustres, principalmente, no ramo do comércio. Até na política, Macaíba é um eldorado de correntes migratórias. Quem souber, pode, de per si, declinar quantos prefeitos e vereadores oriundos de outras plagas já comandaram o poder público local, o que reflete o caráter volúvel e também migratório do seu eleitorado.
(*) Escritor.

11/02/2019



Tem, mas tá faltando
Vivemos – ou viveremos nos próximos meses – tempos de reformas do Brasil: a reforma da previdência, o “projeto Moro” de combate à criminalidade, uma possível reforma tributária, a recorrente reforma política e por aí vai.
Essas reformas aí são mais que urgentes, concordo plenamente.
Mas será devemos reformar tanto o nosso direito? Será que devemos reformá-lo como um todo? Será que nos falta tudo?
Outro dia, conversando com um grupo de ex-alunos, com o qual topei por acaso, fiquei quase convencido de que este é o sentimento geral. E me bateu uma tristeza, sobretudo porque esse sentimento de insatisfação com a Justiça era dirigido especialmente ao nosso Supremo Tribunal Federal, órgão mais importante e vitrine do nosso aparelho judicial.
A opinião era quase unânime. Por exemplo, uma aluna, muito jovem e bela, me disse, na lata: “professor, no STF falta tudo. Falta, de logo, estabilidade. E um direito estável é salutar para qualquer país. A instabilidade, com regras jurídicas constantemente reformuladas e aplicadas de maneira inconsistente, prejudica muito a confiabilidade no nosso sistema. Infelizmente, a instabilidade do direito parece já fazer parte da tradição brasileira, sofrendo o nosso sistema jurídico, e o nosso STF num grau altíssimo, desse problema”. Calado estava, mudo fiquei.
“Por isso”, disse outra aluna, já não tão jovem, contudo ainda mais bonita, “falta previsibilidade. Essa instabilidade de entendimento, em casos semelhantes, torna simplesmente imprevisível qual será a solução aplicada à mesma situação se vier acontecer novamente alguma querela judicial. Os indivíduos e as pessoas jurídicas não conseguem assim ordenar suas condutas e seus negócios, e os advogados, em sendo o caso, não podem antecipadamente aconselhar seus clientes, pois não há uma previsão segura de como as questões serão resolvidas judicialmente”. Calei-me duplamente.
“E falta até mesmo igualdade, professor. A igualdade perante a lei deve implicar igualdade na interpretação e aplicação dessa mesma lei. Mas a jurisprudência do nosso STF é cheia de distinções ilógicas, para dizer o mínimo. Nada mais justo que casos semelhantes sejam resolvidos de modo semelhante; ao revés, nada mais injusto que esses casos (semelhantes) sejam decididos, arbitrariamente, de modos diversos. Dar e garantir decisões semelhantes para casos semelhantes, de sorte a evitar qualquer desigualdade arbitrária em prejuízo do jurisdicionado e da própria administração da justiça, é uma das principais obrigações daquele que foi alçado a guardião da Constituição”. Foi mais ou menos o que disse um dos rapazes, inteligentemente, criando coragem em cima do meu silêncio eloquente.
“Aliás, relacionado à igualdade, temos a questão da celeridade. O acesso rápido à justiça é um norte perseguido pelo direito hoje em dia. Basta consultar a Constituição e as mais recentes leis processuais para constatar isso. Considerando tanto a ótica do jurisdicionado como da própria administração da Justiça, num processo civil ou penal de resultados, não haverá um verdadeiro acesso à justiça se a prestação jurisdicional for dada tardiamente. Para o bem desse jurisdicionado e do próprio Estado, o processo deve encerrar-se o mais rapidamente possível. O problema, no STF, é que, para alguns, essa celeridade não falta. Mas, para a grande maioria, o que abunda é a morosidade”. Foi assim que voltou à carga, com um olhar que dizia mais do que devia, a mais bela do grupo. Me fiz de doido.
“Isso sem falar na pomposidade do STF, professor. Com cada um ali querendo vaidosamente ‘legislar’ mais do que o outro, acaba faltando precisão e simplicidade às decisões do Tribunal. Substitui-se indevidamente o legislador. Perde-se o prêmio que é dar um passo da generalidade da lei em direção à concretude da vida. Perde-se a oportunidade de criar um princípio nascido de um caso concreto, com alto grau de precisão no regramento dos fatos e dos negócios da vida das pessoas. Com a mistura de papéis, tudo se torna muito complexo. E, hoje em dia, não se enxerga, naqueles que estão ali, qualquer intenção de minimizar essa falta de, digamos, transparência”, disse o mais gaiato da turma, de modo empolado, imitando um dos ministros do que ele chamou, cheio de ironia, de Pretório Excelso. Foi uma gargalhada geral. Eu apenas sorri discretamente.
Bom, eu quis muito defender o nosso direito e o nosso Supremo Tribunal Federal. De críticas infundadas, de reformas desnecessárias. Quis dizer que possuímos isso e que temos aquilo. Mas, por alguma razão, senti-me intimidado. Não sei bem dizer o que foi. A beleza, às vezes, causa essas coisas. A juventude aguerrida também. Mas talvez eu tenha apenas ficado com medo de receber um “tem, mas tá faltando”.
Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP

10/02/2019


O VELHO ATHENEU: LEMBRANÇA QUE O TEMPO NÃO DESFEZ 

Valério Mesquita* Mesquita.valerio@gmail.com 

     Naquele tempo, o nosso mundo começava no Atheneu, um nome bonito, sonoro, poético. Era o tempo da felicidade na sua forma mais simples; dos primeiros alumbramentos; dos gestos inaugurais dos amores clandestinos.

     Falar sobre o Atheneu dos idos 50 e 60 é caminhar numa procissão de relembranças. "Seu Babau, quantas declinações existem no Latim". "Sei não, professor". "Sente, zero. Nominativo, genitivo, dativo, acusativo, vocativo e ablativo". 

     Era o Cônego Luiz Wanderley arguindo Raimundo Torquato, apelidado de Babu mas o padre declinava no acusativo: "Babau". Vascaíno fanático, havia um jeito da turma se livrar da terrível chamada oral de latim da segunda-feira: elogiar o Vasco e comentar a sua vitória. No caso de derrota: "delenda est Babau!". 

      Sem nenhum demérito aos atuais mestres do Atheneu norte-rio-grandense de hoje, mas será que o tempo poderia restituir essa seleção de ouro? 

   Floriano Cavalcante (que ensinava história proferindo discurso); Protásio Melo (que nos influenciou o interesse pelos autores ingleses e americanos); Esmeraldo Siqueira professor de francês (com o seu indefectível charuto, cuja fumaça desenhava no ar os perfis de Hugo, de Daudet, de Vigny, de Balzac, de Gide, etc); Álvaro Tavares (modesto, simples, erudito); Cônego Luiz Wanderley (grande orador sacro e latinista), para citar aqueles que nos ensinavam diretamente. 

     Nesse universo perdido havia outras figuras inesquecíveis que não travaram contato conosco mas povoaram a mesma amorável galáxia que vai ficar na memória e na moldura do século que terminou.

     Mensurar o quanto a intelectualidade do Rio Grande do Norte deve ao Atheneu é uma tarefa impossível. Desde o tempo do inexcedível Professor Celestino Pimentel, de Alvamar Furtado (o Clark Gable dessa Hollywood Potiguar), Câmara Cascudo (o mais sedutor dos mestres), e toda uma plêiade de professores quase todos absorvidos mais tarde pela Universidade Federal, nos faz deduzir que o Atheneu não foi, apenas, uma usina preparatória e educadora de gerações mas também de mestres que ajudaram a erigir o edifício de um novo tempo: uma instituição de ensino superior. 
     O velho Atheneu tem o dom da dimensão entre o efêmero e o eterno. Nele algo mais para se sentir do que para se dizer. 

     O Atheneu é a história de uma que se fez realidade. Concebido pelo arrojo arquitetônico extra época, insignes diretores deram vida e estabilidade definitivas ao idealismo renovador do ex-governador Sylvio Piza Pedroza. "Ver bem não é ver tudo, é ver os que os outros não vêem". 
     Nessa frase perfeita de José Américo, Sylvio Pedroza, quem sabe não estaria enxergando longe o embrião da futura Universidade? 

    Só sei que o tempo respeitou o que nele construiu para depois os próprios mestres, ao longo do tempo, se encarregarem da materialização do seu sonho. Isso porque, é na própria criação que o homem faz descobertas. 

    O mestre Protásio Melo que teve uma vida inteira consagrada ao ensino de gerações, hoje nada "tendo nas mãos que foram pródigas", não viu a hora do silêncio e nem se calou. Abriu as asas de sua pesquisa sobre a história do Atheneu, a história de todos nós. 

     E entardecia para que se pudesse resgatar esse acervo rico de humanismo e tradição. Protásio mesmo, que cresceu nas ervas de Walt Whytm para hoje, neste milênio, nos respingar da água benta de uma aurora, onde foi um dos protagonistas dos mistérios circundantes. 

(*) Escritor

06/02/2019

Sobre Maquiavel (IV)

No artigo da semana passada, embora eu tenha reconhecido o “lado sombrio” de Nicolau Maquiavel (1469-1527) e do seu “O Príncipe” (“Il Principe”, 1513), também afirmei que há muita incompreensão acerca desse grande florentino e, sem dúvida, um olhar mais acurado sobre sua obra e suas circunstâncias faz com que cheguemos a uma opinião mais favorável a respeito dele.
Além dos argumentos elencados na semana passada, milita em prol de Maquiavel o próprio desiderato da sua mais badalada obra. Antes de mais nada, “O Príncipe” deve ser visto mais como um receituário de conselhos de um amigo experiente, dados “ad hoc” aos governantes (no caso específico, ao príncipe Médici de sua amada Florença), do que propriamente um tratado de filosofia ou de ética política. Ademais, em vez de imaginar a sociedade e a administração do Estado como elas deveriam ser, Maquiavel preferiu mostrar como elas efetivamente são. A política é tratada não como um objeto de uma filosofia de viés moral ou ético, mas, unicamente, nos seus aspectos realistas e práticos. Maquiavel trabalha – sendo assim um dos seus “pais” – com o que hoje convencionamos chamar de “Realpolitik”.
Aliás, como lembra Cabral de Moncada (em “Filosofia do Direito e do Estado”, vol. 1, Arménio Amado Editor Sucessor, 1955), nos seus importantes “Discursos sobre a Primeira Década de Tito Lívio”, publicados entre 1512 e 1517, mas que são anteriores a “O Príncipe”, o “imoralismo” de Maquiavel “não atinge ainda a forma drástica, escandalosa, que alcançou nesse último [“O Príncipe”], apesar do juízo desfavorável aí proferido sobre o Cristianismo. Num outro escrito, embora talvez da mocidade, por outro lado, Maquiavelli dá-nos uma ética totalmente diferente em que respira ainda um espírito religioso cristão e medieval. E ainda até no próprio II Principe é preciso não esquecer que não faltam também passagens em que o verdadeiro juízo moral fica suspenso, não se aplicando ele, por se suporem os homens maus, mas deixando adivinhar um diferente critério de valor a aplicar se eles fossem bons”.
Outro ponto que deve ser ressaltado em favor de Maquiavel é a sua originalidade.
É claro que a aplicação prática da ideia da “raison d'État” (“razão de Estado”) antecede a Maquiavel. E mesmo a sua problemática, sob o ponto de vista teórico, já havia preocupado os antigos. Mas em muitos aspectos Maquiavel se diferenciou dos pensadores que antecederam a ele – Platão (427-347 a.C.), Aristóteles (384-322 a.C.), Cícero (106-43 a.C.), os escolásticos e por aí vai.
Em primeiro lugar, Maquiavel é, sob certo sentido, a antítese do “homo theoreticus” (“homem teórico”), assim distanciando-se da filosofia das épocas precedentes. Como anota Cabral de Moncada (em “Filosofia do Direito e do Estado”, vol. 1, Arménio Amado Editor Sucessor, 1955), “enquanto que os escolásticos e os maiores filósofos gregos se moviam, primeiro que tudo, no campo da especulação teórica, para daí baixarem depois ao campo das realidades imediatas, o grande político da Renascença desconhece por completo o primeiro; só o segundo lhe fornece a base para todas as suas construções da vontade e da inteligência”. Numa sentença, o pensar de Maquiavel “é um pensar em função da vida”.
Sem dúvida, Maquiavel também fundou um método novo na ciência política, alicerçando esta na experiência – na sua própria experiência, sobretudo – e na história, antiga e recente. Viviam-se tempos turbulentos, que haviam abalado a fé da comunidade cristã. As nacionalidades modernas surgiam, com tudo que representaram para a história. Maquiavel olhou tudo isso pelo prisma não da filosofia, mas da história, pondo mais umas pitadas do naturalismo, do individualismo e do humanismo que marcaram o Renascimento.
O próprio estilo usado pelo autor em seu “O Príncipe” – em total oposição à denominada “moralidade cristã”, espirituoso, cínico ao extremo e revelador – mostrou-se também inovador. E se aquilo que descreveu já era de conhecimento das classes dominantes, Maquiavel, com o seu estilo e com o seu sucesso, fez com que esse “segredo” finalmente atingisse uma audiência muitíssimo mais ampla.
E, de fato, talvez esteja aqui a grande sacada de Maquiavel: a “originalidade do escândalo” de ensinar “ex professo” coisas que, embora corriqueiramente praticadas, eram, até então, inconfessáveis. Nas palavras de Cabral de Moncada, a originalidade de “dizer em voz alta aquilo que todos, ou antes, muitos, particularmente os príncipes, diziam já em voz baixa e, mais que diziam, praticavam. Com ele, o aspecto político dos problemas sociais do Homem passou adiante do aspecto jurídico mais abstracto desses problemas A vida pôs à consciência e à ética cristãs problemas novos que estas até aí tinham sempre procurado iludir”. Maquiavel e seu “O Príncipe” foram, realmente, e talvez demasiadamente, um escândalo.
Por derradeiro, há a própria questão do seu legado. Gostemos ou não, Maquiavel merece um importantíssimo lugar na história. Os críticos de Maquiavel, é verdade, vêm de todos os lados da filosofia e da política. Termos como “maquiavélico” e “maquiavelismo” são hoje de uso comum, aplicados, de modo pejorativo, em desfavor de pessoas (os políticos, sobretudo) tidas como falsas ou manipuladoras. Mas sua importância para o pensamento político foi e é enorme. Não só na Renascença, com sua ênfase no humanismo ao invés da religião. Continuou pela história da civilização. Basta lembrar, como fazem os autores de “O livro da política” (publicado pela Editora Globo em 2013), que “O Príncipe” foi bastante “influente nos séculos que seguiram a morte de Maquiavel, em especial entre líderes como Henrique VIII, da Inglaterra, Carlos V, do Sacro Império Romano, Oliver Cromwell e Napoleão, e o livro foi reconhecido como inspiração por figuras tão díspares como o teórico marxista Antônio Gramsci e o ditador fascista Benito Mussolini”.
E, claro, como “maquiavélicos”, eu poderia citar vários nomes do cenário político atual, todos vivíssimos. Mas deixa para lá. Já terminando este riscado, não quero mais causar problemas para a minha já não tão bela figura.
Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP

FINANÇAS PÚBLICAS
Carlos Roberto de Miranda Gomes, advogado

            Nos meus quase 80 anos de existência, dispensado de encargos obrigatórios, dei-me a passear pelos jornais, noticiários, leitura de livros que o tempo não permitia fazer tão constantemente nos dias de atividade profissional.
            Nesse devaneio delicioso tenho a oportunidade de encontrar coisas que me encantam e conduzem a tempos pretéritos, tanto de assuntos amenos quanto daqueles mais importantes para o desempenho da vida.
            Refiro-me, por simples exemplo, às crônicas diárias do nosso Vicente Serejo no jornal AGORA, que hoje foi demais ao confessar a sua atração por Diana Palmer, a companheira do Fantasma, de quem, com menor fervor, também me tirou algumas noites de sono. Igualmente quando os assuntos são mais severos, como o alvissareiro artigo de Ricart César Coelho dos Santos, Procurador de Contas (TN), como foi a minha dedicação num passado recente.
            A sua intenção foi despertar a necessidade de se estudar finanças públicas, seja pelos governantes, dirigentes, estudiosos do Direito e a própria população, haja vista o descortínio que dá para melhor compreender as coisas no campo dos ganhos, dos gastos e do equilíbrio orçamentário.
            Quando ingressei na UFRN fui destinado ao ensino de Direito Financeiro e Direito Tributário, que então já possuíam expoentes da docência nas pessoas do Ministro Romildo Gurgel e do grande advogado Edgard Smith Filho, este pioneiro nas lides da Procuradoria de Contas do nosso TCE-RN. No meu tempo de Faculdade de Direito a disciplina oferecida era Ciência das Finanças.
            Com o passar do tempo os substituí nas cátedras, juntamente com o meu amigo-irmão Adilson Gurgel de Castro, com quem dividi alguns trabalhos didáticos.
            Sobre a matéria editei livros pertinentes, publicados em edições sucessivas, por editoras locais, mas também pela Saraiva e pela Brasília Jurídica, com grande aceitação.
            Ao deixar as atividades funcional e docente, insisti por alguns anos, no ensino em cursos sobre Gestão Pública e, indiretamente, influir na elaboração dos currículos dos cursos de Direito para que as referidas disciplinas fossem cada vez mais enfatizadas pela sua importância para o cotidiano do processo de condução das atividades vitais dos Entes Públicos.
            Esse desiderato o fiz até 2017, em caráter privado, sempre com a entrega de instruções escritas, notadamente da Lei de Responsabilidade Fiscal, que ainda considero um oásis na vida financeira do País, dos Estados e Municípios, carecendo de alguns ajustes, antes que alguns legisladores despreparados cavem a sua sepultura.
            Hoje, por força da idade, parece que fiquei desacreditado, pois neste nosso Brasil a experiência é um conflito com as necessidades públicas, daí o meu entusiasmo pelo que disse o jovem Ricart, na direção do mesmo discurso que custou mais de 40 anos de uma luta nas salas de aula, mas que gerou, graças a Deus, muitos continuadores – alguns até Ministros de Tribunais Superiores, o que nos dá a sensação do dever cumprido.
            Mesmo afastado das discussões temáticas, continuo estudando, atualizando o que aprendi e pronto para dialogar com quem tiver interesse de aceitar a experiência de um vetusto professor de assuntos de finanças públicas, sem interesse de remuneração.
            Alegra-me muito que ainda existam estudiosos do Direito preocupados com assuntos de tanta importância.

03/02/2019

O GARÇOM VIVAZ
BERILO DE CASTRO


Um dos meus poucos lugares escolhidos e esporadicamente usados para um bom papo, regado a uma cervejinha bem gelada ou um bom uísque, é a Peixada do Chorão. Situada no início da praia de Areia Preta, hoje nominada de Peixada do Velho Chora.
Lugar de um bom atendimento, com um apetitoso cardápio, tendo como carro-chefe o  fresquinho e irresistível peixe cozido, o Galo do Alto com pirão de arrebentar o juízo e o botão da camisa do freguês.
Vou encontrar também bons e admiráveis amigos para desopilar do dia a dia  movimentado e fatigante.
Sentado na sua mesa preferida, vou me juntar ao  estimado colega Armando Negreiros, anestesista, escritor e imortal. Um bom contador de causos; apreciador-mor do irresistível caldo de ostra com três ovos de codorna. Diz ele que fortifica até a medula do corpo cavernoso.
Os temas das resenhas são os mais variados: futebol, música, política, literatura: comentários sobre as boas crônicas de J. R.Guzzo, na última página da revista Veja.
Somos bem e alegremente servidos por um descontraído e vivaz garçom, o Tio César, assim chamado pelos seus sobrinhos administradores da Peixada. Que bom, tudo em família.
Tio César  é protagonista de histórias super-hilariantes, algumas já contadas por Armando.
Vejamos:
Certa vez foi abordado por um cliente que perguntou:
— Garçom, tem vinho seco?
— Tem,  sim, senhor!
— Me traga um!
Volta César com uma garrafa seca de vinho e diz:
— Pronto,  senhor,  tá aqui o vinho seco!
Uma outra vez, entra um cliente e pergunta:
— Garçom, aqui tem Wi-Fi?
— Não, doutor, só tem Black & White, Chivas e Old Parr!
Perguntado se a Stela (cerveja) já tinha chegado, responde:
— Quem chegou e está na cozinha é Margarida!
Quando seca um litro de uísque Old Parr, pede ao sobrinho Chorãozinho para ficar com o garrafa e levar para suas esbórnias, quando enche de uísque reeira para beber com as namoradas na praia da Redinha, momento em  que é tratado como “meu amorzinho rico, Cezinha.”. E pegue o falso Old Parr com ginga frita até o nascer do sol, arrodeado de gatinhas.

Berilo de Castro – Médico e Escritor –  berilodecastro@hotmail.com.br
As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores

01/02/2019



ELACIR, 80

 Por: BERILO DE CASTRO

Elacir Freitas da Rocha nasceu em Natal, no dia 25 de janeiro de 1939. Filho de Ormando Nobre da Rocha e Maria de Lourdes Freitas da Rocha.
Eu o conheci no final da década de 1950, quando residia na localidade do Baldo, na divisa dos bairros do Alecrim com o Centro da cidade. Nesta época e na mesma região, já prestava assessoria administrativa no Posto de gasolina São José, de propriedade do seu Ormando; ofício que lhe rendeu a prática de lidar com rapidez e muita precisão com o manuseio do  dinheiro.
Nos finais de semana, tinha a missão esportiva amadora de defender com muita pompa o gol da equipe do Real Madrid  do Baldo, usando o seu invejável uniforme negro, só usado pelo melhor goleiro do mundo — Lev Yashin, o Aranha Negra (1929-1990), da seleção Russa. Atuou também em vários outros times de várzeas, participando de jogos pelo interior do Estado.
Na era do Estádio Juvenal Lamartine (JL), no ano de 1955, teve uma rápida passagem pela equipe rubro-negra do Clube Atlético Potiguar (CAP), do nosso querido e imortal presidente João Machado, de Brígido Ferreira, do treinador Coqueiro, do seu auxiliar Arlindo e do boxeador/massagista Kid Passo.
No final da década de 1950, quando o Futebol de Salão (hoje Futsal) chegou empolgando a cidade, Elacir reaparece defendendo com destaque o gol do bom time do ABC, onde conseguiu levantar dois títulos.
Aposentado do futebol de salão, integrou-se definitivamente ao nosso grupo de peladeiros, chegando a participar por mais de 50 anos da nossa parceria recreativa nas tardes dos sábados. Chegando a impressionar nas suas últimas participações, com belíssimas, empolgantes e arrojadas defesas, quando já passava dos seus 70 anos.
Em 1973, já casado com Maria da Conceição de Araújo Rocha e com 4 filhos pequenos, foi diplomado em Direito pela UFRN.
No ano de 1975, assumiu o cargo de Auditor Fiscal do Ministério do Trabalho, onde permaneceu até a sua aposentaria como Delegado do Trabalho da Região.
Hoje, 27 de janeiro do ano de 2019, domingo de belo verão, reúne os seus fraternos amigos, os seus queridos familiares para comemorar os seus 80 anos de vida. Uma dádiva, uma história vencedora, de muito brilho, de muita união e muito amor.
Que a BÊNÇÃO e a PAZ do Senhor continuem a iluminar e a guiar a sua tão bonita e rica trajetória de vida.
PARABÉNS, AMIGO ELÁ!