Para se esparramar, poltrona
Texto Gustavo Sobral e ilustração de Arthur Seabra
Sua diferença para a cadeira é a de ter braços. Então se pode dizer
que a cadeira é uma poltrona maneta. Mas não é só. A cadeira serve muito
mais ao uso na mesa de refeições, para a escrivaninha ou mesa de
trabalho. Já a poltrona, ah, a poltrona!, com licença, é como aquelas
senhoras sorridentes, matronas, uma mãezona. Geralmente acolchoada já
indica para que veio, sente-se e fique é o comando.
O conforto incita à permanência e demora, por isso, está no quarto,
ao lado de uma mesinha com abajur esperando um leitor; ou a avó que vai
bordar; e até a mãe que vai amamentar o filho. Pode estar na sala de
visitas, esperando justamente elas, as visitas.
Conta que de tão confortáveis já teve sujeito que puxou ronco e
cochilo em suas dependências reconfortantes. E que um dia um fotógrafo
necessitado de repousou outra encomenda a Sérgio Rodrigues, arquiteto
brasileiro: quero uma poltrona para me esparramar!
Sérgio, que tinha loja na General Osório (praça em Ipanema, Rio de
Janeiro, Brasil), fez então uma poltrona com os seus instrumentos de
trabalho prancheta, régua e lápis, uma borrachada aqui, outra acolá. Do
papel, levou para a fabricação em madeira e couro a que se julga (peça
premiada, se adianta, e em museu em Nova Iorque, o de arte moderna) a
coisa mais confortável para se reclinar. Na verdade, para cumprir
totalmente o propósito de se esparrar sem inibições.
Eis então a famosa, afamada, falada, sentada, disputada, colecionada,
sonho de consumo, Poltrona Mole. E como não poderia deixar de ser, nada
de capítulo à parte, uma banqueta no mesmo material e estilo para que
possam os pés cansados se refastelarem de conforto. Assim, a Mole ficou
conjugada para sempre escrevendo o maior capítulo do mobiliário
brasileiro, aquele que se dedica totalmente ao conforto de esparramar,
que, sem sombra de dúvidas, é muito melhor do que sentar.
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