A maior do mundo
Tudo na cidade de Dubai é gigante: a ilha artificial em forma de
palmeira, um hotel que se diz sete estrelas e por aí vai. Quase tudo que
é – ou se diz – o “maior do mundo” está em Dubai: o mais alto edifício
do mundo (o Burj Khalifa), o maior shopping center do mundo (o Dubai
Mall) e por aí também vai.
E olhem que, dos Emirados Árabes Unidos, federação/país do qual
também fazem parte Abu Dhabi, Sharjah, Ajman, Umm al-Quwain, Ras
al-Khaimah e Fujairah, o emirado de Dubai não é nem o maior, nem o mais
rico e nem o mais importante. Essa posição, para quem não sabe, cabe a
Abu Dhabi, cujo território corresponde a mais de 85% do que são os
Emirados Árabes Unidos. E é nesse território que está o petróleo. O
dinheiro, portanto. E muito.
Comparada à capital (dos Emirados Árabes Unidos) Abu Dhabi e mais
ainda se comparada a Istambul e às cidades da Índia, de onde tínhamos
acabado de chegar, achei Dubai “fake”. É essa a palavra mesmo. Tudo
muito grande, tudo muito limpo, tudo muito organizado, mas artificial.
Uma mistura de Miami e Las Vegas, só que muito mais cara. Excetuo aqui
os bairros de Deira e Bur Dubai, nos quais você pode encontrar a Dubai
histórica, do comércio com a Pérsia/Irã, com seu Creek (uma espécie de
canal/rio que separa os dois bairros antigos) e seus barcos e seus
velhos bazares, por onde deliciosamente nos perdemos. Em Deira, entre
outras coisas, visitamos o Gold Souq (ou Mercado do Ouro). Atravessamos o
Creek num minúsculo barquinho, chamado de “abra”, que faz as vezes de
táxi aquático. Já em Bur Dubai, antes de passearmos pelo microbairro
histórico “Bastakia Quarter”, jantamos no também histórico restaurante
Bait al Wankeel, às margens do Creek, cujo prédio, informa o meu guia
“Lonely planet: Dubai e Abu Dhabi”, “de 1935, foi escritório da marinha
mercante e é um dos mais antigos de Dubai (...)”. Um achado. Mas parece
que o turista médio não se perde por ali. Infelizmente.
Como não poderia deixar de ser, Dubai também tem – ou diz ter, já
que desconfio sobremaneira dessas afirmações – a “maior livraria do
mundo”. Localizada no Dubai Mall (não esqueçam: “o maior shopping center
do mundo”), chama-se “Books Kinokuniya Dubai” e faz parte de uma rede
de livrarias japonesas de mesmo nome. A maior rede de livrarias do
Japão, por sinal, com mais de oitenta lojas espalhadas por aquele país e
pelo mundo.
Segundo o site “Visite o Dubai”, do Departamento de Turismo desse
emirado, versão português de Portugal, “com uma coleção de mais de um
milhão de livros, a Kinokuniya é uma gigantesca livraria que ocupa 6317
metros quadrados no The Dubai Mall. Prateleiras e prateleiras oferecem
preciosidades de todos os gêneros, com obras em seis línguas diferentes.
Trabalhos impressos em Inglês, Árabe, Japonês, Alemão, Francês e Chinês
que proporcionam iluminação cultural à Baixa do Dubai. Para além disto,
existem eventos e workshops para os mais pequenos”.
Bom, estive lá e confirmo: muitíssimo bem localizada, em frente à
entrada da estação de metrô que fica dentro do Dubai Mall, a tal Books
Kinokuniya é realmente gigante (embora tenha sido ainda maior na sua
antiga localização no mesmo shopping). É muito bonita, naquela profusão
de cores que sempre me acalma (para não perder o costume, tirei um
bocado de fotos). É mais organizada ainda, com quase tudo no lugar. Os
vendedores são muito prestativos, talvez até demais, já que nada melhor
do que garimpar livros, sem ajuda, por prateleiras sem fim. O acervo, já
dá para intuir, é enorme, variado e excelente. Tem de quase tudo, entre
livros, revistas e outras bugigangas relacionadas ao estudo e à
leitura. Eu mesmo comprei duas preciosidades livrescas: uma intitulada
“Novel Destinations: Literaty Landmarks from Jane Austen's Bath to
Ernest Hemingway's Key West” (escrito por Shannon Mckenna Schmidt e Joni
Rendon e publicado pela National Geographic Society, 2009); a outra,
“Modern Book Collecting” (autoria de Robert A. Wilson e publicado pela
Skyhorse Publishing, 2010).
Mas vai aqui o grande defeito dessa excelente livraria: tudo lá é
muito caro, como de praxe em Dubai. E não estou aqui comparando com a
Índia, de onde tínhamos acabado de chegar. Comparo com os livros novos
em dólar ou euro, que achamos nos comércios de livros americanos ou
europeus. Para se ter uma ideia, na Books Kinokuniya Dubai, nos livros
editados no EUA e na Europa, por cima do tradicional preço da
contracapa, é sempre posta uma nova etiqueta, com novo código de barras e
preço, desta vez em Dirham, a moeda dos Emirados Árabes Unidos. E
convertendo de volta para o dólar, o euro ou mesmo para o real, fica
sempre muito mais caro.
Injustamente tido por amarrado – me reconheço econômico, apenas –,
eu comprei aqueles livros com dó. Somente porque eles eram muito do meu
agrado – afinal, tem coisa melhor do que fazer turismo literário e
colecionar livros? – e não os tinha jamais visto ou mesmo deles ouvido
falar. Não me arrependo, claro. Mas que doeu na alma do bolso, doeu.
Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP
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