01/02/2017

   
Marcelo Alves

 


Sobre “O julgamento de Nuremberg” (I)

Os famosos “julgamentos de Nuremberg”, decorrentes dos horrores acontecidos na 2ª Guerra Mundial, começaram em 20 de novembro de 1945 e oficialmente terminaram em 13 de abril de 1949. Neles, os nazistas foram indiciados como criminosos de guerra e suas atrocidades foram categorizadas como crimes contra humanidade. 

A ideia – por sinal bastante louvável em termos civilizatórios – era que a de que, com esses julgamentos, diferentemente dos tempos de César (100a.C.-44a.C.) ou mesmo de Napoleão (1769-1821), os nazistas seriam severamente punidos, mas de uma maneira digna, que serviria de exemplo para a posteridade. 

Ademais, como anota Paul Roland (em “The Nuremberg Trials: the Nazis and their Crimes against Humanity”, Arcturus Publishing, 2010): “Os julgamentos não fizeram do mundo um lugar mais seguro, nem eles erradicaram a injustiça, a perseguição religiosa e racial, a escravidão, a tortura e o genocídio. Entretanto, os julgamentos de Nuremberg estabeleceram um precedente no sentido da punição dos responsáveis por crimes que a comunidade internacional considera intoleráveis – onde e por quem quer que eles tenham sido cometidos. Depois de Nuremberg, nenhum chefe de Estado pode alegar estar acima do direito e indivíduos não podem mais evadir-se de suas responsabilidades escondendo-se atrás da impessoalidade da administração à qual serviram. A limpeza étnica, a guerra selvagem e os responsáveis por esses males/crimes são agora puníveis sob o direito internacional. Nós agora temos claros códigos de conduta onde uma vez havia incerteza e ambiguidade. Militares não podem mais alegar que foram forçados a cometer crimes sob coação, nem podem se fiar na [antes tão comum] tese de que foram simplesmente obrigados a cumprir ordens superiores”. 

O principal julgamento em Nuremberg, certamente o mais badalado deles, teve fim em 1º de outubro de 1946 e concentrou-se na suposta cúpula do regime nazista. Vinte e quatro líderes foram indiciados/denunciados, vinte e um réus acabaram sendo ali julgados, gente como Hermman Goering (1893-1946), Ruldof Hess (1894-1987), Joaquim von Ribbentrop (1893-1946), Alfred Rosenberg (1893-1946), Albert Speer (1905-1981) e Franz von Papen (1879-1969), que dispensam apresentações, e até militares como Erich Raeder (1876-1960), Wilhelm Keitel (1882-1946), Alfred Jodl (1890-1946) e Karl Dönitz (1891-1980). 

Embora tenha sido apenas nesse primeiro julgamento que as quatro grandes potências aliadas (Estados Unidos da América, Reino Unido, França e União Soviética) estiveram oficialmente representadas com seus respectivos julgadores, o julgamento dos principais criminosos de guerra nazistas não foi o único julgamento [de nazistas] acontecido em Nuremberg no período pós-guerra. Subsequentemente, a partir de 9 de dezembro de 1946, foram levados a cabo, pelos americanos, mais doze julgamentos de criminosos de guerra nazistas de suposta menor relevância. 

Como registra o já referido Paul Roland: “Pouco depois do fim do julgamento principal, doze outros julgamentos foram levados a cabo pelos americanos. Eles tiveram lugar no Palácio de Justiça de Nuremberg porque esta cidade estava na zona americana de ocupação. Como resultado, eles ficaram conhecidos como os ‘julgamentos subsequentes de Nuremberg'”. E mais: “Embora esses julgamentos tenham capturado as manchetes dos jornais, eles não foram menos significantes, uma vez que eles revelaram a mentalidade assassina dos nazistas de escalão inferior. O fato de eles terem sido levados a cabo também demonstra que os aliados estavam dispostos a fazer justiça às vítimas dos nazistas, mesmo que a imprensa e o público já estivessem cansados das histórias de atrocidades nazistas”. 

Um deles foi o “julgamento dos juízes”, em que, embora não fossem eles as maiores autoridades do sistema de justiça nazista (estas estavam já falecidas), nove membros do Ministério da Justiça do Reich e sete membros de tribunais do povo e de tribunais especiais foram acusados de abusar dos seus poderes de promotores e juízes para cometer crimes de guerra e crimes contra a humanidade, fomentando e autorizando a perseguição racial e horrendas práticas de eugenia, entre outras coisas, levando à prisão e à morte inúmeros inocentes. O julgamento durou de 5 de março a 4 de dezembro de 1947. Dez dos acusados foram condenados, quatro absolvidos e dois acabaram não julgados. 

Esse julgamento – na verdade, uma parte dele, e mesmo assim com muita liberdade, já que estamos falando de ficção – foi dramatizado no filme “O julgamento de Nuremberg” (“Judgment at Nuremberg”), de 1961, com direção de Stanley Kramer (1913-2001, o mesmo diretor de “O vento será a tua herança”, filme sobre o qual já escrevi aqui). 

E é precisamente sobre esse maravilhoso filme jurídico – protagonizado por gente do top de Spencer Tracy (1900-1967), Burt Lancaster (1913-1994), Marlene Dietrich (1901-1992), Judy Garland (1922-1969), Montgomery Clift (1920-1966), Richard Widmark (1914-2008), Maximilian Schell (1930-2014), Werner Klemperer (1920-2000) e William Shatner (1931-), entre outros – que conversaremos na semana que vem. Rogo apenas um pouquinho de paciência. 


Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP

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