30/04/2018


Para se esparramar, poltrona


Texto Gustavo Sobral e ilustração de Arthur Seabra

Sua diferença para a cadeira é a de ter braços. Então se pode dizer que a cadeira é uma poltrona maneta. Mas não é só. A cadeira serve muito mais ao uso na mesa de refeições, para a escrivaninha ou mesa de trabalho.  Já a poltrona, ah, a poltrona!, com licença, é como aquelas senhoras sorridentes, matronas, uma mãezona. Geralmente acolchoada já indica para que veio, sente-se e fique é o comando. 

O conforto incita à permanência e demora, por isso, está no quarto, ao lado de uma mesinha com abajur esperando um leitor; ou a avó que vai bordar; e até a mãe que vai amamentar o filho.  Pode estar na sala de visitas, esperando justamente elas, as visitas.

Conta que de tão confortáveis já teve sujeito que puxou ronco e cochilo em suas dependências reconfortantes. E que um dia um fotógrafo necessitado de repousou outra encomenda a Sérgio Rodrigues, arquiteto brasileiro: quero uma poltrona para me esparramar!

Sérgio, que tinha loja na General Osório (praça em Ipanema, Rio de Janeiro, Brasil), fez então uma poltrona com os seus instrumentos de trabalho prancheta, régua e lápis, uma borrachada aqui, outra acolá. Do papel, levou para a fabricação em madeira e couro a que se julga (peça premiada, se adianta, e em museu em Nova Iorque, o de arte moderna) a coisa mais confortável para se reclinar.  Na verdade, para cumprir totalmente o propósito de se esparrar sem inibições.


Eis então a famosa, afamada, falada, sentada, disputada, colecionada, sonho de consumo, Poltrona Mole. E como não poderia deixar de ser, nada de capítulo à parte, uma banqueta no mesmo material e estilo  para que possam os pés cansados se refastelarem de conforto. Assim, a Mole ficou conjugada para sempre escrevendo o maior capítulo do mobiliário brasileiro, aquele que se dedica totalmente ao conforto de esparramar, que, sem sombra de dúvidas, é muito melhor do que sentar.

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