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30/03/2022
24/03/2022
O PARAÍSO PERDIDO
Valério Mesquita*
Mesquita.valerio@gmail.com
Aprendi nos
compêndios de geografia no Colégio Marista que “o Brasil é um país
essencialmente agrícola”. Essa teoria mudou radicalmente nesses últimos 60
anos. Principalmente no Nordeste, grande produtor de cana de açúcar, banana,
algodão, milho, feijão, mandioca, etc. Particularizando o Rio Grande do Norte,
podemos dizer, sem medo de errar, que o produtor rural está falido.
Quem faliu a
atividade agrícola? Ora, o Governo Federal, através dos seus próprios
instrumentos: o Ministério da Agricultura, os juros bancários e o calote das
usinas de açúcar aos produtores de cana.
O produtor rural é
hoje um refém permanente dos bancos oficiais. Além das dívidas padecem as
dúvidas do tempo, da ausência de uma política agrícola definida que objetive a
produtividade. Quem cair na arapuca do empréstimo agrícola em banco do governo
se arrisca a perder a propriedade. Nesses tempos alternativos, para sair do
buraco, ou o proprietário rural faz acordo com os sem terra para invadirem sua
propriedade, ou, quem tem nome/sobrenome arranja um gancho de um financiamento
a fundo perdido, tipo “reflorestamento”, que já salvou, pelo “ladrão”, muita
gente boa. O mais, ser produtor rural é padecer num paraíso perdido.
E a SUDENE?
Pergunta um idiota chapado. Evadiu-se nas vagas vazias e vadias da
incredibilidade, da inconsequência e da incompetência. Morreu de inanição sem
se aperceber que a próxima crise mundial será a da escassez de alimento. No Rio
Grande do Norte, se não fosse o programa do leite todos os produtores rurais,
sem exceção, já teriam se enforcado. Desde o Governo Sarney, quando foi extinto
o subsídio agrícola a atividade rural nesse país entrou em colapso. Na ANORC
(Associação Norte-Rio-Grandense de Criadores) ou fora dela, a maioria dos
agropecuaristas está vendendo o rebanho para pagar o banco. Para se viver
honestamente, tirar da terra o sustento, acreditar que somos essencialmente um
país agrícola, sem bandalheira, sem maracutaía, sem empréstimos dadivosos a
fundo perdido com o dinheiro do contribuinte, o que fazer? Só há dinheiro para
a atividade industrial urbana, fábricas, pólo-gás-sal, etc., e o campo vai se
esvaziando, se erodindo...
Dir-se-á que o país
todo se urbaniza e as propriedades rurais vão ficar mesmo para os sem-terras
que irão se decepcionar e constatar que o trabalho agrícola é mesmo uma
atividade marginal nesse país. Aí virá o Evangelho e Cristo dirá novamente:
“Naquele tempo...”. O Nordeste será a Galiléia.
(*) Escritor.
10/03/2022
RELEMBRANDO
TICIANO DUARTE
Valério
Mesquita*
Mesquita.valerio@gmail.com
Certos homens adquirem uma visibilidade
tão marcante em seu campo de atuação que se tornam imprescindíveis aos seus
contemporâneos, na medida em que suas opiniões e convicções passam a determinar
modos de ver e de interpretar os acontecimentos da vida social. É que aos olhos
deles nada daquilo que importa passa ao largo.
Assim vejo e identifico o meu primo-irmão
Ticiano Duarte. Desde a antiga Rua 13 de Maio, depois Princesa Isabel, quando o
conheci efetivamente e melhor, lá pelos idos de 1950. De 1954, em diante, fui
revê-lo na Rua Voluntários da Pátria, no 722, Cidade Alta, telefone 2901. Ele
era já expressão do “bate-papo” no Grande Ponto, seu fiel ancoradouro, onde se
tornara notário público e destemido navegante das ruas e avenidas da política
potiguar. Bacharel em Direito da Faculdade de Maceió, tornou-se decano do
jornalismo da imprensa potiguar, atividade da qual desfrutou de ilibada
notoriedade por sua isenção e imparcialidade nos juízos dos acontecimentos da
política. Seumemorialismo ganhava ritmo de crônica e embasamento de
historiador. Em seus escritos é possível intuir aquele saber de experiências,
traço que distingue o verdadeiro homem de visão de um mero prestidigitador de quimeras.
Foi presença fecunda na imprensa
norte-rio-grandense. A colaboração de Ticiano Duarte para a Tribuna do Norte
rendeu, numa primeira seleção, o livro “Anotações do meu caderno” (Z
Comunicação/Sebo Vermelho, 2000), reunindo os principais fatos políticos dos
últimos 70 anos do século passado no Rio Grande do Norte. A precisão das
análises, a escolha dos protagonistas, a evolução dos acontecimentos e o
retrospecto dos episódios que marcaram profundamente as vicissitudes da
política potiguar encontraram ali o seu cronista mais atento e informado,
imparcial e verdadeiro. Nesse livro, objetivamente intitulado “No chão dos
perrés e pelabuchos”, avultam as mesmas qualidades que consagraram “Anotações
do meu caderno”, com a única diferença de que agora ele se deteve com mais
vagar na descrição de perfis e na análise comparativa dos fatos, mesmo
separados por décadas. Vultos inesquecíveis da vida pública estadual, como
Djalma Maranhão, Georgino Avelino, Café Filho, Aluízio Alves, Odilon Ribeiro
Coutinho (“mistura de tabajara e potiguar”), Tales Ramalho (“paraibano por
acidente, norte-rio-grandense pelas grandes ligações familiares, e pernambucano
por adoção”) são algumas das estrelas de primeira grandeza dessa constelação de
escol. Cronista, para quem a política não pode se dissociar da ética, sob pena
de naufragar nos desmandos de governantes e correligionários, Ticiano fez o
elogio dos políticos exemplares perfilando a figura de Café Filho porque,
justifica, “o povo espera dos homens públicos exemplos. E alguém disse, com
muita propriedade, que o importante não é só pregar moral apenas para os
outros, censurando nos outros o que silencia entre amigos e parceiros”. Ao
fazer o elogio da lealdade e da coerência, ele retirou do limbo o nome de
Walfredo Gurgel, ressaltando que “o seu governo foi um exemplo de seriedade no
trato e na gestão da coisa pública. Todo o Rio Grande do Norte sabe desta
grande verdade, mesmo seus adversários não podem omiti-la, por mais que o
tenham combatido no campo das ideias e das diferenças partidárias”.
Em “No chão dos perrés e pelabuchos” ainda
é possível encontrar silhuetas de políticos esquecidos pela História, mas
preservados, por exemplo, numa Acta Diurna de Luís da Câmara Cascudo, como
Hermógenes José Barbosa Tinoco, deputado do Partido Liberal que a voragem do
tempo soterrou; os entreveros entre pelabuchos e perrés que incendiaram o paiol
das agremiações políticas dos anos 1930, que não escaparam à argúcia focada por
Ticiano sobre os atores da nossa história.
Ele propõe e reforça as teses daqueles que
defendem a necessidade de uma urgente reforma política a fim de repor o país
nos trilhos da ética e inaugurar uma nova era na vida política brasileira. O
seu olhar espelha nesse livro o brilho e a lucidez dos seus brancos cabelos, como
testemunhos da vida e do mundo.
(*) Escritor
WALTER, SOUTINHO E O CAMINHAR DA VIDA
Tomislav R.
Femenick
– Jornalista
No
longínquo ano de 1955, eu e o meu amigo Walter Gomes inventamos de abrir uma
agência de publicidade em Mossoró. Ambos trabalhávamos no jornal O Mossoroense,
dirigido pelo “velho” Lauro da Escossia e seu filho Lauro Filho. Eu, como
repórter, e ele, com uma coluna diária que misturava tudo: crônica social,
política, negócios etc. Só não falava de casos policiais. Dizia que dava azar.
Então resolvemos encontrar um meio de ganhar alguns trocados a mais, publicando
cadernos especiais. Dessa ideia saíram edições sobre indústria, comércio,
agricultura e administração pública.
Nos reuníamos nas
mesas do Bar Suez, da ACDP e, vez ou outra, nos cabarés Brahma e Copacabana. As
ideias que ali nasciam precisavam ser aprovadas por Lauro Filho, que geralmente
aceitava nossas sugestões. Só me lembro de um veto: um lançamento que propusemos
de um caderno sobre a vida alegre no Alto Louvor, o bairro do alto meretrício. Além de escrever os
textos, nós tínhamos que conseguir os anúncios. Aí é que nós ganhávamos uma
comissão, sobre o faturamento dos anúncios.
Um ano depois, nós, eu e Walter
Gomes, resolvemos institucionalizar o negócio e criamos a Propag; se não a
primeira, seguramente a segunda empresa de publicidade do Estado, com registro
na Junta Comercial, endereço, instalações, telefone (na época um artigo de
luxo), secretária e outras coisas mais. O problema era que não tínhamos
dinheiro para isso tudo. Fomos para o Bar Suez para ruminar a solução. De
repente, junta-se a nós um cidadão de quem não me lembro o nome, e resolveu a
questão, dizendo: “homem de dinheiro em
Mossoró é Soutinho”. Não dissemos nada, mas ficamos olhando um para o
outro. Logo fomos, ligeirinhos, falar com Francisco Ferreira Souto Filho, com
quem tínhamos amizade. Expusemos a nossa necessidade de grana para fundar a
empresa e, por isso, queríamos um financiamento do Banco de Mossoró, então
controlado por ele. “E se a empresa
quebrar?” – Perguntou-nos. Então viramos sócios; Eu, Walter Gomes e
Soutiho. A Propag viveu até eu fazer concurso e passar para assumir o cargo de
escriturário no Banco do Nordeste.
Mas
a vida dá muitas voltas. Walter foi para o Rio de Janeiro, voltou para Natal e
depois se instalou em Brasília, sempre perseguindo as notícias e suas fontes.
Eu pedi demissão do BNB, entrei em outros negócios e, depois, deixei minha
terra natal e fui para São Paulo, afastei-me do jornalismo e entrei de cabeça
no mundo dos altos negócios, via auditoria contábil, econômica e
administrativa. Uma vez recebi sua visita em meu escritório na Av. Paulista e
ele foi jantar na minha casa. Quando eu ia à Brasília, também o visitava.
Quanto a Soutinho a distância nos unia. Ele e Edith eram padrinhos de batismo
da minha filha. Sempre que ia a Mossoró, visitava-o em sua casa, onde uma vez,
se me recordo bem, provei um impensável soverte de pitomba.
Porém,
nada é mais inexorável do que o caminhar da vida em direção à morte. Tudo o que
é vivo anda nessa direção. Desde os gigantes baobás africanos e nordestinos,
até os diminutos vírus. Um dia todos desaparecerão.
Em
poucos dias foram-se desta existência Walter, o buscador de fatos e notícias
desta “República Surrealista” do Brasil, e Soutinho, o realizador e desbravador
das lides salineiras. Um perseguia os homens que fazem as leis, que as executam
e, também, que impõem o seu cumprimento. O outro buscava fazer com que o sal se
transformasse em uma riqueza da nossa terra, fazer com que o nosso se
transformasse no sal da nossa vida.
O
que nos entristece, mais ainda, é viver em uma época de tantos homens sem
serventia e ver que, logo eles, homens de valor exemplar, tenham nos deixado.
Tribuna do Norte. Natal, 10 mar. 2022.
03/03/2022
MACAÍBA DE ANTIGAS CANÇÕES E VELHOS
FOLIÕES
Valério Mesquita
Nestor Lima era um macaibense da gema
que foi “cônsul honorário” do município de Parnamirim. Era a quem recorria
quando consultava a bússola do tempo, da tradição, das vertentes e das
nascentes de nossa Macaíba. Revisito Nestor Lima para, através dele, penetrar
na máquina de sua memória. A nossa cidade, nas artes, conheceu o clássico e o
popular. Macaíba foi cidade aristocrática nos anos 20, 30, das bandas de
músicas José da Penha e a do Grêmio, pontificados nas figuras dos chefes
políticos Neco Freire e Major Andrade. A fina flor da sociedade exercitava a
música, o teatro e o canto, o que conferia a Macaíba a fama de cidade cultural.
Vicente Andrade no trompete, violino e piano; Orlando Ubirajara e Rosalvo ao
violino e piano; Euclides Ribeiro, saxofonista; Abílio Monteiro, trombonista;
João Leiros no contrabaixo; Luiz Marinho de Carvalho, grande trompetista e
pianista; João Lins e Luiz Martins, violonistas inexcedíveis; Valdemar Barros,
virtuoso pianista Era a época, onde em cada rua do centro da cidade, existiam
um ou dois pianos.
Nos dias de hoje, não existem um
sequer. Nos anos 40 e 50, se destacaram em todo o município os famosos
conjuntos regionais que interpretavam a música popular brasileira.
Celebrizaram-se Nestor Lima, Cornélio Mangabeira, José Alves, José Cabral, Luiz
Marinho, Manoel Domingos, Chicozinho, Carlito, Nizário Máximo, José Leiros,
Sebastião Melo, Airton Feitoza. Todos formavam uma escola de batutas que hoje
não se vê mais. Como também jamais se reeditarão os conjuntos teatrais que tanto
sucesso fizeram em Natal, começando pela figura maior de Joca Leiros, seus
filhos Zé Leiros, Wilson, Nozinha, Luiz Marinho e os filhos Gutemberg e Aidée,
Antônio Coelho, Alice Lima, Hiran e Célia Lima, José Muniz, e Aguinaldo
Ferreira. E para fechar o leque cultural, uma plêiade de cantores que enchiam
de canto e encanto as noites macaibenses, do quilate de Salvador Galvão,
Joanete Ribeiro, Edson Silva, Dorothy Moura, Aliete Muniz, Luiz Vieira, Cecília
Marinho e Laíde Máximo.
Mas o carnaval macaibense nos anos
prefalados, era o desaguadouro natural dos afluentes culturais da época. Não se
pode esquecer os clubes de cordão: "Os Remadores", os
"Vassourinhas", o “Coco-Zambê” do caboclo velho e as madrugadeiras
"Maxixeiras", anunciadoras primeiras do carnaval, comandadas por Lula
Ramos. Dos blocos, o Zé Ludovico que caminhava à frente pelas ruas, nos seus
1,80 de altura impertigável, imperturbável e inabordável, apesar de toda a
folia ao redor. O de Pedro Pixilinga, que anos passados resistiu, no mesmo passo
e compasso como há 40 anos atrás, a Escola de Samba de Zé de Papo, sambista
incorrigível. As tribos de índios, bagunças, troças, tudo faz sentido hoje
relembrar, abrindo alas para todos passarem na sempre comovida recomposição de
um tempo que nunca mais se repetirá.
(*) Escritor
28/02/2022
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24/02/2022
JOSÉ VASCONCELOS DA ROCHA
José Vasconcelos da Rocha foi uma criatura com uma história singular. Natural de Guarabira-PB, nascido a 23 de dezembro de 1935, filho de Adauto Ferreira da Rocha e de Marluce de Vasconcelos da Rocha, buscou vencer na vida por vários caminhos, a política onde foi Deputado Estadual (PTN), eleito no período de 1959 a 1967, onde alcançou a condição de Presidente da Assembleia e 2º Vice Presidente. Fez parte do grupo de deputados que criou a “Assembleia do Museu”, quando da dissidência dos correligionários de Dinarte Mariz contra o Governo Aluízio Alves. Foi vice-prefeito de Goianinha, de 1958/1959.
Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito de Alagoas, tendo colado grau em 2 de dezembro de 1963, tornou-se advogado militante e depois Ingressou no cargo de Juiz do trabalho de 2ª Instância, ocupante de vaga destinada a representante da OAB/RNN, nomeado através do decreto Presidencial de 14 de novembro de 1991, tomando posse em 15 de junho de 1992, sendo eleito o 1º Presidente do Tribunal Regional do Trabalho – TRT da 21ª Região.
Em sua vida encontrou algumas pedras no caminho, a teor da época do movimento militar que derrubou o Presidente João Goulart em 1964, quando, por força de um discurso em defesa da manutenção do governante constitucional logrou a indignação de alguns militares e foi procurado para prestar justificativas, quando então foi obrigado a fugir de um cerco à sua casa, fugindo para sua terra natal, acompanhado do advogado Hélio Vasconcelos e dos acadêmicos de direito Danilo Bessa e Berenice Freitas.
Retorna a Natal, mas antes fez contatos importantes com figuras proeminentes do Estado, como Dinarte Mariz, Odilon Ribeiro Coutinho e com militares conhecidos - general Omar Emir Chaves, o coronel Mendonça Lima, foi até ao IV Exército, em Recife. Lá, conhecia o coronel Valmir Alves da Nóbrega, que o informou “aqui não há nada contra você”. Com Odilon contatou com o general Terra Ururahí, e tudo terminou bem.
Aposentado como desembargador federal, retornou à advocacia e passou a atuar com grande fervor ao esporte, mais exatamente ao seu América Futebol Clube, de onde foi Presidente e Presidente do Conselho Deliberativo até os dias presentes. Ergueu o a Arena América, que recebeu o seu nome, repetindo sua ação de construção, como o fez com a sede da Justiça Trabalhista em Natal, quando integrante daquela Corte.
Com ele, eu tive convivência no América e retornei aos quadros de sócio, apagando uma grande deselegância contra mim praticada e que me levou a abandonar o clube. Na nova fase fui convidado para minutar um projeto de novo Estatuto do Clube, aprovado por uma Comissão e depois aprovado pelo Conselho Deliberativo, com emendas oferecidas por outros associados.
Soube do seu problema de saúde e falecimento hoje, pelo meu filho Rocco José, em seguida confirmado pelo Conselheiro do América Odúlio Botelho, posto que ando um tanto desligado do noticiário, uma vez que estou dividindo a minha residência entre Natal e Cotovelo.
Fiquei muito abalado e, de imediato, no calor da emoção, resolvi fazer esta homenagem ao companheiro americano e amigo Zé Rocha. Deus o receba em sua Casa Celestial.
Olhe, lá estará lhe esperando outro americano, meu pai José Gomes da Costa (Zé Gomes), que foi quem adquiriu o terreno onde hoje está plantada a sede do América.
23/02/2022
ORIANO: ÚLTIMA ESTROFE
Valério Mesquita(**)
Direi pouco sobre
Oriano de Almeida. Outros falarão melhor porque conviveram de perto com o seu
talento e a sua vida. Cláudio Galvão, Diógenes da Cunha Lima, por exemplo,
Maria Luiza Dantas, Sanderson Negreiros, Enélio Lima Petrovich (que inaugurou o
Memorial Oriano Almeida no anexo do IHGRN em 2001), se já não dissertaram, o
farão, com certeza, com brilho e propriedade. Resolvi pronunciar-me porque
gosto de pontuar atitudes e assumir gestos quando vejo algo que me desagrada.
Fui à Academia de Letras me despedir do seu corpo, na sua tarde derradeira e
melancólica. Não apenas movido pelo dever de colega acadêmico ou por solidariedade
cristã, mas porque efetivamente ele foi um compositor e intérprete maravilhoso
para a honra e orgulho do Rio Grande do Norte, cujo povo não “está nem aí”. No
recinto, durante os discursos de despedida, pouquíssimos presentes.
Aí começou a nascer
em mim a necessidade de protestar, de me indignar, de não me calar. Comentei
com Genibaldo Barros, Armando Negreiros e Ernani Rosado que ali estavam: é o
menor público da vida de Oriano, quando deveria ser o maior. Ele que havia
conquistado as plateias milionárias, exigentes e refinadas do mundo inteiro não
conseguia reunir para o último adeus a intelectualidade de sua terra. Quanta
ironia, quanto paradoxo a vida nos ensina. O maior intérprete do mundo da obra
de Chopin, que encantou os palcos da arte musical, gênio da música, compositor,
ocupante da cadeira nº 13 que pertenceu a Câmara Cascudo, estava finalmente
esquecido. Havia atingido a “verdadeira imortalidade”. Já escrevi que Natal
sofre de ataraxia, indiferença. É pobre de sentimentos.
Chegou um momento,
no velório, que Diógenes preocupou-se com os circunstantes para conduzir o
esquife do salão ao veículo funerário. A maioria era mulheres entre reduzido
grupo de sexagenários em débito com o teste ergométrico. Afirmo, sem qualquer
preconceito, que talvez tenha faltado a Oriano a passagem por uma banda de
forró. Resta a esperança de que o nome, a importância do que fez como
musicista, intérprete, compositor e escritor não desapareça. Não tenho dúvidas
de que Oriano Almeida é maior do que os ausentes. A sua obra tem abrangência
nacional e internacional. Simples, não buscava os refletores da fama. Ela vinha
até ele. Nem o elogio fácil.
Já disse que na
vida quando se passa dos 60 ou 70 anos, torna-se estatística. Diferente dos
países mais civilizados. E Oriano se foi com 83. Fica para os pesquisadores,
memorialistas e estudiosos da música e da obra que ele nos lega, a tarefa
permanente de afirmar que Oriano Almeida vive. Na frase, que não é minha e nem
sei de quem, mas que eu gosto de lembrar: “Não se acaba o homem. Constrói-se a
cada dia sua performance”.
(*) Artigo publicado no livro “Inquietudes”
(**) Escritor
13/02/2022
Novas Cartas de Cotovelo – verão de
2022-06
Por: Carlos Roberto de Miranda Gomes
UM DOMINGO DE PAZ E SOL
Depois
de uma sexta-feira diferenciada, que trovejou e alagou o primeiro andar da
minha casa, com uma chuva diferente, o que nunca havia acontecido desde que a
construí, Cotovelo (há mais de 30 anos), tudo volta à sua normalidade,
permitindo retomada das atividades quase 100%, embora registrando alguns
pequenos danos em ruas sem calçamento, um início de incêndio numa mercearia em
frente ao Posto de Gasolina que, segundo comentam, teria sido o resultado de um
raio.
No
sábado fui ao vale do Pium (já no território de Nísia Floresta), com Carlinhos
para abastecimento da casa com frutas e legumes – tudo legal.
Eis
que chega o domingo e com ele a Paz e a claridade do Deus Sol, em toda a sua
exuberância. Levantei-me cedo e deixei Carlos Neto hibernando no ar condicionado.
Na
varanda da casa tive a oportunidade de assistir a Missa na Igreja de Santa
Luzia, celebrada pelo Padre Sidney, transmitida pela rádio web Mar e Campo, do
nosso estimado amigo Octávio Lamartine. Em seguida, ainda emocionado com as
mensagens recebidas fiz minhas comunicações, por celular, com o filho e filhas
que momentaneamente não estão nesta querida praia, e o fiz com muita emoção,
porque a religião nos oferece milagres espirituais.
Um
café farto feito por Carlinhos e Valéria, sem faltarem as costumeiras vitaminas
de mamão com abacate, leite vegetal e fibras, depois um cafezinho feito na hora
com fruta-pão e com o olhar pidão de Luma (nossa bulldog francês).
Dando
continuidade às minhas meditações, vislumbrei a minha mesa santuário, com os Santos
da devoção da minha sempre saudosa Therezinha, cujo retrato ornamenta esse
recanto sagrado, que tem em destaque uma pintura de Jesus orando e outra do
Padre Pio e, em minha cadeira de balanço herdada da saudosa companheira, dei
uma vista ao pequeno jardim e logo me deparo com o fiel beija-flor, cuja
descendência há mais de 30 anos faz parte da geografia emocional do lugar e as
cadeiras desarrumadamente dispostas, juntamente com as redes enroladas nos
armadores, algumas bolas dispersas pelo chão e o sentir da brisa que nos premia
neste recanto da casa. Em seguida fui beijar o mar, que estava com sargaço –
coisas da fase da lua.
Lembrei-me,
então, daquela conhecida música – “Minha casa é tão bonita, que dá gosto a gente
ver, tem varanda, tem jardim... minha casa que tem tudo, tanta coisa de valor,
minha casa não tem nada [vivo só sem meu amor]”. Fiz adaptações à letra
original de Minha Casa, de Joubert de Carvalho.
Mas,
domingo é dia de alegria – VIVA A VIDA.
-
08/02/2022
Novas Cartas de Cotovelo – verão de 2022-05
Por: Carlos Roberto de Miranda Gomes
REVISITANDO A CASA DE PEDRA DE PIUM
Neste último sábado resolvi revisitar a Casa de Pedra de Pium, equipamento histórico que tantas vezes mereceu crônicas e entrevistas minhas ao longo dos últimos anos.
Minha primeira decepção foi constatar que, apesar dos apelos e até da celebração de uma missa no final do ano passado diretamente daquelas ruínas históricas, com a presença do arcebispo Don Jaime, o acesso piorou muito, agora mais do que nunca o pequeno trecho não passa de um caminho de animais, com a pior qualidade que se possa pensar, sem nenhuma possibilidade de manobra quando alguém se arrisca a ter acesso por veículo com alguma calibragem, pois será dificílimo algum dos veículos recuar.
Essa agora “aventura” que fiz, com familiares, permitiu que reexaminasse o sítio histórico e agora fizesse algumas retificações: primeiro, houve plantação de árvores frondosas que retiraram a visão que existia para o mar, como anteriormente anunciei, qual seja, a visão da costa desde o contorno de Pirangi para Cotovelo quanto desta praia para o contorno de Ponta Negra, tirando o sentimento de que aquela construção secular daria uma visão da enseada capaz de avistar qualquer possível inimigo; segundo, em meu sentir, houve o agravamento da movimentação de algumas pedras que fazem parte daquele complexo; houve o aterramento, na marra, da passagem de fios de nascentes de água de um lado para o outro da estrada de acesso – essa que considero própria para animais.
O lado positivo é que o vale está preservado com criação de gado, coqueirais, plantações de verduras, frutas e hortaliças, ainda longe do agrotóxico.
Existem resquícios de algumas construções não concluídas de possíveis espigões ou condomínios fechados, ou mesmo mansões inadequadas para a paisagem bucólica a ser preservada, estes/estas depredados, já sem telhados, portas e janelas, enfim abandonados.
Desconheço qualquer intervenção da Prefeitura de Nísia Floresta no sentido de regulamentação do uso do solo naquela localidade.
Assim, convoco os interessados para resolvermos essa pendenga, entrando em contato com os possíveis proprietários (família Galvão) e depois com a Fundação José Augusto e com a Prefeitura de Nísia Floresta, aproveitando o momento político de breves eleições, sempre no intuito único de preservação da história.